Orçamento de 2023 garfa benefícios de ano eleitoral. Veja onde o povo perde

Proposta estabelece valor de R$ 405 para o Auxílio Brasil, ao invés dos R$ 600 prometidos por Bolsonaro; além disso, salário mínimo não terá aumento real, auxílio gás será reduzido e tabela do IR ficará inalterada

Foto: Agência Brasil

A proposta do Orçamento de 2023 enviada pelo governo Bolsonaro ao Congresso nesta quarta-feira (31) deixou evidente que o presidente não cumpriu com suas próprias promessas sobre os benefícios sociais destinados às camadas mais vulneráveis da população. Temendo perder a eleição para o ex-presidente Lula (PT), Bolsonaro acionou sua base para aprovar, às pressas, um “pacote de bondades” que, dentre as medidas, incluía o aumento do Auxílio Brasil para R$ 600, prometendo que o valor continuaria em 2023. No entanto, a peça orçamentária enviada ontem estabeleceu o valor médio de R$ 405. 

O vai-e-vem sobre o benefício não é novo no governo de Jair Messias Bolsonaro e mostra seu desrespeito com a fatia mais necessitada da população, que vive na “corda bamba” da incerteza, sem ter garantia ou previsibilidade sobre quanto vai receber e até quando e vendo sua renda variando ao sabor dos interesses em jogo.

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“Os brasileiros mais pobres têm de fato vivido uma montanha-russa nos três últimos anos. A renda mensal dos 10% mais pobres já vinha em queda antes da chegada da Covid-19 ao Brasil e despencou a menos da metade no início do isolamento social (R$ 114 em novembro de 2019 a R$ 52 em março de 2020). Desde este mínimo, a renda do grupo foi mais do que quadruplicada até seu pico histórico em agosto do mesmo ano (R$ 215), na fase mais generosa do Auxílio Emergencial. Daquele valor de pico, desabou, ficando 15,8% abaixo do nível pré-pandemia (R$ 96 em novembro de 2021)”, apontou o estudo “A Montanha Russa da Pobreza”, realizado por Marcelo Neri e Marcos Hecksher, da FGV-Social, e divulgado em junho deste ano.

Essa situação reflete a falta de compromisso do governo frente à urgência de enfrentar a pobreza, em especial a partir da pandemia. Quando a Covid-19 chegou ao Brasil, em 2020, passou a ser aventada a necessidade de garantir uma renda mínima capaz de suprir as demandas básicas das famílias durante o isolamento. O governo era inicialmente contra e depois propôs auxílio emergencial de apenas R$ 200 para trabalhadores informais. 

A pressão da oposição fez com que o valor fosse elevado para R$ 600. Em setembro daquele ano, foi para R$ 300. O auxílio foi pago apenas até o final de 2020, mesmo com o governo sabendo da gravidade e da continuidade da crise social. Somente em abril de 2021, o pagamento foi retomado, após aprovação de uma PEC pelo Congresso — os valores, então, passaram a ser de R$ 150 a R$ 375. 

Mais tarde, no final de 2021, buscando apagar a marca deixada pelo Bolsa Família e já de olho na disputa do ano seguinte, o governo mudou o benefício de nome, passando a chamá-lo de Auxílio Brasil, com valor médio de R$ 224, abaixo, portanto, dos R$ 400 prometidos. Em dezembro, via Medida Provisória, ampliou o valor. Até que em agosto, após a aprovação da “PEC do Desespero”, passou a valer o valor de R$ 600 até o final do ano, com a promessa de continuidade em 2023, agora descumprida. 

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Mas, não é só esse o furo de Bolsonaro com o povo contido no orçamento de 2023. A previsão de gastos do presidente para o próximo ano deixa a população na mão em outros itens.

Salário mínimo

Bolsonaro optou, desde o início de seu governo, por não dar continuidade à política de valorização do salário mínimo que vinha sendo implementada desde o governo Lula e que tinha como base a atualização anual do valor pela inflação, somado à variação do Produto Interno Bruto (PIB). Agora, só é repassada a correção inflacionária.

De acordo com o sociólogo Clemente Ganz Lúcio, “desde 2002, a política de valorização garantiu um aumento real de mais de 78%”. Sem esse aumento real, explicou, “o salário mínimo hoje seria de R$ 678,00”.

O valor provisório indicado pelo governo para o próximo ano é de R$ 1.302, apenas R$ 90 acima do atual, sem ganho real. O salário mínimo atual, que é de de R$ 1.212, não compra sequer duas cestas básicas. 

Auxílio Gás

O Auxílio Gás também vai diminuir no próximo ano. O benefício atende, hoje, 5,7 milhões de famílias com R$ 110 a cada dois meses. O valor, que já é pouco diante dos valores cobrados pelo produto graças à política de paridade com o dólar da Petrobras criada em 2016 e mantida por Bolsonaro, passará a ser de apenas R$ 65,70, ou seja, metade do valor médio do botijão de 13 kg.

Imposto de Renda

Também ficou de fora a correção da tabela de Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Com isso, mais brasileiros acabam sendo obrigados a pagar o imposto mensalmente, mesmo tendo salários baixos — afinal, hoje só é isento quem recebe até R$ 1.903,98. 

No começo deste mês, Bolsonaro chegou a declarar que estava “acertado” com seu ministro da Economia, Paulo Guedes, que a correção aconteceria a partir de 2023, mas, isso não está contemplado no orçamento.

Apesar de todas essas restrições, o orçamento encaminhado pelo governo Bolsonaro reservou R$ 19,4 bilhões — do total de R$ 38,8 bi destinados às emendas parlamentares — para o orçamento secreto, que tem sido usado para garantir o apoio do centrão ao presidente. 

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