PF fecha cerco contra cúpula que articulava golpe contra posse de Lula

Bolsonaro teria mantido a prisão de ministro do STF em “minuta do golpe”. Investigações apontam para articulação da cúpula militar e civil do governo do ex-presidente

Foto: Marcelo Camargo

Depois de realizar, durante todo o ano passado, operações contra a horda que financiou e avançou sobre as sedes dos Três Poderes, no dia 8 de janeiro, a Polícia Federal (PF) deflagrou, nesta quinta (8), a operação Tempus Veritatis que fecha o cerco contra a cúpula bolsonarista que articulou e executou uma tentativa de golpe de Estado para evitar a posse do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.

A PF cumpre 33 mandados de busca e apreensão em nove Estados e no Distrito Federal (DF), além de quatro mandados de prisão preventiva. Os alvos são ministros e assessores do ex-presidente Jair Bolsonaro, além de militares da ativa das Forças Armadas.

Os investigadores elaboraram um documento com inúmeras evidências da articulação que a cúpula golpista (militares e civis) do então presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro promoveu para impedir a soberania do voto popular.

As informações que embasaram a operação foram coletadas na delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid.

Os mandados foram autorizados pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A decisão do ministro afirma que Bolsonaro (PL) teve acesso e pediu modificações na chamada “minuta do golpe”, que previa prisão de ministros do Suprema Corte, além do presidente do Congresso, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

“Os elementos informativos colhidos revelaram que Jair Bolsonaro recebeu uma minuta de decreto apresentado por Filipe Martins [então seu assessor] e Amauri Feres Saad para executar um golpe de Estado, detalhando supostas interferências do Poder Judiciário no Poder Executivo e ao final decretava a prisão de diversas autoridades, entre as quais os ministros do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, além do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco”, diz a decisão do ministro.

O ex-assessor especial de Bolsonaro, Filipe Martins, foi preso na operação desta quinta. Já Amauri Feres Saadm, apontado como autor intelectual da minuta, foi alvo de mandados de busca e apreensão.

No documento, o ministro afirma que após receber e ler a minuta, o ex-presidente pediu alterações, livrando Gilmar Mendes e Pacheco da prisão, mas mantendo o relator dos inquéritos que investigam a tentativa de golpe, Alexandre de Moraes.

“Posteriormente foram realizadas alterações a pedido do então presidente, permanecendo a determinação de prisão do Ministro Alexandre de Moraes e a realização de novas eleições”, afirma.

A PF identificou que agenda do ministro Alexandre de Moraes, então presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), era inteira detalhada aos golpistas para que o ministro fosse acompanhado em tempo integral e, caso houvesse o golpe militar planejado pelo grupo, ele pudesse ser preso.

Segundo a PF, as investigações apontam que o grupo se “dividiu em núcleos de atuação para disseminar a ocorrência de fraude nas Eleições Presidenciais de 2022, antes mesmo da realização do pleito, de modo a viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital.”

Primeiro, diz a Polícia Federal, o grupo atuou para construir e propagar a versão de que havia tido fraude na eleição de 2022, “por meio da disseminação falaciosa de vulnerabilidades do sistema eletrônico de votação, discurso reiterado pelos investigados desde 2019 e que persistiu mesmo após os resultados do segundo turno do pleito em 2022.”

Em seguida, foram desenvolvidos atos concretos para “subsidiar a abolição do Estado Democrático de Direito, através de um golpe de Estado, com apoio de militares com conhecimentos e táticas de forças especiais no ambiente politicamente sensível.”

Saiba mais: Operação da PF atinge Bolsonaro, ex-ministros e militares

Militares da ativa envolvidos no golpe

A operação deflagrada pela Polícia Federal nesta quinta mira 16 militares das Forças Armadas que, segundo as investigações, teriam participado ativamente da elaboração e articulação do golpe de Estado.

Os agentes descobriram que militares da ativa pressionaram colegas contrários ao golpe a aderirem ao movimento. O ex-ajudante de ordem de Bolsonaro, o coronel Mauro Cid, chegou a receber um pedido de R$100 mil para ajudar na organização dos atos golpistas.

Membro do núcleo duro do bolsonarismo, o ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) general Augusto Heleno foi flagrado pelos investigadores incentivando o golpe. Em reunião feita em 2002, o general Heleno cobrou que órgãos do governo deveriam atuar para assegurar a vitória de Bolsonaro nas eleições.

“Não vai ter revisão do VAR. Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa é antes das eleições”, disse Heleno, de acordo com a PF. “Nós vamos ter que agir. Agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas.”

Heleno também é investigado no caso da Abin paralela, que apura como a agência de inteligência foi cooptada pelo bolsonarismo para espionar ilegalmente atores da República que atuavam, nos termos da lei, contra os malfeitos da família bolsonaro e da extrema-direita.

Outro militar envolvido, o general Estevam Cals Theóphilo Gaspar de Oliveira, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército, se reuniu com Bolsonaro no Palácio da Alvorada, no dia 9 de dezembro de 2022, e se colocou à disposição para aderir ao golpe de Estado.

A PF identificou conversas obtidas no celular de Mauro Cid que comprovam as intenções golpistas do general Theóphilo

De acordo com as investigações, a condição de Theóphilo para aderir ao golpe e colocar tropas especiais nas ruas seria a assinatura, por Bolsonaro, de uma minuta que determinasse o golpe de Estado.

PL foi braço civil ativo na tentativa de golpe

Além do apoio e articulação de militares golpistas, os investigadores decobriram que o Partido Liberal, sigla que acolheu a extrema-direita bolsonarista, foi usado para financiar narrativas de apoio aos ataques às urnas.

Em dezembro de 2022, o PL apresentou uma auditoria infundada com a realidade na qual o partido questionava o funcionamento de urnas anteriores a 2020. A sigla convocou uma entrevista coletiva para divulgar o resultado da auditoria.

O presidente do PL, o ex-deputado federal Waldemar da Costa Neto, foi alvo de busca e apreensão na operação desta quinta. Waldemar chegou a ser detido pelos agentes por porte ilegal de arma de fogo.

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