O INCRÍVEL SAMBISTA VOADOR

Antonio Pereira da Silva, ou “Neguinho do Samba”, morador de Itanhenga, era filiado ao Partido por volta de 1984 e   liderança comunitária de respeito naquele bairro. Militante ativo e persistente da causa popular foi protagonista de um vôo espe

Iran Caetano*


 


A história se deu num domingo à tarde, quando ele pegou sua velha bicicleta para ir pedir votos para um determinado candidato nosso com boa receptividade naquela região.   Conforme nos contou tempos depois, ele sabia que a “magrela” estava sem freios, mas tinha pressa, pois iria confirmar uns votos e depois ver um joguinho de futebol entre equipes dali do bairro.   Portanto não poderia perder tempo.


 


Percorreu algumas ruas do mesmo lado do bairro para depois passar ao outro lado da rodovia que margeia aquela região – a perigosa rodovia do contorno- que vai da Serra até o Ceasa, em Cariacica, ES. Para chegar até lá existem algumas ladeiras que desembocam na margem do asfalto.  Todas íngremes, são perigosas até para bicletas perfeitas, mas como ele já havia feito aquele percurso várias vezes não temeu que algo de ruim pudesse acontecer… . Ledo engano. Quando viu estava embalado morro abaixo e sem a menor condição de parar. Desesperar não adiantava. Pular fora não dava. Só lhe restava torcer para dar tudo certo.


 


Enquanto Neguinho passava por esse drama, na outra ponta da história um motorista acelerava sua gigantesca carreta, carregada de cimento, a fim de vencer uma subida que se apresentaria logo a seguir. Combinação cruel.


 


O ciclista imprevidente desembestou na direção do asfalto. Viu um automóvel branco na pista.  Quis fechar os olhos. Não fechou. O carro passou… a seguir…  veio a carreta. A cabine passou. Por instantes achou que daria… O caminhoneiro desviou o que pode… Mas a parte final da carroceria bateu-lhe em cheio… e, pela primeira vez na história, uma sambista voou. Voou sem aparelhos. Sem imprensa. Sem fotografia.  Ficou apenas o relato de algumas testemunhas. Viajou por uns três metros de altura e uns trinta metros de distância.   Acordou não sabe quanto tempo depois numa enfermaria da Santa Casa. Cheio de tubos e bandagens. Vários ossos quebrados. Um punhado de dentes perdidos e dor por todos os milímetros do corpo. Muita dor.


 


Fui visitá-lo três dias depois. Acordou quando entrei. E entre gemidos e grunhidos perguntou, e o Partido? Firme? – Firme e forte, respondi. Conversamos um pouco e logo ele adormeceu novamente.


 


Recebeu alta pouco tempo depois. Saiu bem.


 


Passadas algumas semanas chegou a notícia que Neguinho havia sido internado novamente. Agora foram três facadas no tórax. Gravíssimas. Perfurações de pulmões e outras vísceras.  Fruto de sua intenção de impedir a implantação de bocas de tráfico no seu bairro. Não morreu por acaso, mas passou perto.


 


Novamente fui lá visitá-lo.  Ainda sonolento, após as cirurgias, com tubos e bandagens por todo lado, bastou me ver para perguntar, Olá doutor,  e o PC do B? Firme? … Firme e forte! Respondi novamente. Conversamos um pouco e dias depois recebeu alta.  Ainda o vi algumas vezes, mas ao longo do tempo perdemos contato.


 


Vinte e três anos depois fui transferido de Porto de Santana, onde trabalhava em Cariacica, para Nova Rosa da Penha II.  Ao apresentar-me certa manhã à coordenação da Unidade de Saúde, escutei uma voz lá do fundo: e aí doutor e o PC do B?  Firme? Respondi sem nem olhar. Firme e forte – sempre!    Sabia que era ele… Olhei, e lá estava o nosso caro camarada. Sorridente e desta vez sem ferimentos nem dor.  Apenas contente por me ver.


 


– Doutor, o senhor ainda está no Partido? Perguntou cerimonioso:


– Como sempre! Respondi.


– ontem e hoje.


– E você? Perguntei.


– Por enquanto estou filiado ao PSB, mas se o PCdoB me aceitar estou de volta.


– Chama-se:


– já está aceito!


 


Contou-me que se afastou do Partido apenas por ter perdido contato, mas sempre quis voltar. Só que ninguém o procurara. Mas agora ele assinaria a ficha e traria todos aqueles antigos filiados da região e juntos reorganizariam a legenda ali.


– Muito bom! Concordei


– e nós vamos ajudá-lo no que for necessário.


 


Usei esse episódio todo para demonstrar um fato : as pessoas de bem estão voltando ao Partido. Muitas outras desejam ingressar. Falta apenas um esforço mais constante nosso. 


 


Pensemos nisso.


 


*Iran Caetano é médico e Secretário Político do Comitê Municipal de Vila Velha, ES.