Sem debate, Senado entrega ao agronegócio fiscalização sobre os alimentos

De acordo com auditores fiscais, o projeto oferece riscos à segurança alimentar. Trata-se de hormônios, antimicrobianos e antiparasitários que deixam resíduos, por exemplo, nas carnes, ovos e leite

(Foto: Arquivo/FAO/ONU)

Em caráter terminativo, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado aprovou nesta quinta-feira (23) o projeto de lei 1293/2021, que retira do estado e passa aos empresários do agronegócio a responsabilidade pelo cumprimento de normas sanitárias de fiscalização dos alimentos. Por três votos a dois, foi rejeitado um requerimento que pedia maior debate sobre o assunto. Caso não tenha recursos ao plenário, a matéria seguirá à sanção presidencial.

O projeto, conhecido como “boiadinha”, foi enviado pelo executivo ao Congresso e teve voto favorável de Luis Carlos Heinze (PP-SC), o relator da matéria, Esperidião Amin (PP-SC) e Margareth Buzetti (PP-MT). Votaram contra Paulo Rocha (PT-PA) e Zenaide Maia (Pros-RN).

Em nota, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical) pediu aos dois senadores que votaram contra que recorram ao plenário da Casa. “Tendo em vista o poder terminativo da CRA, será aberto prazo para a interposição de recurso, por pelo menos nove senadores, para que a matéria seja apreciada por todos os parlamentares”, diz um trecho do documento.

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De acordo com Anffa Sindical, o projeto oferece riscos à segurança alimentar ao delegar a terceiros a auditoria e a fiscalização. “Estamos falando de hormônios, antimicrobianos e antiparasitários que deixam resíduos nas carnes, ovos, leite e outros alimentos que consumimos. É uma porta aberta para a terceirização de nossas atividades. Somos os últimos guardiães do consumidor brasileiro. Se abruptamente formos retirados de uma planta frigorífica, por exemplo, isso deixa o consumidor muito indefeso”, disse o presidente da entidade, Janus Pablo.

Senador Paulo Rocha durante votação do projeto na CRA (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

Debate

Paulo Rocha, que é líder do PT na Casa, ainda argumentou que diversos setores estão pedindo para debater a matéria e que não podem ser ignorados.  “O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, por exemplo, está brigando, está querendo ser ouvido, o Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva, Sinergia Animal, Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, etc., inclusive universidades, como alguma universidade da Amazônia, que tenha experiência e pesquisas sobre essas questões”, afirmou o senador.

Para ele, não é o momento correto para tirar o poder de fiscalização do poder público. “Nós estamos exatamente tentando disciplinar os avanços e as conquistas do agronegócio, mas também em respeito à questão ambiental, à saúde pública, etc., etc. E vejam que também isso tem reflexo internacional, uma vez que nós vamos vender os nossos produtos, que são eminentemente de exportação”, justificou.

“Eu gostaria de deixar claro aqui que eu não tenho nada contra o agronegócio. Eu só acho que a gente não pode, em tudo que é de responsabilidade dos órgãos que fiscalizam e têm o controle, como não estão funcionando devidamente e deixando as demandas reprimidas, com o agronegócio prejudicando e deixando de facilitar, de gerar emprego e renda. O que a gente precisa, na realidade, é de aumentar a capacidade técnica de nossos órgãos de fiscalização e controle”, defendeu Zenaide Maia.

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