Argentina e o desafio gigantesco de vencer a extrema-direita

Mais: Clima de incerteza marca eleições no Equador e Guatemala / Portugal descongela 1,3 bilhões de euros da Venezuela / Rússia envia 26 toneladas de medicamentos a Cuba.

Baixada a poeira do primeiro impacto dos resultados das PASO (Prévias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias), na Argentina, onde o candidato de extrema-direita, Javier Milei, ficou em primeiro, com 30,4% dos votos, algumas coisas vão ficando mais claras e, quanto mais claras, mais preocupantes. A vitória de Milei, somada a outros elementos, liga o sinal de alerta em seu volume mais alto. Milei é um personagem neofascista histriónico, embora a agência britânica Reuters o qualifique como “cantor de rock libertário” (!!). Em política internacional é abertamente pró-imperialista e inimigo da integração latino-americana (diz que é contra o Mercosul). Em todos os outros temas em que apresentou sua visão (economia, direitos das mulheres, direitos civis etc.) têm posturas ultrarreacionárias. Milei foi o único nome do Partido “A Liberdade Avança” a ser apresentado nas PASO como presidenciável e ficou à frente da chapa da direita tradicional (Juntos Pela Mudança – JPM) por apenas 1,7%. O JPM apresentou dois nomes nas PASO para o cargo de presidente, o primeiro lugar ficou com Patricia Bullrich, que, tendo logrado 17% dos votos, representará a legenda na eleição. Patricia é, dentro do JPM, considerada uma neoliberal dura, com pontos de contato com Milei, inclusive admitindo a possibilidade de dolarização. Já Horacio Larreta, concorrente de Patrícia no JPM, obteve 11,3% e foi derrotado adotando uma postura de direita “moderada”. Ou seja, pode-se dizer que, nas PASO, a extrema-direita ganhou no geral e na disputa particular dentro do conservadorismo tradicional, venceu a direita extrema. A distância de Milei para os candidatos da União Pela Pátria – UPP, coligação do campo do atual presidente Alberto Fernández e da ex-presidenta Cristina Kirchner, foi de 2,7%. A UPP terá como candidato a presidente Sergio Massa, que em termos de votos individuais ficou em segundo lugar geral, ao obter 21,4%, derrotando seu concorrente interno, Juan Grabois, que alcançou 5,9%.  Milei, sem dúvida é o favorito para ir ao segundo turno. No entanto, se o seu histrionismo atraí, em contrapartida causa repulsa em parcelas significativas. Em abril, uma pesquisa da empresa Giacobbe, perguntava sobre a imagem dos políticos, com as opções “Positiva, Regular, Negativa, Não Conheço”. A enquete apontou Milei com um índice de imagem negativa de 31,3%. Em maio, à medida em que a exposição pública das ideias de Milei avança, o índice negativo saltou para 42,5% segundo a mesma empresa.

Argentina e o desafio gigantesco de vencer a extrema-direita II

Com um terço dos votos, Javier Milei tem o desafio de ampliar, o que ele mesmo dificulta ao declarar, por exemplo, que em seu governo deixará de comercializar com a China, hoje o principal parceiro comercial da Argentina, causando dissensos entre a elite.  A favor de Milei temos o fato de que seus principais concorrentes igualmente têm altos percentuais de imagem negativa, segundo a Giacobbe. Na pesquisa de maio, Patricia Bullrich aparece com o índice de 39,5% de eleitores que consideram sua imagem negativa. Já o candidato do campo peronista, Sergio Massa, em pesquisa de junho, aparece com nada menos do que 64,2% de imagem negativa. Tudo indica que Milei rezará para ir ao segundo turno com Massa. Notícias dão conta de que o ex-presidente neoliberal Maurício Macri defendeu, antes das PASO, que o Juntos Pela Mudança deveria abrir uma ponte de diálogo com Milei, repetindo a velha história de que, para derrotar os progressistas, a direita tradicional se alia ao neofascismo alegremente. O jornalista argentino Jorge Kreyness, secretário de Relações Internacionais do Partido Comunista da Argentina, em entrevista à TV Brasil 247, declarou que Sergio Massa não foi a melhor opção para enfrentar a direita. Ministro da Economia de Alberto Fernández, Massa é o responsável pela gestão do acordo com o FMI, e, diz Kreyness, ao invés de falar em aumento para os defasados salários dos trabalhadores, ou de crédito para as pequenas e médias empresas argentinas que estão na míngua, logo depois das prévias o candidato/ministro anunciou nova desvalorização do peso, o que jogou ainda mais pressão sobre os salários e preços. Por outro lado, Kreyness considera que é possível, até 22 de outubro, data do primeiro turno, que a União Pela Pátria derrote Milei. Segundo o dirigente comunista, já começou a mobilização de diversos setores contra o neofascista, incluindo Universidades (que Milei prometeu privatizar) e cientistas (cujos institutos de pesquisa Milei anuncia que fechará) e a partir do momento em que a debilidade de suas ideias forem ficando mais nítidas, isso pode ajudar a desgastá-lo, acredita Kreyness, acrescentando que, no entanto, é preciso que o governo apresente alguma perspectiva para o povo.

Argentina: o desafio é gigantesco III

Sergio Massa, ministro da Economia e candidato peronista

De fato, para o campo progressista, a imagem majoritariamente negativa de Sergio Massa e os baixos índices de aprovação do governo de Alberto Fernández são obstáculos importantes, mas não intransponíveis. O antropólogo argentino Alejandro Grimson, destaca, em artigo publicado no Página 12, que “as forças do campo popular devem assumir suas dificuldades e seus erros e ter empatia com o sofrimento de grande parte do povo. E poder reorientar seu rumo em tudo o que for necessário. Diante desse novo cenário político, o campo popular precisa estar mais organizado e unido do que nunca. Com um programa econômico e social que constrói um horizonte claro e contundente para as grandes maiorias populares. E tem que estar disposto a construir alianças muito amplas para defender a vida, a paz e os direitos fundamentais dos povos”. Outros pontos de destaque na análise de Grimson apontam que o crescimento exponencial da extrema direita é um fenômeno global, “vive-se uma nova etapa histórica, de grande instabilidade econômica e política e de fortalecimento de forças de extrema direita; em nível global, essa direita radicalizada se manifestou de duas maneiras. Ou com o surgimento de novas forças, como o Vox, ou com a radicalização de partidos tradicionais, como nos Estados Unidos. Na Argentina as duas coisas estão acontecendo ao mesmo tempo. Esses direitistas têm diferentes programas econômicos ao redor do mundo e nem todos se encaixam facilmente nos estereótipos sobre a velha extrema-direita; no caso argentino são neoliberais de carga nova (…) inventam uma saída supostamente fácil para uma crise econômica já insuportável: ‘Dolarizar’ e uma promessa de repressão e ordem; o fato de os candidatos e suas equipes pertencerem à extrema direita não deve ser confundido com os eleitores (…) Em 4 anos Bolsonaro deixou um quarto da população brasileira consolidada ideologicamente. Isso ainda não aconteceu na Argentina”.

Argentina: Comunistas propõem radicalizar luta contra neoliberalismo

O Partido Comunista da Argentina, nas prévias da União pela Pátria, não apoiou Sergio Massa e, após o resutaldo, publicou uma nota do Secretariado intitulada: “Não é com mais ajustes que se enfrenta as direitas”. O Partido defende radicalizar a luta contra o neoliberalismo e em defesa da soberania nacional. Diz um trecho do texto que “não é seguindo as políticas do FMI, desvalorizando e empobrecendo cada vez mais o povo, que será possível enfrentar os grupos de direita que vêm com toda a força anunciando mais ajustes e repressão”. Outros pontos da nota: “Os resultados das eleições das PASO do último domingo são uma amostra de como a crise capitalista mundial se manifesta em nosso país, que à medida que se aprofunda está provocando o crescimento de expressões neofascistas e do discurso antipolítico. No contexto da crise mundial que atravessamos, os dirigentes do poder econômico internacional procuram lançar um novo ciclo de exploração e acumulação (…) Para enfrentar essa situação, devemos estar na linha de frente e travar a batalha simultaneamente nos campos político, ideológico e econômico, superando o estado de resignação que conquistou amplos setores do progressismo. A crise, pela sua profundidade, exige mudanças profundas, saltando as cercas do neoliberalismo, radicalizando as políticas de distribuição de renda e de resgate da soberania nacional, libertando-nos da rede financeira mafiosa global (…) e enfrentando os monopólios e transnacionais que são os grandes beneficiários do sistema neoliberal ainda dominante. Para os comunistas, insistir no reagrupamento das forças de esquerda e na construção de um espaço programático frentista, plural, não conciliador com os interesses do imperialismo, continua a ser uma das grandes dívidas pendentes e cada vez mais necessária para enfrentar as direitas reacionárias”. No dia 2 de setembro o pleno do Comitê Central do PCA fará uma avaliação mais aprofundada do quadro político.

Clima de incerteza marca eleições no Equador e na Guatemala

Luisa González e Bernardo Arévalo

O Equador está hoje a três dias de ir às urnas para eleger presidente, vice-presidente e membros da assembleia, mas o clima é de intranquilidade e incerteza. Nesta quarta-feira (16), o Conselho Nacional Eleitoral detalhou o plano de segurança para as eleições do próximo domingo, 20 de agosto, processo que acontecerá em meio a um estado de exceção e à pior onda de violência da história do país. As autoridades eleitorais, as Forças Armadas e a Polícia Nacional, garantiram na semana passada que vão redobrar os esforços para evitar conflitos no dia da votação. O assassinato de Fernando Villavicencio não foi um fato isolado. Nesta segunda-feira (14), Pedro Briones, sindicalista e dirigente do partido Revolução Cidadã, foi morto a tiros por dois assassinos de motocicleta. Segundo reportagem publicada no site Comunicasul, “o crime foi olimpicamente ignorado pelos conglomerados midiáticos locais, que quase nada publicaram ou divulgaram. O silêncio da mídia é explicado pela tentativa de vincular o ‘correísmo’ com o assassinato, na semana passada, de Fernando Villavicencio, um dos candidatos da direita à presidência. A estratégia visa negar a responsabilidade do presidente Guillermo Lasso e os interesses diretos da ultradireita com o banho de sangue, particularmente do candidato Jan Topic, cuja marca é o discurso fascistóide”. Apesar de tudo, a maioria dos prognósticos aposta no favoritismo de Luisa González, do movimento Revolução Cidadã, inclusive apontando a possibilidade de vitória no primeiro turno, sendo para isso necessário que Luisa alcance 40% dos votos e coloque 10% de vantagem em relação ao segundo candidato. Se houver um segundo turno, Luisa provavelmente disputará com Jan Topic ou Otto Sonnenholzner. Mas surpresas podem surgir. No mesmo dia em que detalhou o plano de segurança, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) do Equador aprovou o registro de Christian Zurita como candidato presidencial do Movimento Construye, substituindo Fernando Villavicencio. Zurita se apresenta como “melhor amigo” de Villavicencio e não se descarta que a comoção pela morte do candidato possa favorecê-lo. Na Guatemala haverá a disputa do decisivo 2º turno na mesma data (20/8) do primeiro turno no Equador. Bernardo Arévalo, do partido de centro-esquerda Movimiento Semilla, tem, segundo pesquisa recente, uma significativa vantagem sobre sua rival, a ex-primeira-dama Sandra Torres, da Unidade Nacional  da Esperança (Unidad Nacional de la Esperanza – UNE). Arévalo é um ex-diplomata de 64 anos e filho de um ex-presidente. Os guatemaltecos elegerão seu próximo presidente em um momento crucial em que o país vive um clima de insegurança generalizada, uma taxa de pobreza de mais de 55% e o maior nível da região de migração para os Estados Unidos. Arévalo enfrentou, a partir da ida ao segundo-turno, uma forte perseguição por parte do aparelho policial e judicial, que tentou inclusive cassar o registro de seu partido, processo que continua em curso. Caso vença, como tudo indica, tomar posse e governar será um desafio diário para Bernardo Arévalo e as forças que o apoiam, ainda mais pelo fato de que a direita tem a maioria do parlamento.

Portugal descongela 1,3 bilhões de euros da Venezuela

Uma decisão do Tribunal Central Cível de Lisboa ordenou, no dia 10/8, o descongelamento de cerca de 1,3 bilhões de euros de entidades públicas da Venezuela que estavam retidos no Novo Banco desde 2019. Entre as várias entidades venezuelanas ressarcidas estão a Petróleos de Venezuela e o Banco de Desenvolvimento Econômico e Social. Em nota, o governo da República Bolivariana da Venezuela congratulou-se pela decisão que qualificou como uma “clara e retumbante vitória do povo venezuelano contra a estratégia de ignorar a institucionalidade republicana, promovida por potências internacionais e atores da vida política» com o propósito de se “apropriar de recursos que pertencem a todos os venezuelanos”. A apropriação dos ativos foi desencadeada na sequência de sanções impostas pela administração estadunidense de Trump que visaram atingir a economia do estado sul-americano e, consequentemente, as condições de vida do seu povo. Fonte: Avante!

Rússia envia 26 toneladas de medicamentos a Cuba

Foto: Prensa Latina

O jornal cubano Granma, informa, nesta quinta-feira (17) que, com recursos da Federação Russa, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) doaram 26 toneladas de artigos sanitários a Cuba. O encarregado de negócios da Embaixada da Federação Russa em Cuba, Serguei Oboznov, enfatizou que o objetivo desta doação é ajudar Cuba a se recuperar da passagem do furacão Ian em 2022 e superar a situação atual do país. Em quatro contêineres de 40 pés, chegou em Havana a carga solidária, que contém antibióticos de amplo espectro, analgésicos, anti-inflamatórios, além de meios de controle de doenças não transmissíveis, como hipertensão, diabetes mellitus e doenças cardíacas. A informação detalha que os medicamentos são destinados a pacientes pediátricos e adultos; e os materiais descartáveis incluem suturas, conjuntos cirúrgicos, instrumentos, soluções hidratantes e desinfetantes, e vários tipos de seringas. No meio da difícil situação que o país vive devido ao bloqueio dos Estados Unidos, o fornecimento de material médico fica afetado e esta doação foi de grande valia. O encarregado de negócios da Embaixada da Federação Russa em Cuba, Serguei Oboznov, destacou à imprensa o caráter especial das relações de amizade e solidariedade entre Havana e Moscou. Oboznov acrescentou que a Rússia não deixará de denunciar esta política cruel e desumana dos Estados Unidos, neste momento, quando o seu país também é vítima de medidas destinadas a isolá-lo do mundo.

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