Ofensiva contra a paz: EUA reconhecem Jerusalém como capital de Israel
Trump anunciou formalmente a mudança da embaixada para Jerusalém nessa quarta-feira (6), após reconhece-la formalmente como capital de Israel; na terça-feira (5) o presidente norte-americano comunicou a sua decisão a Mahmoud Abbas, presidente da Palestina. O reconhecimento concretiza receios de uma nova explosão de violência
Publicado 06/12/2017 16:47
Em seu discurso, o presidente norte-americano afirmou que “é tempo de oficialmente reconhecer Jerusalém como capital de Israel” e que toma a decisão “no melhor dos interesses dos Estados Unidos”. Segundo ele, esse seria um método de procurar a paz entre Israel e Palestina, dizendo-se “comprometido com um acordo de paz que seja aceitável para ambas as partes”. Contudo, ao fazer o reconhecimento, Trump ignorou completamente as manifestações palestinas de seus direitos e vontades, além de violar decisões internacionais reconhecidas pela ONU.
Após uma semana conturbada em que o presidente norte-americano fez declarações islamofóbicas além de fechar as fronteiras dos EUA, agora Trump contraria todos os apelos de diversos líderes ao redor do globo, afirmando que “hoje finalmente reconhecemos o óbvio. Que Jerusalém é a capital de Israel. Nada mais nada menos do que o reconhecimento da realidade. É também a coisa certa a fazer. É algo que tem de ser feito”.
Nabil Abu Rudeineh, porta-voz da AP, divulgou um comunicado de acordo com o qual Abbas “alertou Trump sobre as perigosas consequências de tal passo” para o processo de paz e para a segurança e a estabilidade na região e no mundo.
Segundo o comunicado, Abbas reafirmou a posição firme da liderança palestina de que um Estado Palestino só terá futuro com uma Jerusalém Oriental não ocupada como sendo sua capital, tal como estabelecido pelas resoluções internacionais, indica a agência Ma'an.
Donald Trump também ligou para diversos líderes regionais, como o rei da Jordânia, Abdullah II. De acordo com o diário israelita Haaretz, o rei teria dito a Trump que “frustraria qualquer iniciativa americana de renovar o processo de paz e que instigaria a raiva e a resistência tanto entre os muçulmanos como os cristãos”, caso a embaixada dos EUA fosse mudada para Jerusalém.
Trump discursa na quarta-feira (6) e reconhece Jerusalém como capital de Israel
Prevendo reações pouco amistosas quanto ao reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel e ao anúncio da mudança da embaixada, Washington deu ordens para reforçar a segurança das suas embaixadas pelo mundo fora e aconselhou os seus funcionários governamentais a evitarem a Cidade Velha de Jerusalém e a Margem Ocidental ocupada, informa o The Guardian.
Promessas eleitorais
A mudança da Embaixada dos Estados Unidos para Jerusalém foi aprovada em 1995 pelo Congresso, mas, desde então, os diversos chefes de Estado norte-americanos assinam uma dispensa que adia a decisão por seis meses. Em sua campanha eleitoral, Trump prometeu levar a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém.
Há 70 anos, o acordo de partição da Palestina situava provisoriamente a cidade sob administração internacional. Mas logo a parte ocidental foi ocupada por Israel, e depois da Guerra dos Seis Dias, em junho de 1967, também o lado oriental – justamente a área que os palestinos consideram como sua capital, ideia defendida por aqueles que apoiam a solução de “dois estados” e as negociações de paz entre Israel e Palestina.
Desde o início de seu primeiro ano de mandato, Donald Trump tem insistido que a paz entre palestinos e israelitas é algo que gostaria de ver concretizado durante a sua presidência. Também já afirmou, quebrando laços com a posição oficial há muito mantida pelos EUA, que poderia aceitar a solução de “um só Estado”. Novamente, ele se contradiz e reafirma sua fé pró-Israel, sempre apoiado pelos EUA e vice-versa.
Os funcionários da administração Trump, conhecida por abrigar vários apoiantes das políticas de Israel, deixaram claro, nos últimos dias, que não foi contraditório, mas que a mudança da embaixada é um fato e que o atual presidente não iria seguir os passos dos seus antecessores. Na segunda-feira (4), Hogan Gidley, do gabinete de imprensa da Casa Branca, disse que “Trump foi claro desde o início” e que “não era uma questão de ‘se’, mas de ‘como’ e ‘quando’”, indica a PressTV.
Jerusalém
Os israelenses parecem já estar “mais à vontade” em Jerusalém: têm incrementado o número de ameaças em locais religiosos não-judaicos e intensificado o plano de “judaização” da Jerusalém Oriental – denunciado pelos palestinos em diversas ocasiões –, aumentando a construção de colonatos e expulsando os palestinos de suas casas, que são muitas vezes demolidas.
Repúdio internacional à decisão
A Casa Branca argumenta que o movimento, embora desejado, é atualmente impossível por questões logísticas. “Não há maneira de fazer isso rapidamente. Só as autorizações e a segurança podem levar anos”, observou um porta-voz. Apesar disso, a decisão de Trump, longe de qualquer consenso, tornou a demonstrar que ele só é fiel aos seus interesses, ignorando os interesses internacionais e o direito de autodeterminação dos povos, no caso da Palestina.
Vários países árabes condenaram a transferência da embaixada – incluindo a Arábia Saudita, acusada por alguns de “manter as aparências” – e a Turquia, que prometeu represálias, que “poderiam chegar ao rompimento das nossas relações diplomáticas com Israel. É um limite intransponível para a órbita muçulmana”. O governo português considera que a decisão é contraproducente à solução de dois estados, e Emmanuel Macron tentou convencer por telefone Trump, argumentando que “a questão de Jerusalém deveria ser tratada no âmbito das negociações de paz entre israelenses e palestinos, aspirando à criação de dois Estados que convivam em paz, com Jerusalém como capital [de ambos]”.
A chefa da diplomacia da União Europeia, Federica Mogherini, pediu a Trump que “evite qualquer ação que mine uma solução com dois Estados entre Israel e a Palestina”, em vão.
O Hamas, que controla a Faixa de Gaza, prometeu lutar, e a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) qualificou a medida como o “beijo da morte” para a paz.
De acordo com o Haaretz, o repúdio diante do reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel também se fez sentir por alguns no próprio país judaico, onde acadêmicos, antigos embaixadores e defensores da paz enviaram uma carta a um representante de Trump.