A prosa comovente do uruguaio Mario Benedetti
Acabo de ler o belíssimo romance A Trégua, de Mario Benedetti. É prosa da melhor qualidade – serena e comovente. Muito longe de ser um crítico literário, falo aqui como simples leitor. Fui fisgado pelo veterano Benedetti num passeio despretensios
Publicado 12/04/2009 23:52
Por acaso, topei com Correio do Tempo, um livro de contos e textos curtos. Folheei, o texto pareceu-me simpático e fluído – e era disso que eu precisava naqueles dias. Mas, confesso que o que me fez comprar mesmo o livro foram duas outras coisas: a nacionalidade (uruguaia) e a foto do veterano escritor – com um ar bonachão e um nariz “bolotudo”, ele lembra velhos imigrantes italianos que andam pela Móoca ou Brás, tipos tão familiares para quem vive em São Paulo.
O cara escreve com categoria: sem floreios, sem arroubos. A sabedoria para compor histórias emocionantes, a partir de fatos simplórios, é algo que me atrai. E me atraiu em Benedetti. Os textos de Correio do Tempo me lembraram as boas crônicas de Rubem Braga: a simplicidade, o gosto pelos tipos aparentemente sem brilho, tipos que constituem a maior parte de nossa sofrida humanidade.
Comentei sobre Benedetti com um conhecido. E ele me disse: se gostou dos contos de Correio do Tempo, experimente um romance do sujeito.
Fui atrás.
A Trégua foi o primeiro romance de sucesso de Benedetti, lançado em 1960. Na minha absoluta ignorância literária, não conhecia – nem de nome – a obra.
A Trégua é uma beleza mesmo.
Benedetti não tem a grandiloqüência de outros autores latino-americanos. Não espere dele a verborragia de Vargas Llosa, nem as tiradas fantásticas de Garcia Marques. A realidade basta ao velho uruguaio, nascido em Paso de los Toros. As frases curtas, ditas nos cafés, nos escritórios e nas ruas de Montevidéu são o suficiente para compor essa trama comovente.
Do que trata A Trégua? É um romance em forma de diário. Parece um recurso raso demais. Mas funciona. O diário traz as impressões de Martin Santomé – um homem com emprego burocrático, sem brilho, sem talentos especiais. Mas, é um homem que sabe olhar para sua pequenez com razoável sabedoria. E não é só isso. Santomé, um viúvo às portas da aposentadoria, conhece Avellaneda – jovem funcionária do escritório. Os dois se apaixonam. De novo: parece banal, mas é uma história com toques sublimes. Pelo menos, a mim assim pareceu.
A leitura também me deixou com vontade de voltar a Montevidéu, e aí retorno a uma questão que citei no começo desse texto: a nacionalidade uruguaia foi um dos atrativos para que eu começasse a ler Benedetti.
Não consigo entender por que, mas desde muito jovem tenho uma afeição especial pelo Uruguai. No começo, era afeição por um nome, e por uma pequena mancha no mapa da América do Sul. Talvez, fosse simples curiosidade por uma país tão pequeno – plantado ali aos pés do gigante Brasil.
Depois, passei a admirar a fibra dos uruguaios, pela conquista de 1950. Meu pai contava sempre as histórias de Obdúlio Varella, o capitão que calou o Maracanã com seus gritos na vitória sobre o Brasil.
Tive a felicidade de viajar três vezes para lá.
Fonte: http://www.rodrigovianna.com.br