Governo usa Ipea para tentar esconder 33 milhões de famintos no país

Servidores esclarecem que não participaram da elaboração do estudo divulgado pelo presidente do órgão. O documento é considerado propaganda eleitoral

Foto: MTST

Erik Alencar de Figueiredo, nomeado em março para presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão ligado ao Ministério da Economia, aprontou uma grande confusão na instituição ao divulgar um estudo fraudulento negando o avanço da fome no país. Em nota, Associação dos Funcionários do Ipea (Afipea) esclarece que os servidores não participaram da elaboração do documento, que é considerado uma peça de propaganda eleitoral.

No mês passado, no Palácio do Planalto, ao lado do ministro da Cidadania, Ronaldo Bento, o presidente do Ipea apresentou o estudo ‘Expansão do Programa Auxílio Brasil: Uma Reflexão Preliminar’. Nele, Figueiredo usou dados de internações médicas decorrentes da subnutrição no Sistema Único de Saúde (SUS) para negar o avanço do fome no desgoverno Bolsonaro

“A apresentação à imprensa foi baseada em reflexões preliminares publicadas em nota assinada única e exclusivamente pelo presidente da instituição dentro do período de defeso eleitoral. No entendimento da Afipea a atividade realizada pela presidência desrespeita frontalmente os protocolos internos normatizados para a publicação de estudos e pesquisas conduzidos pelos servidores da casa”, diz um trecho da nota da Afipea.

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De acordo com a entidade, a divulgação e publicização de pesquisas no Ipea está condicionada, em regra, à discussão, avaliação e aprovação prévia pelos pares, e a sua finalidade precípua é a preservação da qualidade e do rigor dos trabalhos divulgados.

Também destacou que a atividade viola os dispositivos instituídos para regular a conduta dos agentes públicos no período eleitoral. “Recentemente o próprio Ipea fez circular uma cartilha contendo recomendações dirigidas a todos os agentes públicos em período eleitoral. Elaborada pela AGU (Advocacia-Geral da União), a cartilha orienta que pronunciamentos e entrevistas estão autorizados desde que as mesmas estejam restritas a questões de natureza administrativa afetas à atuação institucional”, explicou.

Além disso, segundo a Afipea, a utilização da instituição para a produção subliminar de propaganda governamental em período de defeso eleitoral configura explícito abuso de poder político, devendo ser coibida pelas autoridades eleitorais competentes.

Presidente do Ipea foi subsecretário de Política Fiscal na gestão de Paulo Guedes no Ministério da Economia (Foto: Edu Andrade/Ascom/ME)

Negacionismo científico

Para a professora Patricia Jaime, do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da Universidade de São Paulo (USP), “o uso de dados do Sistema de Informações Hospitalares SIH-SUS para questionar a veracidade dos 33 milhões de brasileiros famintos é negacionismo científico e irresponsabilidade técnica”.

“É tempo de olhar para os dados da insegurança alimentar, não para os distorcer, mas para gerar evidências para o estabelecimento de políticas públicas que devolvam a dignidade ao Brasil”, defendeu.

A ex-ministra Desenvolvimento Social e Combate à Fome Tereza Campello concordou com a professora. “Nenhum pesquisador do Ipea emprestou seu nome e CPF para constar nessa peça de ficção. Estudo nenhum consegue esconder o que vemos nas ruas diariamente”, afirmou.

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