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Paraguai: como Lugo conseguiu desafiar monopólio Colorado?

A quebra do controle incondicional do Partido Colorado e a discussão de fato dos problemas de fundo da sociedade paraguaia são as principais novidades das eleições gerais do próximo dia 20 em relação às que foram realizadas desde a queda do regime ditator

“Hoje, esse monopólio do Partido Colorado [no poder desde 1947], qualquer que seja o resultado, ainda que ganhe a candidata do partido [Blanca Ovelar], não representará mais esse domínio incondicional que houve até dez anos atrás”, analisa.


 


Os motivos, segundo o professor, são muitos, a começar por uma crise entre os dirigentes do partido, que resulta em rupturas internas. No entanto, ele aponta questões mais abrangentes, como o avanço da democracia no mundo todo, do qual o Paraguai não escapa. E que tem resultado em “uma diversidade e uma riqueza de vida social, de vida cultural muito intensa, que acabou diversificando a sociedade paraguaia” e também se mostra no surgimento de novas tendências e lideranças políticas.


 


“Esse é um fato muito importante na candidatura do ex-bispo [Fernando] Lugo, é o crescimento de movimentos sociais que querem contestar fortemente a ordem existente, inclusive os acordos assinados anteriormente pelos governos paraguaios e, portanto, colocam em cheque o ordenamento do Estado paraguaio”, afirma.


 


Movimentos sociais


 


O crescimento dos movimentos sociais gerou a segunda grande novidade deste pleito, segundo Vigevani. “Nessas eleições, pela primeira vez os problemas de fundo da sociedade paraguaia estão sendo colocados e não apenas disputas de pessoas, como nas eleições passadas”.


 


Entre esses problemas, o professor da Unesp aponta a necessidade de desenvolver a economia do país para conseguir também a modernização política do Estado. “Acredito que o Lugo, ou outras tendências modernizadoras no Paraguai, vão ter que ter em conta essa perspectiva, um projeto de desenvolvimento”.


 


No entanto, ele acredita que modernizar a economia e a política não é um desafio somente dos dirigentes paraguaios, mas também dos vizinhos e sócios no Mercosul: Argentina, Brasil e Uruguai. Isso porque a informalidade na economia do Paraguai ainda traz problemas para o bloco sul-americano. “Acredito que o Brasil deveria investir, independentemente de quem ganhe as eleições, no sentido de fortalecer e modernizar esse país”.


 


O professor defende que investimentos dos outros países do bloco no Paraguai trariam benefícios para o Mercosul como um todo, já que viabilizariam a modernização do sistema político, a consolidação da democracia e diminuiriam os bolsões de pobreza e atraso nos países.


 


Pobreza


 


Reduzir a pobreza e atender necessidades básicas da população é um dos grandes desafios do próximo presidente do Paraguai, que será eleito no próximo dia 20, para garantir o respeito aos direitos humanos, na opinião do membro do Serviço Paz e Justiça no Paraguai (Serpaj-Py), Vidal Azevedo.


 


Segundo dados da Direção Geral de Pesquisas, Estatísticas e Censos (DGEEC, na sigla em espanhol), 35,6% da população paraguaia é pobre e 19,4% (mais de 1,1 milhão de pessoas), extremamente pobre. Na área rural, esse percentual chega a 24,4%.


 


“Isso também é uma violação dos direitos humanos, já que não são satisfeitos os direitos sociais e econômicos da população”, afirma Azevedo. Para ele, “não se pôde realizar grandes avanços porque o sistema político ainda não conseguiu perder os vícios da ditadura”, com destaque para a corrupção.


 


Azevedo defende que os próximos governantes trabalhem para que “as pessoas possam ter diariamente as três refeições básicas, educação gratuita e com qualidade e que deixem de morrer 250 mulheres ao ano por causa da gravidez, que deixe de haver 35 mil crianças ao ano desnutridas”.


 


Além da miséria, o ativista destaca as perseguições políticas. Diz que, embora tenha havido avanços no respeito aos direitos civis e políticos desde o fim da ditadura do general Alfredo Stroessner, em 1989, 78 dirigentes camponeses foram mortos até 2005, “nessa eterna etapa de transição democrática”.


 


Azevedo afirma que o movimento camponês é o que mais sofre com a violência do governo, na luta pela reforma agrária e pela regulamentação do uso de agrotóxicos no plantio da soja. Ele conta que cada vez que os camponeses organizam alguma manifestação, o governo age de forma violenta. “É uma maneira de criminalizar a luta social”, conclui.


 


Apesar dos problemas, o membro da Serpaj-Py acha que os movimentos sociais e as organizações não-governamentais de defesa dos direitos humanos cresceram e ganharam força. Ele destaca a atuação do movimento camponês, “que se coloca como a vanguarda na defesa desses direitos”.