Ás ruas, às ruas
Joaquim Nabuco, nascido no Recife, foi sem dúvida um grande brasileiro. Diplomata, historiador, político, foi um dos grandes nomes do abolicionismo. No parlamento, a luta abolicionista e a luta pela construção de um estado laico foram talvez as suas principais marcas.
Publicado 17/06/2016 16:16
É importante lembrar que Nabuco bateu-se não apenas pela separação entre a Igreja e o Estado, mas também pela laicidade do ensino público. Ainda que, posteriormente convertido, haja renegado essas posições, elas foram, no contexto do debate nas quais se inseriam, importantíssimas, ao lado das posições de Rui Barbosa, dentre outros que defendiam o laicismo.
Na defesa do abolicionismo Nabuco foi um gigante, dentro das suas possibilidades e das suas limitações. Integrando a chamada ala reformista do abolicionismo, Nabuco, temia, entretanto, a participação popular e dos próprios escravos naquele processo. Chegou a afirmar que “é no parlamento, e não em fazendas ou quilombos do interior, nem nas ruas e praças das cidades, que se há de ganhar, ou perder, a causa da liberdade”. A história mostrou que a luta abolicionista só foi vitoriosa pela conjugação dos esforços em todos os espaços possíveis, nas fazendas, nos quilombos, nas ruas e praças das cidades, e também no parlamento. A vitória do movimento deveu-se, sobretudo, à amplitude de forças e de formas de luta.
A fala de Joaquim Nabuco me vem a propósito do momento atual que vivemos no Brasil. Há um golpe em curso, pois o seu desfecho ainda não foi dado, ao qual precisamos resistir e derrotar. Chovendo no molhado, o golpe não foi contra a Presidenta Dilma Roussef, e sim contra a democracia. A resistência precisa ser, portanto, de todos os democratas.
O governo provisório de Temer e seu séquito de golpistas avança célere contra conquistas democráticas do povo brasileiro. A impressão é que, enquanto conseguimos ver apenas o debate sobre a corrupção, debate necessário, é verdade, há um avanço sobre o Estado nacional. Trata-se, a meu ver, de um verdadeiro desmonte, a atingir praticamente todos os setores estratégicos para o desenvolvimento do Brasil.
O desmonte atinge a saúde, a educação, os programas de habitação, a cultura, a indústria nacional, enfim, praticamente todos os setores estratégicos. Claro que ficamos felizes quando desaba mais um “rei de paus” do mal-ajambrado castelo de cartas do desgoverno provisório. Claro que ficamos felizes quando a “grande mídia” é obrigada a mostrar tucanos e outros golpistas emproados chafurdando na lama da corrupção. Mas, enquanto isso, a infantaria conservadora, banqueiros e parcela significativa do grande empresariado à frente, avança contra os direitos sociais dos trabalhadores e do povo brasileiro.
A saída é a mobilização ampla. Amplitude do ponto de vista das formas de luta. Amplitude em relação aos aliados e aos que podem ser atraídos para o nosso campo. Do ponto de vista das formas de luta é necessário combinar uma forte mobilização nas ruas com a pressão aos parlamentares, por exemplo e, neste momento, em especial os senadores. As ruas precisam influenciar o voto desses senadores. Se há algum indeciso, se algum pensa em mudar o seu voto, ele não pode ser tratado como inimigo. É necessário atraí-lo para o nosso lado. Essa é a amplitude política. Querelas locais e regionais, afloradas por conta das proximidades das eleições municipais, precisam ser equacionadas com a luta política mais geral. Não se trata de esquecer os problemas locais em função da questão nacional, mas de, com habilidade e justeza, conduzir corretamente essas duas vertentes da luta política.
Precisamos ter clareza de que a nossa principal tarefa agora é barrar o golpe, é derrotar o governo provisório do escriba de versos ruins. Voltando a Nabuco, é nas ruas e praças das cidades, é nas universidades e nas portas das fábricas, é nas redes sociais, e é também no parlamento, que devemos lutar. É necessário enfrentar o isolamento, combater as posições que nos isolam, que nos querem dentro de um gueto de “puros e justos”, e buscar a amplitude, atraindo todos os que, nesse momento, possam colaborar para derrotar o golpe. Somente assim é que se há de ganhar a causa da democracia.