STF determina que Estado proteja indígenas isolados

Corte forma maioria e determina que governo crie plano detalhado para proteção desses povos que foram colocados em risco pelo governo Bolsonaro.

Foto: Roberto Stuckert Filho/Gab. Senador Humberto Costa

O Supremo Tribunal Federal (STF) formou nesta segunda-feira (7) maioria de votos para manter a decisão que determinou ao governo do ex-presidente Jair Bolsonaro a adoção de medidas para proteger integralmente territórios com presença de indígenas isolados.

Agora, o governo federal precisa apresentar um plano para regularizar e proteger territórios indígenas que são isolados e os que tiveram recente contato com o homem branco. Durante o governo Bolsonaro, além da omissão da proteção, houve contato forçado dos indígenas com religiosos evangélicos.

A decisão foi assinada em novembro do ano passado pelo ministro Edson Fachin, relator do caso, e está em julgamento definitivo no plenário virtual, modalidade na qual os ministros inserem os votos no sistema eletrônico do Supremo e não há deliberação presencial.

Além do relator, os ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Rosa Weber, Dias Toffoli e Luiz Fux votaram no mesmo sentido.

Nunes Marques não referendou a decisão por entender que é necessário comprovar as alegações de falta de proteção aos indígenas. O ministro foi indicado para a Corte pelo próprio Jair Bolsonaro. André Mendonça também acompanhou o relator, mas fez ressalvas.

Omissão estrutural

No entendimento do relator Fachin, havia no governo Bolsonaro um quadro de violação generalizada de direitos humanos, caracterizado pelo desmantelo das políticas públicas, em especial em relação a eles.

Essa situação, segundo o relator, já foi reconhecida pelo STF na apreciação do referendo da medida cautelar na ADPF 709. De acordo com Fachin, a proteção da vida, da integridade física e dos territórios desses povos não vinha sendo observadas pela administração pública.

O relator considerou que as informações apresentadas pela Presidência da República e pela Funai são genéricas e não demonstraram a atuação específica e eficiente do governo federal para impedir a degradação socioambiental nas terras ocupadas por essas comunidades. Para o ministro, há uma omissão estrutural, “cuja solução demanda uma resposta complexa do Estado”.

De acordo com Fachin, a proteção das terras ocupadas tradicionalmente pelos povos isolados ou de recente contato é dever da União e da Funai, mas a fundação não as defendeu de invasores como madeireiros ilegais, garimpeiros e narcotraficantes. Com isso, expôs a vida da população indígena ao contato “indevido e inconsequente” com a sociedade, colocando em risco a sobrevivência desses grupos vulneráveis.

Falta de proteção comprovada

O pedido de proteção foi feito ao STF pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). A ação foi protocolada em junho do ano passado em função do assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, na Terra Indígena Vale do Javari, no Amazonas.

A instituição apontou que teriam ocorrido ações e omissões do governo Bolsonaro que colocavam indígenas em risco real de genocídio com possibilidade de extermínio de algumas etnias. A demora na demarcação de terras e a presença de invasores em áreas de ocupação tradicional de tribos foram citadas no processo.

Houve um dossiê de servidores da Funai comprovando a omissão do órgão em vários aspectos da proteção aos indígenas. Em 2022, a Funai informou que morreu o “índio do buraco”, último remanescente de uma etnia não identificada que foi massacrada na década de 1990. O indígena era monitorado há 26 anos pelo órgão em sua terra Tunaru.

Os índios isolados que viviam na região foram alvo de diversos ataques durante as décadas de 1980 e 1990. Assim, o grupo do índio, que já era pequeno, acabou dizimado, deixando como único sobrevivente o homem, que tinha como característica marcante escavar buracos dentro das palhoças onde vivia.

A Apib pediu a concessão da medida cautelar para a manutenção da portaria de restrição de uso da terra Tanaru, até que seja adotada uma destinação condizente com a importância e a memória desse grupo de indígenas, totalmente dizimado. Fachin determinou que a União informasse, em 10 dias, o detalhamento da situação do Índio do Buraco, os procedimentos utilizados na perícia e o resultado da autópsia e, ainda, a destinação que se pretende dar à Terra Indígena Tanaru.

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