Colapso populacional na Palestina

O sociólogo americano Paul Kennedy, que ficou famoso há cerca de vinte anos, quando publicou o seu conceituado livro “Ascensão e queda das grandes potências”, acaba de publicar um belo artigo, intitulado “O maior problema de Israel” (1). Quero compartilha

A questão da explosão populacional


 


 


Para os que não o conhecem, Paul Kennedy é um conceituado sociólogo inglês, professor de História da Universidade de Yale nos Estados Unidos onde é radicado há muitos anos. Possui muitos livros publicados, em especial The rise and the anglo-german antagonism (“O auge do antagonismo anglo germânico”, sem tradução ainda no Brasil); Preparing of the twenty first century (“Preparando para o século XXI”, também sem tradução) e The rise and fall of the great powers (traduzido no Brasil pela editora Campus, sob o título “Ascensão e queda das grandes potências”). Este último em particular, vale a pena ser lido, ainda que já se vão quase 20 anos da primeira edição. A sua tese central é a de que todos os grandes impérios que a humanidade conheceu em sua história, desde o grande Império Romano e todos os que os sucederam, ao final de seus tempos, acabam entrando em crise grave econômica e viram potências guerreiras, agressivas. Parece que é exatamente isso que vem se passando com os Estados Unidos.


 


 


Bem, meu objetivo aqui nesta coluna desta semana é tratar de um tema, que ao longo dos últimos cinco anos, já havia mencionado, ainda que superficialmente. Estamos em vésperas de uma reunião para discutir a paz, que ocorrerá nos Estados Unidos no próximo dia 15 de novembro. Ainda que convocada unilateralmente pelo governo Bush, será de qualquer forma uma reunião importante.


 


 


Israel, já se sabe, através de seu primeiro Ministro, não terá nada a oferecer aos palestinos. O que se quer é a paz em troca de terras. Ou seja, os israelenses devolvem as terras palestinas apropriadas pela força de uma guerra em 1967 e reconhecem, com 60 anos de atraso, o Estado nacional Palestino, ainda que com fronteiras com menos da metade das terras do que as destinadas pelo plano de partilha da ONU em 1947.


 


 


Mas, porque do impasse? Há mais de 200 colônias judaicas na Cisjordânia (as da Faixa de Gaza foram todas retiradas), onde moram, armados até os dentes, mais de 200 mil colonos judeus, dos mais ortodoxos. Além disso, tem a construção do chamado Muro da Vergonha, que isola parte da Cisjordânia de Israel. Tal muro, a um custo de vários bilhões de dólares, já foi condenado por vários tribunais internacionais da ONU.


 


 


Ocorre que há um problema imenso para Israel, que não há como isso ser controlado pelo Estado israelense de nenhuma forma. Trata-se da questão populacional. Ou falando mais claramente: a explosão populacional dos palestinos e a baixa fertilidade das mulheres judias. Explico. Os números impressionam, mas mulheres judias tem uma média de no máximo, um filho por família, enquanto as mulheres palestinas têm pelo menos duas a três vezes mais.


 


 


Ora a situação, mesmo sendo de opressão aos palestinos hoje, é só uma questão de fazer as contas, de matemática e de estatísticas. Israel tinha em 1973, 3,2 milhões de habitantes. Passou a 6,4 milhões em 2006 e os estudiosos (os dados que aqui menciono, são de Paul Kennedy e tem como base os números oficiais, ainda que projetados do Banco de dados Internacionais do Birô do Censo dos Estados Unidos, uma espécie de IBGE americano, com dados muito sérios e confiáveis). Projeta-se uma população em 2050 de apenas 8,5 milhões de habitantes.


 


 


Do lado dos palestinos, que estão confinados na pequena Faixa de Gaza e na Cisjordânia, estes eram em 1973 1,1 milhão, passaram a 3,9 milhões em 2006 e projeta-se uma população de 9,8 milhões em 2050, ou seja, passaram a quantidade total de israelenses em territórios pequenos e densamente povoados. Um verdadeiro caldo de cultura para a ampliação em níveis elevadíssimos do conflito já grave na atualidade.


 


Algumas conclusões que Paul Kennedy tira e informações que nos presta:


 


 


• Quando da criação do Estado de Israel pela hoje, que no próximo dia 29 de novembro completará 60 anos (voltaremos a esse tema na coluna), o secretário de Estado de Harry Trumann, no momento de maior tensão na Palestina, quando entre 1945 e 1946 a Inglaterra anunciou que deixaria a região, que era George Marshall, aconselhou Trumann a não aceitar a formação do Estado de Israel, pois isso deixaria os Estados Unidos muito mal com todos os países e o povo árabe em geral. O defensor do Estado judeu era o assessor jurídico de Trumann, Clark Gifford, que acabou vencendo a batalha, mas quem estava certo mesmo era Marshall;


 


• A explosão populacional é imensa com os vizinhos árabes de Israel, cujas populações projetadas para o ano de 2050, respectivamente nos países são de 5 milhões para o Líbano; 11,8 milhões para a Jordânia, 34,4 milhões para a Síria, 49,7 milhões para a Arábia Saudita, 127,6 milhões para ao Egito e outros 238,3 milhões para os países restantes vizinhos de Israel. Portanto, 475 milhões de árabes contra menos de 10 milhões de judeus! Um judeu para cada 48 árabes!


 


• Para o professor Paul Kennedy, esse é o maior problema da região e não outros perigos que vem sendo alardeados por estrategistas militares;


 


• Kennedy alerta para os problemas ambientais, especialmente a questão da completa falta de água potável na região para saciar a sede desses contingentes imensos de pessoas;


 


• Como, indaga Kennedy, mesmo um estado bem armado militarmente, como é Israel, pode conter 10 milhões de palestinos, tendo uma população de menos de sete milhões e mesmo dentro de sua própria área existem cerca de dois milhões de árabes que são israelenses? Será possível que mesmo co superioridade militar será possível conter a violência?


 


• Nesse cenário, há, portanto, dois caminhos possíveis: 1. Investir na força bruta, massacrar palestinos que lutam pelas suas terras e pela sua libertação e 2. Seguir negociando, especialmente com setores moderados do movimento palestino. A conclusão de Kennedy – e a vida tem demonstrado isso – é que Israel esta fazendo ao mesmo tempo as duas coisas e com apoio americano;


 


• Kennedy duvida que essa estratégia dará certo e sinaliza que a contenção dos palestinos será sempre parcial e todas as medidas serão paliativas. Usa o termo “manter os lobos afastados”. Mas isso dará certo? E se der, por quanto tempo?


 


 


Como vimos anunciando há anos: não vemos solução em curto prazo para o conflito árabe-palestino. A correlação de forças não pende ainda a favor dos que lutam por justiça e liberdade. Ao contrário. Temos dito que “vivemos um período conservador de longa duração”. Mas, não existem noites eternas. Não marcamos data para nada e nem é função de sociólogos serem profetas e visionários. Mas a completa vitória dos palestinos ainda vai demorar muitos anos e não depende, infelizmente apenas deles. Depende da mudança de rumo global de todo o planeta e do fortalecimento das forças progressistas.


 


Nota


 


 


(1) Publicado na Folha no último dia 4 de novembro de 2007, domingo, no caderno Mundo, na página A19.

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