08 de Março no Ceará reúne milhares de manifestantes

Dia 8 de Março foi dia de luta em Fortaleza. O ato unificado teve como tema "Pela Vida das Mulheres Somos Todas Marielle, Stefhani, Ingrid e Dandara", percorreu ruas do Centro de Fortaleza com um tom forte de denúncia contra os retrocessos promovidos pelo governo Bolsonaro, contra o feminicídio, a reforma da previdência e a luta pela igualdade de gênero.

8 de março ce

O ato unificado, organizado por movimentos de mulheres do Ceará, mobilizou milhares e concentrou-se a partir das 15 horas, na Praça General Murilo Borges, conhecida por Praça da Justiça. Algumas alas foram criadas para dialogar com os mais diversos setores da sociedade, tais como a Ala Marielle, a da Reforma da Previdência, a da tragédia em Brumadinho e a ala das mulheres indígenas. A manifestação saiu em caminhada, fez uma parada simbólica na sede da Previdência Social, onde mulheres sindicalistas e centrais sindicais fizeram falas, denunciando a crueldade da reforma da previdência contra trabalhadores e, em especial, trabalhadoras. Logo após, a manifestação percorreu diversas ruas do Centro em direção ao Benfica, com uma parada também em frente ao Instituto Federal do Ceará – IFCE, onde entidades estudantis e de professores denunciaram o desmonte da educação pública promovida pelo atual governo federal. O ato finalizou na Praça da Gentilândia, onde ocorreu um ato cultural de resistência. Vários movimentos falaram no palco montado na Praça, e logo após prestigiaram as atrações musicais protagonizadas por artistas mulheres.

Mulheres de Luta

A União Brasileira de Mulheres – UBM, do Ceará, era uma das entidades que coordenava o ato unificado. Uma das participantes, a psicóloga Laila Teles elogiou a organização: "O 8 de março foi muito importante! Parabenizo a UBM Ceará, o PCdoB Ceará e outras entidades que organizaram o evento com muita firmeza, foi tudo muito organizado, seguro, animado! Foi um momento que trouxe com certeza mais ânimo para a luta das mulheres. O fôlego que precisávamos depois do ‘Ele Não’, para reafirmar a certeza de que ninguém vai soltar a mão de ninguém!”, afirmou.

Vários movimentos sindicais protestaram contra a reforma da previdência defendida por Bolsonaro. A sindicalista Penha Mesquita, do SEEACONCE, aponta: “Essa reforma aprofunda as desigualdades entre homens e mulheres, porque nós temos duplas e até triplas jornadas de trabalho. Os prejuízos são imensos para as mulheres trabalhadoras, que já sofrem com salários inferiores, com a exploração pela classe patronal e que a maioria é a provedora do sustento da própria família.”

O ato unificado tratou também dos feminicídios de mulheres que ocorrem com frequência no país, mesmo depois de tantas campanhas de conscientização e da eficiência no cumprimento das leis Maria da Penha e da lei do feminicídio. A presidenta estadual da UBM Ceará Francileuda Soares destaca: “Não vão calar a nossa voz! Nós estamos aqui pra gritar por nós e pelas que não podem mais gritar, porque foram silenciadas pelo machismo e pela misoginia. Nós somos resistência! Nós queremos respeito às nossas vidas! Nenhuma a menos! Nós queremos viver e viver com dignidade.

Um destaque muito importante deste 08 de Março foram as pautas das mulheres negras em evidência. A baiana e médica cubana Taís Matos ressalta: “A sociedade não vai avançar enquanto nós não conquistarmos todos os espaços que são nossos também por direito. É bastante difícil, mas com resistência, nós promoveremos as grandes transformações sociais na estrutura do capitalismo. A revolução não será outra senão feminista e negra.”

Casa da Mulher Cearense

A deputada estadual Augusta Brito, que também é Procuradora Especial da Mulher da Assembleia Legislativa, marcou presença durante todo o ato, caminhando na ala contra a Reforma da Previdência. Usando uma blusa com a palavra “Respeito”, a parlamentar realizou, durante o carnaval cearense deste ano, uma campanha com adesivos-tatuagens de corpo com os dizeres “Não é Não” e “Respeito Seu Não”, a fim de conscientizar mulheres e homens a enfrentarem o assédio e a importunação sexual contra mulheres. “A nossa luta, das mulheres, é todos os dias por respeito, por liberdade e por emancipação. Nós ainda vivemos sob situações de violência impostas pelo machismo, mas aqui no Ceará nós estamos dando um passo muito importante que será a criação da Casa da Mulher Cearense, em algumas regiões do estado, semelhantes à Casa da Mulher Brasileira. Nós não podemos admitir que a violência doméstica e familiar continue oprimindo as nossas cearenses. Portanto, nosso mandato está à disposição das mulheres e pelo fim da violência.” O projeto de lei da Casa da Mulher Cearense é de autoria da deputada Augusta Brito e foi sancionado pelo governador Camilo Santana, na manhã do dia 08 de março.

Repercussão

O ato unificado teve bastante repercussão na mídia cearense. Os movimentos de mulheres estão organizando um momento para avaliação do ato e discutindo a possibilidade da construção de uma frente feminista unificada no Ceará. Para a Secretária de Mulheres do PCdoB Ceará, Nágyla Drumond: “As mulheres são protagonistas da luta contra o capitalismo. Sabemos que somos fundamentais no processo revolucionário, que há de desconstruir essa sociedade patriarcal e hierárquica, que insiste em nos privar de direitos. O socialismo é o caminho e nós, mulheres, somos suas construtoras.”

Marielle, Stefhani, Ingrid e Dandara

As homenageadas pelos movimentos de mulheres do Ceará tornaram-se ícones da luta das mulheres após serem todas brutalmente assassinadas. Marielle Franco era vereadora pelo PSOL na cidade do Rio de Janeiro, negra, lésbica e enfrentava o poder masculino, branco, hétero e elitista dentro da Câmara Municipal. No próximo dia 14 de março, completará um ano do seu assassinato, cujas investigações caminham para um homicídio motivado por razões políticas.

Stefhani Brito era cearense, tinha apenas 22 anos e foi assassinada no primeiro dia do ano de 2018, pelo ex-companheiro que não aceitava o fim do relacionamento. Seu corpo foi encontrado às margens da Lagoa da Libânia, no Mondubim, com as duas pernas quebradas e vários golpes de faca. A vizinhança relatou à polícia que viu Stefhani sendo agredida pelo ex, mas ninguém interviu. O assassino foi preso no final de fevereiro de 2019, em uma cidade no Pará e trazido para um presídio em Fortaleza, onde aguardará julgamento pelo crime de feminicídio.

Ingrid Mayara era uma jovem cearense que foi assassinada por um tiro fatal da Polícia Militar, durante uma intervenção desastrosa em uma festa de pré-carnaval, no Bairro Ellery, em 2013. Até hoje, nenhum responsável foi condenado pelo assassinato de Ingrid e de um outro rapaz que também foi vitimado no local. A mãe de Ingrid, Sandra Sales, luta por Justiça por sua filha, que deixou na época uma bebê de pouco mais de um ano.

Dandara Kethlen era a travesti cuja tortura e espancamento, que antecederam seu assassinato, foram gravados e circularam em redes sociais pelo mundo inteiro, ratificando a lamentável marca para o Brasil de país que mais matas mulheres travestis e transexuais no mundo. Dandara foi assassinada em 15 de fevereiro de 2017, mas apenas cinco acusados foram condenados, quatro aguardam julgamento por serem menores, dois permanecem foragidos e um já morreu. Pela primeira vez na história do Judiciário cearense, registrou-se que a homofobia e a transfobia foram agravantes para a motivação de um homicídio.