Artigo | Ney Campello: A Copa não acabou

Descem às cortinas, as luzes se apagam e o espetáculo está encerrado. Assim pode parecer, à primeira vista, o desfecho da Copa do Mundo no Brasil, cujo evento terminativo foi o jogo Alemanha versus Argentina, consagrando a equipe europeia tetracampeã mundial de futebol, que num gesto engenhoso de cordialidade e integração cultural celebrou a conquista da cobiçada taça, dançando em torno dela a dança dos Pataxós, no santuário do futebol mundial, o Maracanã.

Por Ney Campello*, no Correio da Bahia

Hora de voltar ao cotidiano de nossas vidas, recolher confetes e bandeirolas e enfrentar "a dor e a delícia de ser brasileiro". Ilusão de ótica! O Estado brasileiro coroou de êxito um evento único de incomparáveis proporções, enfrentando obstáculos, os mais variados, alguns ditos intransponíveis, e fez a "Copa das Copas", como prometido pelo Governo. 

Vencemos a difamação e a irracionalidade de um pensamento político retrógrado, associado a uma autoestima rasa, que por quatro anos tentou convencer a nação de nossa incapacidade realizadora. Mais grave ainda, fomos expostos ao mundo como um país caótico, desestruturado, inseguro e impotente. "A prática como critério da verdade" derrotou o pessimismo e o medo, e fizemos o maior espetáculo do planeta, com alegria, celebração, integração de centenas de nações, com um planejamento que possibilitou tranquilidade, proteção à integridade de todos, lazer, entretenimento e um calor humano que dificilmente voltaremos a vivenciar em outras edições do evento.

O povo brasileiro venceu a Copa nas ruas e nos estádios, numa demonstração de inteligência política coletiva surpreendente, pois demarcou clara posição de receber bem e de rejeitar a ideia de macular a imagem de sua própria Casa, a pátria brasileira, como estratégia equivocada de defesa de melhorias na qualidade dos serviços públicos essenciais, sobretudo, mobilidade, segurança, saúde e educação. O pacto federativo entre a União, estados e municípios, venceu a Copa em seu desafio operacional e logístico, numa cabal demonstração de que estamos preparados para recepcionar qualquer megaevento internacional. Soubemos dialogar com soberania e altivez com a Fifa/COL, num esforço que resultou em consensos produtivos. Assim reconheceram os estrangeiros que elegeram a Copa 2014, como a "melhor de todas as Copas", com 39% de aprovação contra 19% para a Copa de 2006 na Alemanha.

A Bahia comemora a "melhor operação da Copa", nos dois grandes eventos, a FWC (Confederation Cup) e a FWC (World Cup), esta última com nota 9,7. Fomos na operação, a "sede das sedes" da "Copa das Copas". As maiores goleadas na Arena Fonte Nova, jogos fantásticos, o metrô funcionando e respondendo por 15% dos que chegaram ao estádio, nenhum homicídio ou delito de maior gravidade no Fan Fest e nas três exibições públicas que o Governo do Estado promoveu no Pelourinho, Imbuí e Plataforma. 70.000 turistas de dezenas de nações passaram por aqui, o equivalente ao público estrangeiro de 17 carnavais. R$800 milhões de circulação financeira na Bahia, ou seja, mais que o valor investido para a construção da Arena Fonte Nova. Projetos pela paz, contra o racismo, em proteção à juventude, e o "Gol Verde", projeto inédito de sustentabilidade que marcou a Copa no Brasil, em que cada gol representará um campo de futebol de recomposição da mata atlântica.

O êxito deste evento deveu-se a dois fatores essenciais: integração na operação e participação popular. Por isso, a Copa aconteceu e pela mesma razão ela não acabou. Entramos agora no paradigma pós-Copa, que sintetiza o dever público de realizar a transição desse corolário de empreendimentos, conhecimentos, técnicas e exponencial exposição da imagem do país para o mundo, para o cotidiano da sociedade brasileira e baiana.

A integração operacional na segurança, mobilidade, saúde, turismo, etc., deve se converter em nova qualidade na prestação de serviços para o cidadão, no legado prometido por todos nós, agentes públicos, de que para além de estádios, portos, aeroportos e metrôs, o cidadão brasileiro anseia por mais qualidade de vida, tratamento digno e respeitoso na prestação dos serviços públicos, nos moldes do que fizemos na Copa, um novo padrão "brasileiro" de servir e conviver, com elevada ética e estética nas relações de cidadania. Ou aprendemos verdadeiramente com a Copa e elevamos a qualidade da prestação de serviços pelos entes governamentais, ou nos perguntaremos mais tarde, para que mesmo terá valido esse grande feito.

A Copa só está começando para o país justo e solidário que estamos construindo. Quem fez a Copa das Copas pode fazer um país ainda melhor.

*Ney Campello é secretário estadual para Assuntos da Copa