Antônio Capistrano: Moacyr de Góes, até sempre camarada

Quem me deu a noticia da doença de Moacyr, foi Nei Leandro de Castro. Há uns dois meses atrás, conversando com Nei, na Potylivros, perguntei por Moacyr, disse-me ele – Moacyr se encontra muito doente, gravemente doente! Saí da livraria triste, pensativo,

Conheci Moacyr no inicio dos anos sessenta, ele secretário de Djalma e eu um garoto, já metido nas coisas da política. Ele era da turma da AP, ligado à igreja católica, turma essa que se misturava aos militantes do Partidão, do qual eu fazia parte.


 


Moacyr nasceu em 1930, portanto estava com 79 anos, eu sou de 1947, estou com 62, à diferença de idade entre nós é de 17 anos, na época uma grande diferença, hoje nem tanto. Participamos das mesmas lutas nesses últimos 49 anos de história do nosso país, sempre do lado esquerdo, com a mesma esperança, a construção de uma sociedade igualitária. Utopia sonhada por comunistas e católicos seguidores dos ensinamentos do Santo Padre João XXIII.


 


Acompanhei de perto dois programas da sua gestão como secretário da educação e cultura: De Pé no Chão Também se Aprende a Ler e Cultura na Praça. Programas de repercussão nacional, ambos interrompidos pelo golpe militar de 1964.


 


Não conheço outro programa cultural com o conteúdo e a objetividade do projeto Cultura na Praça e um projeto de educação popular igual à De Pé no Chão Também se Aprende a Ler. Todos dois voltado para o nosso povo.


 


Quando fui vice-prefeito de Mossoró dei de presente à prefeita Rosalba Ciarlini o livro “Dois livros de Djalma Maranhão no exílio”, de autoria de Moacyr de Góes, trabalho esse que traz artigos escritos no exílio por Djalma Maranhão e, os projetos e programas de educação e cultura do seu governo. É um bom modelo a ser seguido por qualquer gestor municipal que deseje fazer um bom trabalho nessas áreas.


 


Após o golpe, Moacyr ficou preso respondendo a inquérito policial militar, praticamente durante todo o ano de 1964, sendo solto somente no final do ano. Esse período tumultuado da vida brasileira ele registra no seu livro “Sem paisagem”, livro publicado pelo Sebo Vermelho, um belo trabalho, importante na compreensão do cotidiano de pessoas que pelo crime de pensar, de uma hora para outra se ver confinada dentro de uma sela, preso com outros camaradas, tentando compreender os acontecimentos. São sonhadores, crentes em um mundo de paz e pregresso social. Sem paisagem, é um livro de crônicas da prisão, relato que emociona que estimula que nos dá coragem de continuar sonhando.


 


Em março de 2004, realizei através do Centro de Estudos e Pesquisas África/América do Rio Grande do Norte – Cepaarn, em Mossoró, no auditório do Sesi um seminário denominado 1964: 40 anos de história. Moacyr, ao lado da sua esposa, Maria da Conceição Pinto de Góes, foi um dos convidados, ambos, professores da UFJ. Ela fez uma bela palestra, tendo como tema: “O golpe de 1964 dentro do contexto latino-americano”, mostrando que o caso brasileiro não era um caso isolado, existia toda uma articulação do governo norte-americano, através da CIA e das suas embaixadas no nosso continente, com o objetivo de derrubar qualquer governo progressista na América Latina. Moacyr fez uma análise do golpe, o seu tema foi: “1964: o golpe no Brasil”, ele viveu intensamente esse período, além de professor de história, Moacyr foi uma testemunha ocular e vítima dos fatos ocorridos naquele período.


 


Nesta sexta-feira (27/3/09), o meu filho, Wlademir, me deu a triste noticia da morte de Moacyr de Góes. Fiquei pensando sobre a vida e a morte, passou na minha mente o filme da existência humana, lembrando essa figura que tanto lutou pelo nosso país, por um mundo justo, cristão e socialista. Lembrei-me dos nossos amigos, uns que já foram outros que continuam na luta: Danilo Bessa, Hélio Vasconcelos, Luiz Maranhão, Vulpiano Cavalcanti, Pretextato, Djalma Maranhão, sem esquecer a turma do Centro Popular de Cultura, a maioria continua no batente, uns com as mesmas convicções outros desistiram. Refletindo sobre todos esses anos, sobre as nossas lutas, as vitórias e as derrotas, cheguei à conclusão que valeu pena. Eu continuo comunista, lutando pela minha utopia, acho que é o único caminho para os povos de tudo o mundo.


 


Moacyr morreu, ficou a sua história, o seu exemplo, a humanidade precisa de figuras como ele, precisa dos sonhadores, são eles que constroem o futuro.


 


por Antônio Capistrano