Cláudio Ferreira Lima: Capitalismo e desigualdade

Por *Cláudio Ferreira Lima

Vivemos sob o capitalismo: grosso modo, as empresas competem entre si pela maior fatia do mercado e o capital e o trabalho disputam a parcela da renda que caberá a cada um nesse processo. E como, no fundo, trata-se de acumular capital é fácil saber com quem fica a parte do leão no bolo.

Mas para que o jogo possa ser jogado dentro de certa normalidade há ainda o Estado, que também tem fatia no bolo.

Assim, no embate de forças no campo político, o sistema se “legitima”. As decisões que afetam a todos ocorrem – nas democracias, claro – em câmaras legislativas, sob um sistema legal, cujos guardiões são as cortes de justiça.

No plano internacional, uma organização interestatal de países, sob o comando dos Estados Unidos (detentor de poderio bélico, moeda universal e liderança em C & T), mantém a “ordem unida” e “legitima” o sistema em nível mundial.

A desigualdade (junto com a razão de mercado, o progresso técnico e a concentração produtiva) é o traço mais marcante. Em O capital no século XXI, lançado em francês pela Seuil (2013), em inglês pela Belknap Press (2014) e, breve, em português pela Intrínseca, o economista francês Thomas Piquetty ilumina com rigor teórico e números a discussão a esse respeito.

Piketty mostra que os patrimônios mais elevados crescem mais rapidamente que a economia, conduzindo a desmedida concentração de capital, que poderá comprometer o funcionamento das instituições democráticas. Está aí, para ele, a contradição central do capitalismo.

O Brasil não consta da pesquisa de Piquetty; a Receita Federal, alegando sigilo fiscal, não divulga dados sobre renda e riqueza no país. Quanto à renda, de 2000 a 2010, houve aqui, conforme a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios), do IBGE, queda da desigualdade: os 10% mais ricos saíram de 51,1% para 48,2%, e a diferença beneficiou os 60% mais pobres, que evoluíram de 18,1% para 21,5%. Marcelo Néri, porém, pondera que “As pesquisas não captam bem a renda dos ricos e do capital em geral” (Folha de São Paulo, 10/8/2008). O que é certo é que o 1% mais rico continua com a mesma fatia de 17,2% da renda nacional.

Onda de protestos corre o mundo. Os países centrais buscam calibrar o rendimento do capital para trazer a desigualdade a um nível aceitável de temperatura e pressão social. Para Piketty, que já foi ouvido pela Casa Branca e Wall Street, a solução reside no imposto progressivo anual sobre o capital, solução, ante as mais de 900 páginas que resumem 15 anos de pesquisa, tida como acanhada pelos seus críticos.

Já em reportagem especial (ver CartaCapital, 31/10/2012, p.44), que reúne estudos sobre a desigualdade e a mobilidade social nos Estados Unidos, Ásia emergente, América Latina e Suécia, The Economist conclui que a agenda de reformas não deve tratar de impostos mais altos ou mais benefícios, porém de combater o clientelismo e investir nos jovens.

Está, pois, na ordem do dia uma questão crucial: a distribuição de renda e riqueza. Que seja levada ao debate no Brasil nestas eleições.

*Cláudio Ferreira Lima é Economista

Fonte: O Povo

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