Presidente colombiano afirma que as Farc poderão eleger deputados

Em entrevista publicada pelo jornal El País no último domingo (19), o presidente colombiano, Juan Manuel Santos – que é candidato à reeleição no próximo mês de maio – afirmou que existe a possibilidade de que os representantes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) ocupem cadeiras no Congresso. Santos também disse que os acordos de paz devem ser votados pela população, mas pela primeira vez não insistiu em um referendo. 

Santos troca cinco ministros em busca de "unidade para a paz" - Felipe Caicedo/AP

Juan Manuel Santos revelou ao jornalista Javier Moreno que está mais otimista em relação às negociações com as Farc, mas que ainda há muito por fazer. “Sei que o que falta é muito complicado”, ressaltou o presidente da Colômbia.

O mandatário concorre novamente às eleições no próximo mês de maio e, mesmo negando, tem como base principal de sua campanha o processo de paz em andamento. Segundo disse Santos ao El País, “este processo deveria, em teoria, continuar com ou sem Juan Manuel Santos, porque não é do meu governo, é um processo dos colombianos”.

Apesar do discurso, que frequentemente replica aos meios de comunicação do país, o presidente afirmou, sem falsa modéstia, que “inexoravelmente se vincula o nome de Juan Manuel Santos ao processo, porque eu sou o presidente e fui eu que o iniciei”. De fato, é preciso reconhecer que nenhum dos processos anteriores havia gerado um acordo e nunca se discutiu sobre um ponto tão essencial como a questão agrária, considerada pela força insurgente o principal motivo que os levou a levantar as armas em 1964.

De acordo com Santos, uma das razões que o fez pensar na possibilidade de se recandidatar foi a vontade de concluir as negociações com as Farc. “Tenho a responsabilidade de terminar esta tarefa, de fazer todos os esforços possíveis para terminar esta tarefa, que seria o mais importante que aconteceria neste país nos últimos 50 anos”, disse ele.

Contudo, ele insistiu que “a campanha não vai ser somente sobre o processo de paz; a campanha vai ser sobre outros temas que os colombianos têm no dia a dia: o tema do emprego, a educação, a saúde, a infraestrutura, os temas que os cidadãos comuns têm diante de si. A eleição vai girar também em torno disto, não somente em torno da paz”.

No ano passado, o presidente colombiano chegou a pressionar para que as conversações fossem concluídas antes das eleições presidenciais de 2014. Na época, os negociadores do grupo guerrilheiro deixaram claro que o fim do conflito mais longo da região não pode estar subordinado a calendários, nem a interesses políticos.

Ao ser perguntado pelo jornalista do El País se acha possível que haja um acordo até o mês de maio, o mandatário reiterou seu posicionamento anterior: “Não, eu não acho que seja possível. Todos os temas são complexos e a dinâmica do processo nos leva a concluir que seria irreal dizer que vamos terminar todos os temas antes das eleições. O que aspiro é que avancemos, que pelo menos fechemos mais um ou dois temas”.

Santos anunciou desde o princípio que o povo colombiano teria a oportunidade de se pronunciar nas urnas sobre os eventuais acordos de paz. Assim que os diálogos forem concluídos, os cidadãos do país devem dizer se concordam ou não com as resoluções aprovadas entre o governo e as Farc.

No entanto, as partes divergiram bastante no ano passado sobre a forma de votação destes possíveis acordos. Por um lado, em agosto passado, Santos levou ao Congresso e conseguiu aprovar uma proposta de referendo, o que desagradou os membros negociadores do grupo guerrilheiro, por não terem discutido tal sistema. As Farc, por sua vez, consideram que a melhor maneira de fazer a consulta é através de uma Assembleia Nacional Constituinte, “neste cenário sim poderemos garantir a longa duração da paz nacional”, afirmaram em um comunicado na época.

Durante a entrevista publicada no domingo (19), o presidente parece ter flexibilizado sua postura em relação a isso. O chefe de Estado disse que haverá “algum sistema de referendamento, que pode ser um referendo ou pode ser outro sistema. Isso será negociado também”. Ele acredita ainda que a grande maioria dos cidadãos colombianos irá aprovar qualquer que seja o acordo final entre as partes: “Quando apresentarmos a eles o pacote completo, tenho absoluta certeza que eles vão aceitar e vão apoiar”.

Ainda assim, de acordo com o jornal El Tiempo da Colômbia, independente da decisão que resulte da consulta popular (artigo 55 da Lei 134), seu conteúdo não pode reformar a Constituição, nem o ordenamento jurídico. Sendo assim, os acordos necessariamente teriam que passar pelo Congresso, que será eleito no próximo dia 9 de março.

O jornalista do El País perguntou também ao presidente se ele acredita que o ex-presidente Álvaro Uribe e sua chapa para o Senado têm alguma possibilidade de bloquear lá o processo de paz. Santos foi enfático na resposta: “Não acho que o povo colombiano cometerá esse erro”.
Uribe é considerado o maior inimigo das negociações de paz. “Enquanto foi presidente não foi capaz de ganhar a guerra e agora não quer deixar que firmemos a paz”, declarou o Ivan Márquez, chefe da delegação de paz das Farc, em outubro do ano passado.

 
Ivan Márquez, chefe da delegação das Farc para os diálogos de paz
O membro da guerrilha também foi citado ao decorrer da entrevista, quando Santos é questionado sobre a possibilidade de que Márquez faça parte do Congresso Nacional. “Imagino representantes das Farc sentados no Congresso. É disso que se trata o processo; que deixem as armas e sigam seus ideais. Ninguém os está obrigando a mudar sua maneira de pensar, mas que lutem por seus ideais sem armas, sem violência, apenas utilizando as vias democráticas”, completou o presidente.

Théa Rodrigues, da redação do Vermelho,
Com informações do El País e do El Tiempo