Ultradireita chilena domina conselho constituinte e dificulta governo Boric
Com a maioria das vagas, a ultradireita do Partido Republicano (PR) pode escrever o que quiser e tem poder de veto. O PR sempre foi contrário a mudanças constitucionais.
Publicado 08/05/2023 16:16

Os chilenos elegeram, neste domingo (7), o conselho encarregado de redigir o texto de uma nova Constituição, em um dia em que esteve em jogo a possibilidade de haver uma proposta renovadora ou outra que mantenha o perfil privatista e antipopular da Constituição promulgada pelo ditador Augusto Pinochet.
Com mais de 99% dos votos apurados, nesta segunda (8), a legenda ultradireitista Partido Republicano (PR) obteve 35% de apoio e conquistou 22 das 50 vagas no Conselho Constitucional. Em tese, os conservadores não precisam negociar, podem escrever o que quiser no texto e terão poder de veto, durante a elaboração da nova Constituição, e dificultar a governabilidade de Gabriel Boric.
A coligação governista de esquerda, Unidad para Chile, ficou em segundo lugar na votação, com 28% dos votos ou 17 assentos. O restante dos assentos ficou com a direita tradicional da coligação Chile Seguro, o que agrava a situação do governo.
Os novos conselheiros vão tomar posse no dia 7 de junho e terão cinco meses para redigir uma nova versão. As mudanças serão submetidas a um plebiscito marcado para 17 de dezembro.
O conselho eleito no domingo receberá, para sua revisão e ajustes, um projeto previamente elaborado por especialistas com 12 princípios essenciais que não poderão ser modificados, como por exemplo, o que consagra o Chile como uma economia de mercado com participação estatal e privada.
Polarização continua
A preocupação do presidente Gabriel Boric, agora, é evitar os mesmo erros do processo constitucional, no ano passado, que, dominado pela esquerda, não obteve vitória no plebiscito. Ele pediu “sabedoria e moderação”por parte da oposição.
“Este processo não pode ser sobre vinganças, mas colocar o Chile em primeiro lugar”. Em resposta, ouviu do pinochetista Jose Antonio Kast, derrotado em 2021 por Boric, que “o Chile derrotou um governo falido”. O Partido Republicano sempre se opôs à mudanças na Constituição da era Pinochet (1973-1990), que já foi parcialmente revista após a volta da democracia.
Um dos temas mais criticados nos distúrbios populares de 2019, – as seguradoras privadas que pagam pensões miseráveis aos idosos chilenos -, é também o que tem mais chances de chegar sem mudanças significativas. São essas grandes e lucrativas empresas que garantem as eleições dos parlamentares da direita.
Outro tema que tem mobilizado a classe média chilena explica o triunfo da extrema-direita. Seu discurso anti-imigratório tem sido usado para inflamar a população contra bolivianos e venezuelanos que chegam ao país, como explicação para os problemas da segurança pública.
Cansaço social
O órgão terá caráter paritário e quase sem presença de indígenas, devido à indicação de apenas dois candidatos das comunidades originárias. O mapuche Alihuen Antileo conseguiu uma vaga indígena supranumerária, o que significa que o conselho será integrado por 51 membros. No processo anterior, com cadeiras reservadas, os indígenas chegaram a 11% da Assembleia, com 17 deputados (de 155 membros).
Embora o voto seja obrigatório e por isso se preveja uma elevada afluência, há pouco entusiasmo dos cidadãos nestas eleições, ao contrário do processo iniciado após 2019. Naquele ano, a revolta popular exigia mudanças profundas que se refletiram num processo constituinte radicalizado pela esquerda. No fim, a afluência de fake news aterrorizando a sociedade chilena levou ao rechaço do texto.
O Conselho Constitucional, que será eleito neste domingo, será instalado no dia 7 de junho e terá a responsabilidade de elaborar e aprovar a proposta de carta magna que será submetida a referendo no dia 17 de dezembro.