Inácio Arruda: Por que só o mercado financeiro opina sobre juros?
No dia 23 de fevereiro, durante sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado com os senhores Sidnei Corrêa e Altamir Lopes, indicados para integrar a diretoria do Banco Central, observei que, mesmo com eventuais quedas nas taxas de juros, o Brasil ainda convive com índices muito elevados, os mais altos do mundo. Afirmei que o BC coloca o problema da moeda focando na inflação com a manutenção de taxas altas de juros.
*Por Inácio Arruda
Publicado 16/03/2011 07:16 | Editado 04/03/2020 16:32
Naquele mesmo dia, durante a votação do novo salário mínimo, já no plenário do Senado, afirmei que a Pesquisa Focus tem como referência apenas no mercado financeiro. Não consulta o setor produtivo, não tem a opinião da Confederação Nacional da Indústria (CNI), nem da Confederação Nacional da Agricultura (CNA). A Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Central dos Trabalhadores e das Trabalhadoras do Brasil (CTB), a Força Sindical e nenhuma outra central sindical ou entidade representativa dos trabalhadores tem direito de opinar sobre a taxa de juros do país. Prevalece assim a opinião de um único setor da economia. Isso trava a capacidade de desenvolvimento mais rápido e a valorização maior do trabalhador.
Através da Pesquisa Focus, os agentes financeiros se comunicam com o Banco Central. A pesquisa é divulgada semanalmente pelo banco, informando o que esses agentes esperam dos principais indicadores da economia, principalmente os de inflação. Através dela o Banco Central acompanha as expectativas do mercado – na verdade, apenas do mercado financeiro –, que são uma das bases do sistema de metas para a inflação, adotado pelo País desde 1999.
Por isso, fiquei satisfeito quando li no jornal O Estado de S. Paulo, de 9 de março, que o Banco Central estuda incluir projeções feitas por acadêmicos na pesquisa Focus. No dia seguinte, o jornal confirmou a informação e considerou, inclusive, procedentes as críticas de que a pesquisa “está concentrada no setor financeiro”.
O economista Amir Khair estranha o Banco Central só ouvir o mercado financeiro e afirma: “É preciso olhar o País todo. Esse segmento do mercado tem interesse na Selic elevada, pois isso representa ganho fácil para os bancos". Também ele reivindica a participação na pesquisa de setores da economia real (entidades do setor industrial, comércio, serviços etc.) e de institutos que acompanham inflação.
Já o jornalista e economista José Paulo Kupfer, membro do Grupo de Conjuntura da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), observa que o relatório Focus não informa quais seriam as “‘dezenas’ de instituições participantes” da pesquisa. “Só se tem notícia das ‘Top 5’, aquelas instituições cujas projeções, a cada período, mais se aproximaram do ocorrido”. Em fevereiro último, por exemplo as Top 5 citadas sobre o Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA) foram o Banco Itaú, Kondor Ad. Gest. Recursos Financeiros, Votorantim Corretora, BB DTVM, Banco BBM, Franklin Templeton Investimento do Brasil e Kinea Investimentos… Sintomático, não?
É positiva e imprescindível a abertura do leque de instituições consultadas pelo Focus, incluindo economistas do mundo acadêmico e economistas ligados à atividade empresarial. Mas, por que não incluir também as entidades dos trabalhadores – afinal, sem trabalhador não há produção e nem consumo!?
Do modo como foram feitas até aqui, as previsões do Focus auferidas junto ao setor financeiro continuam empurrando os juros para o alto, o que fatalmente leva à contenção do crescimento e a efeitos negativos na criação de postos de trabalho e melhoria do poder aquisitivo da população. Pelo que se depreende das previsões da pesquisa divulgada no dia 11 de março, a taxa básica de juros (Selic) permanecerá em 12,50% (11,25% em 2012) e o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) será reduzido de 4,29% para 4,10% neste ano. No ano passado, o crescimento foi do PIB foi de 7,5%, o que fez a presidenta Dilma, com seu sotaque mineiro, comemorar: “O pibão foi bão”…
Somente em 2011, o BC já subiu a taxa Selic em um ponto porcentual, o que gera um gasto adicional com juros superior a R$ 10 bilhões e corte nos gastos com funcionalismo e serviços essenciais, com o intuito de pagar a conta. E a ata da reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), divulgada dia 10 de março, avalia que o “cenário prospectivo para a inflação não evoluiu favoravelmente”. Traduzindo, novo aumento dos juros pode ocorrer a pretexto de combater a inflação.
Ora, o viés adotado no segundo governo do Presidente Lula, quando os juros decresceram e a economia cresceu, deu certo e nesse caminho devemos persistir. Incluindo o conjunto dos setores produtivos em suas pesquisas econômicas, certamente o Banco Central contará com uma base de dados mais adequada para adotar políticas macroeconômicas que garantam o crescimento econômico com inclusão social.
*Inácio Arruda é senador do Ceará e líder do PCdoB no Senado Federal