Dois pesos e duas medidas: o verdadeiro partido de oposição

 A grande mídia brasileira, além de cumprir o papel de porta voz da classe dominante, vai muito mais adiante, muitas vezes se posicionando quase como orgão de comunicação oficial dos partidos de oposição.

Claudio Machado (*)

Os meios de comunicação, sejam eles concedidos – como é o caso das TVs abertas e rádios – ou não, devem operar sob o manto da mais ampla liberdade de expressão. É condição que não pode ser relativizada ou condicionada. As informações, opiniões, valores e conceitos – dentro do arcabouço legal – devem fluir sem qualquer restrição, mesmo nos casos em que refletem apenas a opinião de um setor da sociedade, mesmo que minoritário, mesmo que anacrônico. É um direito inalienável inscrito na nossa Carta Magna. Mas é também quase uma utopia, pois o que predomina  na maioria dos meios de comunicação brasileiros é uma única narrativa imposta pelo monopólio do setor, hegemonizado por 7 famílias que substituem o dever de informar e o direito de opinar por uma pauta pseudo jornalística que se destina exclusivamente a atender seus interesses econômicos e políticos, mesmo que para isso seja preciso manipular, distorcer, fazer edição tendenciosa e, até mesmo, mentir.  impõem estes interesses sobre suas redes de TVs, de rádios, jornais impressos e revistas, mesmo que a curto prazo possa significar perda de audiência ou de leitores, mas que a longo prazo possa contribuir para a manutenção da hegemonia histórica da elite brasileira sobre os principais espaços de poder no País e, a médio prazo, permita a retomada de algum espaço perdido para setores majoritário da sociedade, principalmente a presidência da república.


Basta, por curiosidade, perdermos algum tempo e prestarmos atenção nas notícias e opiniões veiculadas por telejornais, jornais de rádio, revistas e jornais impressos. Iremos constatar que não faz a mínima diferenças se assistimos um jornal da tv tal ou qual; se ouvimos o jornal daquela ou esta rádio; se lemos um ou outro jornal ou revista. As únicas diferenças que notaremos serão aquelas relacionadas a estilo e a qualidade técnica. Raríssimas vezes encontraremos um contra  ponto, uma outra narrativa.

Podemos também perceber o quão mais seletivos e contundentes os grandes grupos de mídia se tornam a cada vez que se aproxima a eleição para presidente da república e para o congresso nacional. Mais parecem órgãos oficiais de comunicação dos partidos adversários do atual governo federal, na tentativa de contribuir para a viabilização de uma das candidaturas de oposição. Para isso são capazes de praticar as mais vergonhosas páginas da história do jornalismo brasileiro. Omitem ou amortecem informações que possam atingir seus preferidos e superdimensionam notícias que possam causar danos ao PT e seus aliados unidos em torno da reeleição de Dilma Roussef. Isso fica evidente se compararmos o comportamento da maior parte da mídia nacional e regional em relação a dois fatos de recente repercussão.

O primeiro deles é suspeita de desvios praticados pelo PSDB ao longo de mais de 15 anos em negócios e negociatas envolvendo o Metrô de São Paulo – batizado de "trensalão tucano" -, bilionário esquema de propinas supostamente pagas por multinacionais do setor de energia e transporte e governos do PSDB em São Paulo. A acusação indica que os envolvidos teriam recebido da multinacional Alston propinas de R$ 40,3 milhões, que somados às denúncias e confissões da Siemens, podem ultrapassar a casa dos 570 milhões. Há inquéritos, pessoas indiciadas, suspeitas que se aproximam do falecido ex-governador Mario Covas; do também ex-governador e ex-candidato a presidência da república, José Serra e do atual governador Geraldo Alckmin.

Tamanha é a avalanche de denúncias e o volume de dinheiro que pode ter sido surrupiado dos cofres públicos, que não houve como subtrair do noticiário esse assunto. Mas as matérias relacionadas ao caso foram, invariavelmente, veiculadas em volume muito aquém da gravidade das denúncias e com um texto  que quase sempre visava evitar a exposição dos principais líderes do PSDB.

O mesmo comportamento não vemos em relação às acusações que atingem a Petrobrás nestes dias, sobre irregularidades que teriam ocorrido quando Lula era presidente e Dilma ministra das minas e energia e presidenta do conselho daquela estatal. Tais denúncias são relacionadas à aquisição da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos.

Esse assunto virou "cabeça de pauta" em praticamente todos os grandes meios de comunicação, mas não com o objetivo de fazer o bom jornalismo e prestar esclarecimentos à sociedade acerca das acusações – que devem ser apuradas, claro -, mas sim o de criar uma crise política para tentar atingir o coração do governo e seu principal cabo eleitoral, o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva – sobre a aquisição de Pasadena, é oportuno buscar-se outras narrativas e  dentre elas sugiro a leitura das matérias sobre o tema no blog "O Cafezinho", como a que foi veiculada ontem sob o título " Exclusivo! Documentos comprovam que Astra pagou mais por Pasadena!"

A manipulação é tamanha, que a entrevista concedida pelo ex-presidente da Petrobrás, Sergio Gabrielli, foi ao ar  mutilada por uma edição direcionada para criar a impressão que Gabrielli se voltava contra Dilma. Quem puder assistir a íntegra da entrevista e compara-la com a edição da Globo irá perceber a torpe tentativa.

Esse é o comportamento histórico da maioria dos meios de comunicação no Brasil. Meios monopolizados e que representam os interesses das elites dominantes que desde sempre se apropriaram das instituições brasileiras e delas se beneficiam para manter as bases do sistema de dominação e acumulação de riquezas sob o controle de restrito círculo social, impondo à maioria da população o usufruto do que sobrar dessa sanha acumulativa.

Mas esse papel exercido pela mídia brasileira não é exclusividade nossa. Assim acontece pelo mundo afora, agora e sempre. A equação que define a relação entre poder e informação é milenar. Assim escreveu Gramsci em "Os Jornais e os operários", conforme artigo publicado no blog da Boitempo por Dênis de Moraes, Doutor em Comunicação e Cultura pela Universidade federal do Rio de Janeiro: "Tudo o que se publica (na imprensa burguesa) é constantemente influenciado por uma ideia: servir à classe dominante, o que se traduz sem dúvida num fato: combater a classe trabalhadora. (…) E não falemos daqueles casos em que o jornal burguês ou cala, ou deturpa, ou falsifica para enganar, iludir e manter na ignorância o público trabalhador".

Mas esse papel de porta voz da classe dominante exercido pelos meios de comunicação no Brasil é potencializado pelo monopólio do setor. São sete famílias que dominam todos os grandes veículos, mantendo uma situação que contrapõe o que determina a Constituição Federal, que proíbe o monopólio, em especial o monopólio cruzado, ou seja, aquele em que um único dono detém o controle de diversos tipos de meios, impedindo o contraditório, o contraponto, outra narrativa.

Com base nessa breve dissertação, é possível afirmar que o verdadeiro partido de oposição é o monopólio midiático, que cumpre o papel que caberia a partidos que se opõem ao projeto que hegemonizou a preferência do eleitorado brasileiro a partir de 2003.

Como escreveu Dênis de Moraes, em seu artigo citado acima, "Os meios de comunicação procuram intervir nos planos ideológico-cultural e político com o intuito de disseminar informações e ideias que concorrem para a formação e a sedimentação do consenso em torno de determinadas concepções de mundo. A maioria deles funciona como alicerces para a conservação da hegemonia do que José Paulo Netto bem definiu como 'a ordem social comandada pelo capital' em 'O leitor de Marx' (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012, p. 7.)".

Claudio Machado é Membro do Comitê Estadual e Secretário Estadual de Comunicação do PCdoB/ES