Plano israelense para deslocar beduínos é rechaçado globalmente

O Plano Prawer do governo israelense recebeu grande atenção neste fim de semana, com protestos de solidariedade em mais de 20 cidades em todo o mundo, de acordo com o portal Middle East Monitor (MME). Cerca de 70.000 cidadãos árabes de Israel devem ser expulsos da região beduína no deserto de Negev, no sul do país. Para Suhad Bishara, ativista pelo direito da minoria árabe-israelense, trata-se de outra Nakba, outra “catástrofe” palestina.

Por Moara Crivelente, da redação do Vermelho

Protestos contra Plano Prawer - AFP

O “Dia Global de Fúria” contra o Plano Pawer registrou manifestações massivas em diversas partes do mundo, neste sábado (31/11). O Centro para os Direitos da Minoria Árabe (Adalah), da qual Suhad é membro, levou o plano aos tribunais israelenses, mas o governo alega que os beduínos que serão deslocados “estavam de acordo”.

De acordo com o MME, para os palestinos que possuem documentos de identificação da Cisjordânia emitidos por Israel, alcançar as manifestações no Negev (ou Neqab, para os árabes) era impossível devido às restrições impostas pelas forças de segurança à movimentação.

Por isso, um protesto alternativo foi realizado diante da colônia israelense de Beit el-Jewish, que fica próximo de Ramallah, sede do governo palestino, na Cisjordânia. Também houve protestos em Haifa, Jaffa e Jerusalém (entre os controlados por Israel) e na Faixa de Gaza.

Destituição e expulsão

O Plano Prawer representa mais um episódio da história de desapropriação e deslocamento forçado dos beduínos (grupo árabe nômade, com atividades de pastoreio) desde o estabelecimento do Estado de Israel. Diversas vilas já foram demolidas e outras estão aguardando a decisão judicial sobre o tema.

Formulado em 2011, o Ato sobre a Organização dos Assentamentos de Beduínos no Negev, conhecido como Plano Prawer – devido à chefia da equipe planejadora, Ehud Prawer, do Gabinete do Primeiro-Ministro (GPM) – prevê o deslocamento de 40.000 a 70.000 beduínos de áreas que o governo israelense alega não reconhecer como habitações aprovadas.

De acordo com estimativas israelenses, cerca de 210.000 beduínos vivem em Israel e outros 350.000 nos territórios palestinos. No lugar de muitas vilas desapropriadas no Negev, o governo planeja a construção de assentamentos judeus, no âmbito de um suposto plano de desenvolvimento econômico.

Para isso, o GPM estabelece quatro princípios principais: formular o estatuto de “vilas beduínas” no Negev (escolhendo regular a permanência comunidades que já existiam na região antes do estabelecimento do Estado de Israel), planos de desenvolvimento para as comunidades beduínas da região, resolver reivindicações de propriedade e estabelecer mecanismos de implementação, assim como um cronograma.

Sionismo como ideologia de um Estado racista

Ainda em 2012, o Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial da Organização das Nações Unidas afirmou que o plano é discriminatório e legalizaria práticas racistas. A proposta especifica a “necessidade de transferir” comunidades beduínas para locais determinados.

O comitê da ONU reconheceu a prática sistemática da administração israelense de demolição, deslocamento forçado e desapropriação das comunidades beduínas, políticas que seriam institucionalizadas através da lei. A medida foi rechaçada também pelo Parlamento Europeu e diversos ativistas internacionais e israelenses.

A aprovação do plano para torná-lo uma lei também não foi fácil. Aconteceu em junho deste ano, com um total de 43 votos favoráveis e 40 contrários no parlamento israelense (Knesset).

Antes da votação, a alta-comissária da ONU para os Direitos Humanos, Navi Pillay disse: “Se isso se tornar uma lei, vai acelerar a demolição de comunidades beduínas inteiras, forçando-as a desistir dos seus lares, negando-lhes seus direitos à propriedade da terra e dizimando sua vida cultural e social em nome do desenvolvimento.”

Entretanto, o plano também é construído sobre a retórica racista generalizada do governo israelense, que chega a dar uma perspectiva securitária para a condição da região do Negev. Em 2010, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu falou da “importância” de uma maioria judia na região.

No início de novembro, durante a abertura de uma reunião do seu gabinete, Netanyahu falou sobre as novas cidades judias a serem estabelecidas, mas não falou dos beduínos que serão deslocados por isso. O plano, ele disse, “catalisará o desenvolvimento de todo o Negev, algo que o primeiro premiê de Israel, David Ben-Gurion, queria muito.”

Segundo o jornalista israelense Noam Sheizaf, que escreve para a revista eletrônica independente +972, Ben-Gurion acreditava que a região era a “última fronteira do sionismo”, ou seja, do empreendimento colonizador dos judeus. “Não há exemplo melhor de como o sionismo como ideologia de Estado representa, em prática, a desapropriação contínua para os palestinos.”