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Pravda: Em um avião na Rússia, a caminho da escravidão

Na seção dos leitores do jornal Pravda, do Partido Comunista da Federação Russa, Yaroslav Rússkikh, um professor aposentado de História da região de Voróniej, conta a história de um ex-aluno seu que reencontrou por acaso em um ônibus. A história ilustra um dos destinos que os habitantes da ex-União Soviética tiveram 20 anos depois da contrarrevolução, que levou o capitalismo "democrático e libertador" ao país.

"Neste verão tive de fazer uma viagem rodoviária entre Patropávlovsk e Voróniej. Pelo caminho, em uma das paradas, subiu ao veículo Serguei L., ex-aluno meu. Me saudou com a mão e veio sentar-se ao meu lado. Fiquei perplexo pela forma como mudou. Em seus anos de estudante era um rapaz alegre e piadista, enquanto que o rapaz que se encontrava ali a meu lado era uma pessoa completamente distinta da que conheci.

Nos cumprimentamos e fizemos as perguntas de praxe de como ia a vida. Eu contei a ele que havia me aposentado como professor. Em 2010, ano que Medviedev declarou ser o "ano do professor", um pedagogo como eu, com 30 anos de experiência, tinha visto seu salário ser reduzido em 43%, assim, eu passei a trabalhar como zelador e faxineiro.

"E que fez você, que não vejo há muito tempo?" perguntei a Serguei. "Eu virei escravo", me respondeu, ao mesmo tempo que me exibia cicatrizes no peito e nos braços. "Se quiser, lhe mostro a marca de bala na minha perna. Me surraram e torturaram durante o meu tempo por lá", afirmou.

Serguei resumiu para mim sua triste história. Em 2010 conseguiu um emprego em Moscou e ficou hospedado na casa de uma irmã. Em uma tarde, Serguei viu pela Internet uma tentadora oferta de emprego, prometendo em troca um substancioso salário. Abandonou o emprego e em seguida se apresentou a essa "firma".

Nos dois primeiros dias os 20 jovens russos foram bem-tratados. No terceiro, pediram que trouxessem seus documentos, já que o grupo se deslocaria para um novo lugar de trabalho. Levaram os rapazes para um avião e enquanto um dos responsáveis da "empresa" dizia que a viagem seria longa, outros iam passando garrafas de água mineral a eles. Quando beberam, acabaram todos dormindo.

"Quando acordamos, estavamos na Tchetchênia", continuou Serguei, "e dos 20 que iniciaram a viagem, dois deles, amigos de escola em Astrakhan, haviam desaparecido e até agora não sei o que aconteceu com eles".

Na Tchetchênia, no lugar para onde tinham seguido de ônibus, retiraram os documentos dos rapazes. Os que se negaram a entregá-los foram surrados, entre eles Serguei. Como era o mais destemido, acabou levando um tiro na perna. Para sua sorte a bala não atingiu nenhum osso.

Os 18 jovens russos se viram encerrados em um galpão de pedra. Os alimentavam de qualquer modo: em seis meses o peso de Serguei, que tem 1,85 metro de altura, chegou a 49 quilogramas. Os barbudos que vigiavam os rapazes os levavam todos os dias à obra. Aos "preguiçosos" aplicavam surras selvagens.

"Como conseguiu fugir dali?", perguntei.

No final de fevereiro os tchetchenos se preparavam para celebrar uma grande festa. Os guardas que nos vigiavam foram para a festa e eu convenci outros nove rapazes a fugir. Já não nos importava o que poderia acontecer na fuga para nós.

"Com um pouco de sorte, nada poderia ser pior do que estavamos vivendo. A fuga teve êxito. No início de março de 2011 cheguei a Moscou e de lá voltei para casa, para me recuperar. Minha mãe estava à minha procura, sem que ninguém pudesse dar nenhuma explicação crível para o meu sumiço. Uma vez recuperado, voltei a Moscou para procurar trabalho. Claro que não confio mais nos que prometem dinheiro 'fácil'. Continuo sem saber o que aconteceu."

Quando nos despedimos Serguei me pediu o número de meu telefone e prometeu que me ligaria, mas por enquanto não recebi nenhuma chamada sua.

Como cidadão da Rússia gostaria de fazer algumas perguntas aos senhores Medviédev e Pútin: Até quando continuarão existindo e se registrando "empresas" que vendem nossos rapazes e moças como escravos? Até quando se poderá continuar a transportar livremente escravos pelas estradas da Rússia? A nenhum policial rodoviário pareceu estranho um ônibus transportando 18 rapazes dormindo enquanto eram vigiados por alguns tchetchenos?

Até quando nossos políticos emitirão gritos esganiçados denunciando o suposto sequestro de um "democrata" belarusso? como é que não se escuta em mídia alguma uma palavra desses políticos em defesa dos rapazes russo, convertidos em escravos, que são sequestrados na "democrática" Moscou?

Fonte: Blog de Josafat Comín. Original em http://gazeta-pravda.ru/content/view/9061/34/. Traduzido do russo para o espanhol por Josafat Comin e vertido para o português pela redação do Vermelho.