A dura luta para enfrentar a desigualdade social

A política tributária progressiva e a valorização do Salário Mínimo são essenciais para combater a desigualdade social no Brasil.

Foto que registra o encontro entre Paraisópolis, segunda maior favela de São Paulo, e o rico bairro do Morumbi escancara desigualdade social no Brasil | Foto: Reprodução/Tuca Vieira

Os estudiosos da questão social no Brasil são unânimes em constatar que uma das mazelas estruturais do país é a perversa desigualdade que cria um fosso entre os muitos ricos, que são minoria, e os muitos pobres, que são maioria.

Mas o consenso sobre a desigualdade social termina na constatação. Quando se estuda medidas para reverter essa situação, as elites brasileiras, quando muito, se limitam a apoiar medidas assistenciais para mitigar o drama dos segmentos mais vulneráveis.

Para entrar no debate, vamos tratar de duas questões essenciais para enfrentar a desigualdade e que sofrem forte contestação das classes dominantes que, ao fim e ao cabo, querem perpetuar os seus privilégios.

Nos dois pontos, vou me apoiar nas excelentes contribuições que o Dieese – Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio econômicos – tem apresentado para subsidiar a ação do movimento sindical.

A primeira questão é: como financiar o Estado para que ele tenha capacidade de viabilizar políticas públicas para construir em nosso país algo assemelhado, mesmo na vigência do capitalismo, ao estado de bem estar social?

Um dos estudos citado do Dieese trata da reforma tributária. Essa reforma conseguiu a proeza, ao longo dos tempos, de ganhar o apoio de todos em sua defesa e grandes divergências em sua formulação.

O conflito de interesses na reforma tributária envolve as disputas entre capital e trabalho, setor produtivo e setor financeiro, União, estados e municípios e por aí vai. Como se vê, matéria muito mais complexa do que a simplificação dos tributos.

 Uma questão preliminar importante é a cota-parte de cada agente econômico e social no financiamento do Estado. Para se financiar, o Estado emite moeda, contrai dívidas e define as condições para ter uma receita tributária estável.

Neste último item, a regra de ouro para uma justa política tributária é cobrar de todos, principalmente de quem ganha mais, e oferecer serviços para todos, principalmente para quem ganha menos.

Para fazer isso, é necessário inverter a atual lógica tributária brasileira, que dá maior peso aos impostos indiretos (sobre consumo de bens e serviços) onde todos, ricos e pobres, pagam igualmente. É a chamada política tributária regressiva.

O imposto direto (que incide sobre patrimônio e renda) é mais justo porque onera quem mais pode. No Brasil, ao contrário, a carga tributária é maior para o consumo e para os salários e menor para o patrimônio e a renda.

Quem ganha salário tem desconto direto no holerite, compulsório, não tem como sonegar. E mesmo entre as faixas salariais há disparidade: quem ganha R$ 7 mil de salários paga 27,5% de imposto, mesmo percentual de quem ganha R$ 700 mil.

Por outro lado, a política tributária beneficia a turma do capital: excesso de isenções, dividendos e lucros não são taxados, muita sonegação, baixa contribuição das propriedades rurais, não cobrança de imposto das grandes fortunas, etc.

É ilusório, portanto, falar em uma sociedade equilibrada socialmente com a manutenção da política tributária brasileira. Alterar esta política, importante frisar, é um dos mais impactantes meios para reverter a desigualdade.

Outro caminho para enfrentar as desigualdades sociais é a luta pelo desenvolvimento com valorização do trabalho. Associar desenvolvimento com valorização do trabalho pressupõe a existência de sindicatos fortes e representativos.

Outro dia, uma conhecida jornalista escreveu um artigo dizendo que esse negócio de sindicato era coisa do passado, não tem papel a cumprir porque hoje o que predomina é o trabalho desregulamentado, sem direitos, sem necessidade de proteção sindical.

 Esse tipo de pensamento, feito por encomenda pelo conservadorismo neoliberal, chega a afirmar que o aumento real do salário-mínimo, acima da produtividade da economia (PIB dividido pela população), é um desserviço ao país!

Para eles, aumento real de Salário Mínimo gera inflação, desemprego e estimula a informalidade. Falam e não provam, porque os números provam o contrário. De novo, vamos recorrer a uma elucidativa informação do Dieese.

Em nota técnica divulgada no início do ano, o Dieese aponta que de 2003 a 2019 o Salário Mínimo teve aumento real de 78,61%, enquanto a produtividade da economia foi de 24,94%.

E o que ocorreu neste período: ao contrário do falacioso discurso conservador, a inflação foi controlada e tanto o desemprego quanto a informalidade do trabalho diminuíram.

Esses dados mostram a relação virtuosa entre aumento da massa salarial e a economia. O Salário Mínimo, por exemplo, impacta direta ou indiretamente 54 milhões de brasileiros (25,4% da população), cujas rendas giram em torno de um salário.

Por isso, as centrais sindicais celebraram a aprovação da Medida Provisória nº 1172/23, que estabelece a valorização do Salário Mínimo a partir de 2024 (inflação +PIB) e aumenta a isenção de imposto de renda para quem ganha até R$ 2.640,00.

Enquanto as centrais comemoram, editorial de O Globo diz que “aumento do Salário Mínimo vai contra disciplina fiscal” e lamenta que 14 milhões de aposentados e pensionistas do INSS que recebem um Salário Mínimo sejam beneficiados.

Por tudo o que foi dito, infere-se que uma política tributária progressiva assim como o desenvolvimento com valorização permanente do Salário Mínimo são dois instrumentos fundamentais para reverter a desigualdade social. O resto é papo furado!

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