No Iraque, EUA chamam petróleo e política de "sectarismo e islamismo"

Na esteira das mesmas estratégias que têm tomado contornos inesperados, o sectarismo é instrumento da fragmentação e da manipulação política. Novamente, o cenário é o Iraque e a potência imperialista atrás do leme é, previsivelmente, os Estados Unidos. Para isso, os estereótipos construídos à martelada sobre o Islã, os árabes, o terrorismo e o “extremismo”, todos cuidadosamente fundidos pela narrativa ocidental, são a ferramenta corrente.

Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho

Assim como na Síria, a desestabilização e a ruptura desenham-se como objetivos centrais da recente intensificação da violência no Iraque, cenário em que se mostram demasiados atores externos, regionais e globais.

No caso dos Estados Unidos, a fórmula é a mesma e a tática, também, embora o presidente Barack Obama tenha afirmado, em discurso recente, que a sua “nova política externa” – ficou para explicar o que há de “novo” em termos de pensamento – não tratará todas as questões com a sola da bota dos seus soldados.

É assim que alguns analistas têm explicado a “relutância” estadunidense em devolver as suas tropas ao Iraque, que ficou ocupado pelas forças imperialistas de 2003 a 2011, período em que a destruição nacional, política, social e econômica foi quase completa. Além disso, alguns milhares de soldados norte-americanos foram mantidos no país árabe, sob a categoria de “consultores” do setor securitário.

O cinismo dessa situação é indizível. Já é comprovado, em todo o mundo, o impacto da presença e da ocupação militar, especialmente a estadunidense, que mergulha países e povos na insegurança, na dominação e na opressão, componentes essenciais dos projetos de manutenção e expansão da “liderança” dos EUA pelo globo.

Mais uma vez, a recente escalada de violência no Iraque – com atuação de um grupo tão extremista que foi expulso até mesmo da rede Al-Qaeda – é explicado dentro do quadrado politicamente elaborado e deliberadamente estereotipado das divisões sectárias, tensões apresentadas como quase inerentes aos islâmicos desde as investidas colonialistas do Ocidente. No caso iraquiano, as “partes em disputa” quase irracional e “apaixonada” – ou irracional – seriam os sunitas, os xiitas e os curdos.

O grupo suspenso da Al-Qaeda, Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL), ficou mais conhecido devido à sua atuação na Síria, com brutalidade tamanha que chegou a ser condenado pelos líderes e pela mídia ocidental, que apoiam incondicionalmente os chamados “rebeldes” contra o governo do presidente Bashar Al-Assad. Embora a virulência da atuação de grupos como o EIIL e outros fique comprovada, a agenda permanece inalterada.

O Iraque, como se sabe com mais clareza desde as críticas veementes aos pretextos apresentados pelos EUA para a sua invasão, é rico em petróleo e em divergências internas – o que deveria parecer algo usual no âmbito político – a serem inflamadas como instrumento de fragmentação e dominação exterior.

De volta ao petróleo e à resistência

Recentemente, acordos realizados por vizinhos como a Turquia com a província do Curdistão inflamaram as relações com o governo central iraquiano, devido à intromissão em um tema de disputa no país, uma vez que lideranças curdas insistem na reivindicação por independência. Mas este é apenas um exemplo, importante devido à relevância dos contratos petrolíferos com empresas estrangeiras no país, frequentemente “advertidas” pelo governo iraquiano por seus abusos no espectro político.

Não são raras as análises que ligam a questão do petróleo no Iraque diretamente com a sua luta por defesa e manutenção da soberania. Enquanto as potências ocidentais, nomeadamente os Estados Unidos, continuam brincando com ondas a serem criadas e surfadas no Oriente Médio, com o financiamento e treinamento de grupos mobilizáveis em torno do extremismo, a trajetória sempre acaba sendo útil nas duas vias, já que o combate aos mesmos grupos é depois usado para justificar a manutenção de tropas estadunidenses no mesmo local.

No caso iraquiano, substituir brutalmente o governo de Saddam Hussein, cujo enforcamento em praça pública pelos carrascos executores ocidentais, em dezembro de 2006, foi um tiro pela culatra para os EUA. O governo estadunidense não simpatiza com os xiitas que assumiram o poder através de Maliki, depois de a ocupação ter instalado uma Autoridade Provisional da Coalizão para governar o país por um ano e que garantiu a privatização da economia iraquiana.

O julgamento de Hussein e outros membros do governo do Partido Baath pelo Tribunal Especial para o Iraque – depois denominado Supremo Tribunal Penal Iraquiano – foi mais uma demonstração da seleção especial sobre que justiças são legítimas e que atores são responsabilizados da forma mais condizente com a agenda política em aplicação. Depois disso, os inúmeros crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos pelos “aliados” ocidentais no país, sobretudo pelas botas estadunidenses, ainda ficam por ser julgados.

Assim como o islamismo, o pan-arabismo socialista do partido Baath, também atacado na Síria, é repleto de simbolismos de resistência que incluem as cores da bandeira anti-imperialista desde a dominação otomana, enfrentada pelas revoltas árabes. Com o imperialismo ocidental não é diferente, mas o posicionamento contra a sua agenda é frequentemente punido com hipocrisia, força e ataques frontais ao direito internacional, até agora impunes.