Rodrigo Gondim, guitarra em silêncio

A música cearense perdeu o talento de Rodrigo Gondim. Colegas lamentam a perda do guitarrista, falecido no último domingo, aos 28 anos. Um músico eclético e entusiasmado, que deixou uma vasta obra autoral e três discos inéditos

Perplexidade. A palavra sintetiza a reação de músicos cearenses acostumados a dividir palcos e estúdios com o guitarrista Rodrigo Gondim Costa, falecido na manhã do último domingo, em caso que, se confirmado, terá sido o terceiro registro de mortes por dengue hemorrágica este ano em Fortaleza. À parte a causa da morte, a sensação de ausência deixada com a partida do jovem músico se agrava pelo modo súbito como ele se despediu.


 


Um quadro que jamais poderia ser imaginado pelo saxofonista cearense Bob Mesquita, quando dividiu com Rodrigo Gondim o palco do Centro Cultural Banco do Nordeste, em dois shows na quinta-feira, 17/4. ´Ele estava numa boa, não aparentava estar mal. Inclusive tinha chegado de São Paulo na véspera do único ensaio do show, que era muito difícil, cheio de músicas complexas. Quando acabou o show, eu tinha certeza absoluta que não existia outro guitarrista capaz de fazer um show com esse nível de dificuldade, em tão pouco tempo´, recorda Bob, que tocou com Gondim no Festival Jazz & Blues em Guaramiranga, em 5 de fevereiro deste ano, mostrando temas de autoria dos dois, a serem registrados em um disco.


 


´Encerrei o show quinta com uma música chamada ´Mr. Rod´, que fiz pra ele, retribuindo porque ele tinha feito uma música dedicada a mim. Já tínhamos umas 20 músicas ensaiadas. Ele era um poço de criatividade, sempre fazendo as próprias músicas, nos vários grupos que fazia parte. Uma perda inestimável!´.


 


Já o multiinstrumentista e produtor Herlon Robson tocava com Rodrigo Gondim em outras facetas do múltiplo trabalho do guitarrista: em bandas de baile, se apresentando em eventos, e produzindo um trabalho autoral, gravado no estúdio de Herlon. ´Meu último contato com ele foi um café no aeroporto, antes de ele viajar. Quando ele voltou pra Fortaleza, semana passada, nos falamos por telefone. Ele tava cheio de planos´, lamenta Herlon, que tinha shows com Gondim agendados para esta semana. ´Não sei o que vou fazer´.


 


O disco deixado inacabado por Gondim, no estúdio de Herlon, tem todas as músicas de autoria do guitarrista. ´Tava já em fase de conclusão. Íamos colocar as guitarras definitivas e gravar mais umas duas músicas. Tudo instrumental, bem variado, como era o trabalho dele, bem eclético. Ele tocava bem em todos os estilos, da guitarrada do Pará ao jazz de Nova York´, relata. Herlon promete finalizar o álbum, em homenagem ao amigo. ´Estão sendo articuladas diversas homenagens, shows coletivos, mas acho que temos que fazer isso com calma, pra que seja uma coisa de qualidade, com alegria, que o Rodrigo tinha de sobra´.


 


O último show


 


Dos três discos deixados inacabados por Rodrigo Gondim, o que mais recentemente mobilizou a atenção do músico é o álbum da banda de rock O Sonso, formada em 2004. O baterista Marcelo Holanda, o Marcelo 2Hum, esteve afastado do grupo nos últimos tempos, mas integrou a banda durante a maior parte de sua trajetória – que inclui diversos shows, um CD demo e um clipe, da faixa ´E assim ficou´. Parceiro de Gondim nas composições e padrinho de casamento do guitarrista, Marcelo se orgulha de ter participado do último show de Gondim, sexta-feira, no Café Pagliuca.


 


´Tocamos eu, ele e o Fábio Amaral no baixo. O Rodrigo foi substituir o (violonista) Marcos Maia, mas o show foi muito bom´, recorda. ´Pegava temas de jazz e improvisava, com arranjos dele mesmo. Tava muito inspirado e foi muito aplaudido´.


 


Marcelo lembra que muitos músicos costumavam brincar com Gondim, chamando-o ´Absurdo´. ´Era aquela coisa: ´Diz aí, Absurdo…´. Isso vem desde que ele tocava metal, na banda Dreamatory, ali por 98, 99, eu acho. Sempre quando ele escutava alguma coisa que gostava, falava: ´Caramba, isso aqui é absurdo´´, detalha. ´Além de ser praticamente irmão, era um cara muito à frente. Levava a sério a música, estudava seis horas por dia´.


 


Segundo os amigos, estão sendo preparadas homenagens, como shows coletivos no Hey Ho Rock Bar e no Anfiteatro da Volta da Jurema, onde Rodrigo tinha apresentação marcada. Ficam as obras e as lembranças de um guitarrista de eclético virtuosismo e muito bom-humor, ´amigo de meia Fortaleza´, como destacou ontem a sogra, Dona Mara. Saudades do ´Absurdo´.


 


 


De Fotaleza,


Dalwton Moura