Assis Melo: o remédio para a crise é o desenvolvimento com empregos
O vereador eleito pelo PCdoB em Caxias do Sul e presidente reeleito do Sindicato dos Metalúrgicos, cuja diretoria tomou posse neste sábado (6), Assis Melo, concedeu entrevista à edição deste final de semana do jornal O Pioneiro. Nela fala da crise e da
Publicado 07/12/2008 22:32 | Editado 04/03/2020 17:11
Veja a seguir a íntegra da entrevista:
“As dispensas têm outras razões”
Eleito vereador pelo PCdoB e reeleito para mais um mandato como presidente do maior sindicato dos trabalhadores do Estado, o dos Metalúrgicos de Caxias do Sul e Região, Assis Flávio da Silva Melo diz que as demissões que estão ocorrendo não são fruto da crise. Na entrevista concedida ao Pioneiro na sexta-feira, véspera de reassumir o cargo no sindicato, ele defende, inclusive, que se valorizem os empregos e os salários como remédio para prevenir as dificuldades econômicas que se desenham para 2009. Com isso, Melo sinaliza que a negociação do dissídio do ano que vem não será fácil para os empregadores. Confira a seguir:
Pioneiro: Os reajustes e altos salários da categoria em relação ao restante do Estado e mesmo com outros pólos do país não contribuíram para a decisão das demissões que estão sendo feitas agora pelas empresas?
Assis: Nós achamos que ainda precisamos recuperar o poder de compra dos salários, pois ainda há defasagem salarial. Em comparação com outros centros do país, especialmente São Paulo, os valores de salários aqui ainda são muito baixos, especialmente os da nossa categoria. Quanto a essa questão das demissões, nós estamos fechando os números e provavelmente eles irão se comparar com os do ano passado. Há uma prática das empresas daqui de usarem a rotatividade para manterem, no nosso entendimento, os salários arrochados. Então, precisamos ver essas demissões com outro olhar. Até agora, não há reflexo da crise nas empresas porque há um crescimento no setor metalúrgico e essas dispensas são por outras razões e não simplesmente pela crise.
Pioneiro: Então essas demissões não estão preocupando?
Assis: Preocupar, preocupa. Mas fechamos 2007 com 6.351 demissões, isso apenas trabalhadores com menos de um ano de emprego. Até agora, em 2008, tem 6.596. Então se vê que os números são bem parecidos. O que aconteceu em 2007, do ponto de vista de crise, para serem demitidos todos esses trabalhadores? Então vemos esse artifício de demissões na categoria quase como uma normalidade. Precisamos colocar essas demissões em um outro patamar de discussão. São pais de família, pessoas que precisam de seu emprego que estão sendo postas na rua. Muitas empresas falam de responsabilidade social, mas como se faz isso quando se demite por ano esse número todo de trabalhadores? A cada ano que passa temos um número muito maior de demissões pelas razões mais variadas. Precisamos construir ferramentas para que os trabalhadores tenham mais tranqüilidade e segurança. Assim provavelmente vão contribuir melhor para a empresa, terão produtividade maior, vão adoecer menos.
Pioneiro: E o cenário que se projeta para o ano que vem, que não é muito favorável, pode afetar a discussão sobre questões trabalhista?
Assis: Não podemos negar que existe uma crise, mas ela é uma crise do próprio sistema capitalista, da forma neoliberal. Esse paradigma foi quebrado. A gente viu que essa especulação, essa jogatina, porque se joga com papéis e com uma economia que não é a real, que é por isso que se está em crise. Temos realmente uma crise de grandes proporções, mas entendemos que ela não pode recair sobre os ombros dos trabalhadores. Precisamos buscar formas de sair da crise. O remédio que o capitalista dá é desempregar trabalhadores, mas achamos que é o contrário. Tem que haver um forte investimento no desenvolvimento do país para gerar emprego, renda e consumo. A saída não é desemprego, retração da economia, aumentar juros ou cortar o crédito. Precisamos de outro remédio. Senão vamos ver empresas quebrando e, logo ali adiante, uma concentração maior ainda de capital e provavelmente um arrocho maior de salários e uma dificuldade maior para os trabalhadores.
Pioneiro: Mas as negociações serão mais difíceis?
Assis: As dificuldades de negociação sempre existiram. Na dificuldade ou no crescimento sempre se precisou de mobilização para se conseguir alguma coisa. Não temos que nos intimidar com a crise, temos que reagir a ela, nos mobilizar, nos organizar para enfrentar. Porque se a crise nos pegar e nos deixar deprimidos, certamente demoraremos mais a sair dela. Pode até ter recessão, mas não depressão do ponto de vista da luta e da vontade de buscar os direitos dos trabalhadores.
Pioneiro: O que o senhor acha que o governo pode fazer para minimizar os impactos da crise?
Assis: Precisa investir no desenvolvimento, cortar juros e investir em infra-estrutura. Construir estradas, pontes, casas para o povo morar. É isso que gera trabalho, gera renda e move a economia.
Pioneiro: O que as pessoas podem fazer em contrapartida?
Assis: É reagir, se organizar e lutar. Nós não podemos concordar que o reflexo da crise caia sobre nós. Não podemos simplesmente admitir “tá demitido, é a crise, e deu”. Nós vamos conseguir reagir a tudo isso? Vamos ver. Mas não podemos de antemão aceitar as demissões como se fosse algo normal.
Pioneiro: Quais são as principais bandeiras do sindicato para o ano que vem?
Assis: Permanecem as mesmas.Questões de redução de jornada de trabalho no nosso entendimento são fundamentais para enfrentar a crise. Do ponto de vista de nação, precisamos ter olhar mais amplo, compreender a situação e buscar quebrar novos paradigmas para a economia que resolva o problema do povo e não só dos banqueiros e do sistema especulador.
Pioneiro: Para ano que vem a negociação do dissídio será feita nas mesmas bases de todos os anos?
Assis: Não vamos nos abstrair das dificuldades de agora, mas podemos colocar outros paradigmas. Não é salário? Então o que é? Melhores condições de trabalho? É segurança no emprego? Então podemos ver isso. Não dá pra continuar ganhando salário reduzido e demitindo.
Pioneiro: A crise atinge o mundo, e Caxias tem muitas empresas que dependem do mercado internacional …
Assis: Grande parte da economia caxiense é para o mercado interno. Então podemos desenvolver um mercado a nível nacional que absorva uma grande parte do trabalho e dos produtos que são fabricados aqui, produtos com valor agregado. Podemos desenvolver nosso país aqui com condições de ter um mercado interno grande. O Brasil tem dimensões continentais. Então precisamos dar salário para o povo, para desenvolver mercado de massas nacionais que tenham condições de consumo.
MARTHA CAUS