Brinquedos proibidos

A obra do cinema clássico francês “Jeux Interdits”, a série “Black Mirror”, da Netflix, o romance japonês “Mil Grous” e a animação “The Critic”

Cena do filme "Brinquedos Proibidos", de René Clément

Eu vi o filme “Jeux Interdits” de René Clément em 1957, numa sessão no Teatro do Parque, no Recife. Revi hoje nessa madrugada de uma quinta-feira. É incrível como se pode gostar de um filme e se continuar gostando com quase 65 anos de diferença. É uma obra do cinema clássico francês e foi assim condenada pelo então crítico do Cahier du Cinèma, François Truffaut. Ele, que seria um dos principais participantes da Nouvelle Vague como cineasta, diretor, chegou a dizer que o filme de Clément era um ‘caldo raso’. Uma enorme besteira, pois depois, como sabemos, Truffaut brigou com Jean-Luc Godard e fez obras narrativas só mais ou menos boas.

Minha visão de “Brinquedos Proibidos” que eu me lembro foi numa sessão especial no Teatro do Parque, e também me lembro que estava acompanhado de uma amiga e colega do curso de Filosofia da Universidade Federal de Pernambuco, Brites Gondra. E me lembro ainda que ela me incentivou para falar e dizer o que eu estava pensando e ela também. Do quanto a gente estava adorando o filme de Clément, a sua imagem, a carinha maravilhosa de Paulette representada na atriz Brigitte Fossey, que quando representou para as filmagens deveria ter uns 7 ou 8 anos. E conseguiu, certamente que pela elaboração técnica de Clément, transmitir a sensação de profunda tristeza. Acima de tudo, o filme tem toda essa densidade que se mistura com imensa sensação de desprendimento passado pelas feições dessa menina. Michel, vivido por Georges Poujouly, também é um momento de grande cinema, mas a principal imagem vem da menina.

O roteiro musical criado pelo músico Narciso Yepes com uma canção sonora, executada em harpa, traz outro ponto fundamental para que o filme seja tão belo.

Fazer um filme que falasse sobre o drama das famílias atingidas pelas bombas nazistas durante a invasão da França, realmente não seria difícil para o cineasta René Clément. Mas o mais importante era conseguir transformar esse drama numa história real em torno de duas crianças, e também mostrar quem na verdade eram aquelas pessoas que estavam sendo destruídas pelos nazistas alemães. Com a estória que se desenvolve depois que Paulette vai viver no interior da França, o cineasta mostra com naturalidade quem eram os franceses e me parece que esse conhecimento continua importante, também necessário de ser conhecido nos dias atuais. Os camponeses eram aquelas pessoas que se importavam mais com o preço das cruzes que haviam colocado no cemitério do que mesmo com a verdade de cada ser humano. Enquanto Paulette e Michel viviam um intenso drama pessoal humano, os outros somente entendiam as meras circunstâncias familiares. E o filme consegue transpor toda essa dimensão psicológica e também social.

O pessoal da Nouvelle Vague estava pensando principalmente em criar uma nova forma de construir o cinema, o filme, e assim não conseguiram ter olhos para ver a dimensão especial do filme de Clément.

“Jeux Interdits” está à disposição no portal Making Off. Existem duas cópias colocadas por pessoas diferentes. Uma delas com o título em francês está com o som funcionando. E a outra está sem som.

Olinda, 01. 07. 2021

Série “Black Mirror”, da Netflix I Imagem: Divulgação

Uma série da Netflix

Há algumas semanas eu estou vendo uma série que está passando há tempos na Netflix, mas que Marco Queiroz e minha filha Isabela Lins me indicaram, “Black Mirror”. Eles gostaram e Isabela me disse que a série mostra um mundo em comportamento no futuro próximo com a existência de tanta tecnologia. Eu já vi quase dez episódios. Mas ainda não me convenci da qualidade estética/filosófica da série. Ainda vou continuar a ver, pois são estórias interessantes como ação cinematográfica. Embora violentas na maior parte.

Olinda, 03. 07. 2021

Romance Mil Grous, de Yasunari Kawabata I Imagem: Divulgação

Mil Grous, romance de Kawabata

Entre outras coisas, me ocupei a ler nos últimos dias o romance de Yasunari Kawabata, “Mil grous”, considerado pela crítica e realmente uma joia da produção literária do século passado no Japão. Um trabalho de criação literária incrivelmente belo. Não estou me referindo à estória. Estou pensando apenas na linguagem criada por Kawabata. É um trabalho de grande expressão artesanal. Não é só contar uma pequena estória de um rapaz e suas relações. É o mais importante, criar uma linguagem. Como delicadamente descobrir as palavras fundamentais para se contar uma estória. Dá gosto de ler. Imaginemos o que não deverá ser no próprio original japonês.

E a estória também é especial. O leitor não conhecerá apenas os quatro personagens que a circulam. Saberá sobre como se comportava a família japonesa. Como um rapaz de vinte anos após a morte do pai passa a de alguma maneira substituí-lo. E a se relacionar com as pessoas que o cercavam. Yasunari Kawabata é, foi sem dúvida um grande mestre. E o que me parece maior é como ele extrai de pequenos personagens toda uma vida e também a vida social do seu país.

Estranho na vida das pessoas como os fatos se encontram. No meu estudo de inglês, leio pequenos exercícios que são pequenas estórias. E agora justamente, enquanto estava lendo a estória de Kawabata, li uma que conta um casamento nos dias atuais nos Estados Unidos. Claro que é um texto literário de valor apenas estudantil. Mas ganhou importância para mim quando pude comparar um casamento onde a mãe do noivo conhece a mulher do filho, pensando que a estava apresentando para um possível romance. E no começo do século XX ainda, a estória de um possível casamento tem a complexidade do que nos narra Yasunari Kawabata.

Olinda, 27. 06. 2021

Cena da animação “The Critic”, de Ernest Pintoff

Brinquedos permitidos

Um filme não tem nenhuma relação com o outro, mas sem dúvida se aproximam. Eu me refiro ao “Jeux Interdit” de René Clément e ao curta “The critic” de um cineasta norte-americano, pouco conhecido, Ernest Pintoff. É um pequeno filme de animação, que recebeu o prêmio Oscar de Melhor Filme de Animação nos anos 1960. E por que seria proibido? – Pelo fato de aparentar uma crítica forte ao próprio cinema. Mas é tudo uma brincadeira. Um desenho animado de quatro minutos e na plateia está o famoso cineasta ator Mel Brooks falando alto e dizendo que aquilo, aquelas imagens não podem ser cinema, pois não é possível pagar 2 dólares para assistir àquela porcaria. E os outros espectadores pedem para ele calar a boca. Também está em exibição no site Making Off.

Olinda, 04. 07. 2021

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