Deputada propõe lei para Israel "manter soberania" sobre colônias

Uma proposta de lei para aplicar a jurisdição israelense a todas as colônias (ilegais sob o direito internacional) na Cisjordânia será discutida no domingo (9) pelo Comitê Ministerial Legislativo de Israel. A proposta é da controversa deputada Miri Regev e também impediria o governo de barrar a construção das colônias. Trata-se de uma repetição: em 1980, o Parlamento aprovou a lei que “anexava” Jerusalém Oriental, embora não usasse essa palavra.

Por Moara Crivelente, da redação do Vermelho

Israel e Palestina em Jerusalém - Reuters

Não é a primeira vez que a parlamentar, do partido direitista Likud, faz uma investida para a anexação de terras palestinas. No fim do ano passado, ela defendeu veementemente a proposta de anexar o Vale do Jordão palestino, que está sob a constante ameaça da ocupação de mais de 400 mil colonos.

Em 1980, a Lei Básica “Jerusalém, capital de Israel” (aprovada em 30 de julho de 1980 e ratificada pelo primeiro-ministro Menachem Begin e pelo presidente Yitzchak Navon) não deixou grafada a palavra “anexação”, embora estabelecesse que toda Jerusalém, “completa e unificada”, seria a capital de Israel, e que seria governada pela jurisdição israelense.

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Jerusalém Leste, entretanto, é determinada como a futura capital palestina pelo consenso internacional, mas seu estatuto ainda é indefinido devido à ocupação israelense. Entretanto, a falta da palavra “anexação” na Lei Básica levou alguns cínicos a argumentarem que Israel não anexou a porção, o que seria ilegal sob o direito internacional.

A determinação da “expansão das fronteiras” da Jerusalém israelense, a partir da Guerra dos Seis dias, de 1967 (assim como a expansão generalizada para a ocupação abrangente e efetiva de territórios árabes) e o artigo sobre a “proibição da transferência de autoridade para um órgão estrangeiro” (uma das soluções propostas para a disputa pela cidade é uma gestão internacional) são temas ainda bastante atuais, parte de uma prática determinada que usa a brecha da linguagem para negar o que é, de fato.

Assim, Miri Regev aprendeu com a política dos sucessivos governos colonialistas de Israel sobre o uso, ou a evasão do direito internacional para práticas ilegítimas, como a anexação, por mais que esta palavra esteja “ausente” da proposta de lei, como aconteceu em 1980.

Em 1997 (curiosamente, durante o primeiro governo do atual premiê Benjamin Netanyahu), o professor Ian Lustick foi um dos acadêmicos que acabam por justificar os subterfúgios do governo israelense para defender-se da crítica internacional, enfatizando justamente a ausência da palavra “anexação” da lei de 1980 para dizer que Israel não havia anexado Jerusalém Leste.

Antes disso, em 1967, quando o governo israelense moveu-se para efetivar a ocupação dos territórios árabes, o Parlamento aprovou emendas, ao fim da Guerra de Junho, à “Lei de Ordenação Administrativa” que, mais uma vez, estabelecia a aplicação da jurisdição israelense sobre aquelas áreas (a Faixa de Gaza, a Cisjordânia, as Colinas do Golã sírias e outros territórios libaneses). A Lei de Ordenação Administrativa é de 1948, quando o Estado de Israel foi estabelecido e a Palestina dividida, ainda que o Estado palestino seja até hoje “virtual”.

"Perigo" da soberania palestina

A deputada Regev disse que sua proposta visa preparar Israel para lidar com a possibilidade de uma declaração unilateral da Palestina, que seria reconhecida pela maior parte dos países do mundo, de acordo com o jornal israelense Ha’aretz. Em 2012, entretanto, a Palestina já foi reconhecida como Estado observador não membro por mais de 130 países na Assembleia Geral da ONU.

“Se isso acontecer, seria apropriado que Israel se eximisse da responsabilidade e do controle das comunidades palestinas em Judeia e Samaria [a Cisjordânia], mas, ao mesmo tempo, não deveria abandonar as comunidades [judias] nestes territórios,” escreveu ela em suas notas explicativas sobre a proposta.

Segundo a deputada, ainda citada pelo Ha’aretz, “a declaração unilateral de um Estado palestino teria um impacto imediato e crítico sobre as vidas cotidianas dos cidadãos israelenses vivendo nas comunidades judias em Judeia e Samaria.”

“Devido ao fato de que a posição dos [sucessivos] governos do Likud tem sido a de que, em qualquer acordo diplomático futuro, as comunidades judias em Judeia e Samaria, inclusive as estradas de segurança [exclusivas para os colonos, vigiadas pelo Exército israelense] até elas, continuarão no território sob o controle do Estado de Israel, e que a soberania israelense será aplicada a elas, temos uma obrigação de proteger as vidas das pessoas que vivem nessas comunidades.”