Emmanuel Furtado: O povo que queria falar javanês

Os estudiosos da literatura brasileira tendem a comparar Lima Barreto, com seu “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, ao fundador da Academia Brasileira de Letras, Machado de Assis. Deixemos que os doutos se entendam… O que se pretende refletir é sobre o tema central do conto “O homem que sabia javanês”, do citado Lima Barreto.

Por *Emmanuel Furtado

Mulher manipula cédulas de real

Resumindo, o personagem principal não sabia uma só palavra do idioma javanês, mas se comprometeu, para o ganho de alguns trocados, a ser professor de javanês de exigente, aquinhoado, formal e rigoroso senhor, que passou a confiar que, dali para frente, com as minuciosas aulas da língua estrangeira, aprenderia a dominar o idioma javanês. Cada aula era um suplício para o professor, que se incumbia de inventar palavras e expressões, em desfavor do aluno. Lógico que o fim da obra há de ser lembrado por quem leu o conto e não serei eu que tirarei a graça ao contar o fim da estória para quem ainda não o fez! Saltando da ficção para a realidade: o povo brasileiro não tolerava mais a corrupção!

Esperando que tal malefício social tivesse um basta, que a economia entrasse em ordem, que empresas como a Petrobras, dentre outras, não fossem dadas de mão beijada ao capital estrangeiro, que houvesse melhorias substanciais na saúde, educação, distribuição de renda e nas condições do trabalhador brasileiro, vestindo verde e amarelo milhares de cidadãos foram às ruas e praças, batendo panelas, chegando a Câmara a autorizar processo de afastamento da presidente da República, cujo rito continua no Senado.

Entretanto, o que se tem visto é a perspectiva de diminuição de verbas para a educação, saúde, direitos dos trabalhadores, economia titubeante e grandes corruptos da República livres da Justiça. Panelas não são mais batidas, mas o logro continua, com certeza bem mais grave que o perpetrado pelo frágil professor de javanês, sendo o lesado, novamente, o bem intencionado cidadão brasileiro! A vida, mais uma vez, imita a arte!

*Emmanuel Furtado é desembargador do TRT e professor da UFC.

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