Funai ignora indígenas isolados que estão ameaçados no sul do Amazonas

Para evitar conflito, o governo Bolsonaro precisa decretar restrição de uso sobre o território, conforme recomendou o Ministério Público Federal (MPF)

Maloca de indígenas em isolamento voluntário na Terra Indígena Kampa e Isolados do Rio Envira (Foto: Gleison Miranda/Funai)

O Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e a Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus (Focimp) acionaram o Ministério Público Federal (MPF) no Amazonas solicitando providências urgentes para proteção de indígenas isolados no sul do Amazonas.

A área em questão, no município de Lábrea, é sobreposta em parte à Reserva Extrativista do Médio Purus o que pode levar ao encontro entre indígenas isolados e extrativistas. “Isso poderia gerar contaminação desastrosa para os indígenas que, por causa do isolamento, não têm defesas imunológicas contra muitas doenças comuns”, diz a carta.

O documento reitera ao MPF que se trata de um grupo isolado extremamente vulnerável, sendo que “diversos indicadores e variáveis apontam essa vulnerabilidade”.  “Há registros de atuação de madeireiros na floresta não-destinada no entorno da Resex Médio Purus e da TI Hi-Merimã, assim como a atuação de missionários fundamentalistas em Terras Indígenas do entorno”, dizem as entidades.

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Além disso, existem ocorrências na região de caça e pesca ilegais, diversos Cadastros Ambientais Rurais (CAR) e interesses minerários incidentes sobre a área de ocupação dos isolados e do entorno. 

De acordo com dados oficiais, há um desmatamento acumulado no entorno da área de ocupação dos isolados da ordem de 55 mil hectares 

As entidades lembram que técnicos da Fundação Nacional do Índio (Funai) confirmaram há quase um ano a presença dos isolados e, sete meses depois da primeira recomendação feita pelo MPF, nada foi feito pela presidência do órgão.  

“A etapa seguinte à confirmação do registro da existência do grupo seria a decretação de uma restrição de uso sobre o território onde vivem, acompanhada de medidas de vigilância e proteção territorial”, diz um trecho do documento. 

Na recomendação de março deste ano, o MPF diz à Funai que a medida é necessária para impedir que ocorram conflitos com extrativistas e madeireiros, além de evitar desmatamento na área intocada. 

“Cabe à Coordenação Geral de Índios Isolados e de Recente Contato (CGIIRC), à Diretoria de Proteção Territorial (DPT) e ao presidente da Funai, com base no princípio da precaução, tomar medidas para reconhecimento territorial e restrição de uso da área ocupada pelo grupo isolado”, explicou a OPI.

Funai 

As entidades lembram ainda que a Funai defendeu a construção de um acordo de cooperação com o Instituto Chico Mendes para Conservação da Biodiversidade (ICMBio) para, em vez de cumprir a recomendação do MPF e fazer a restrição de uso da área indígena, criar uma gestão compartilhada da área da Resex que está sobreposta ao território ocupado pelo grupo isolado. 

Para as entidades, essa proposta desrespeita os direitos territoriais estabelecidos na Constituição e torna os isolados mais vulneráveis. 

“Na prática, um posto cogerido por ambas instituições irá resultar em uma cacofonia institucional cotidiana, que não terá outro resultado senão a fragilização das ações de proteção”, dizem. 

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