Não verás país nenhum?

Ninguém nota essa pessoa. Mas, afinal, por que deveriam notar? É mais um na multidão. Que importa se essa pessoa parece estar lenta, cabisbaixa?

Fotomontagem feita por Artur Nogueira com as fotos de: Andrea Piacquadio/Pexels

Parado numa esquina, uma pessoa cujo nome não interessa, olha para o horizonte sem ter um foco específico. A pessoa baixa a cabeça, olha de um lado para outro, parece preso no chão. Não se movimenta. O que acontece? Por que essa pessoa não se move? Na sua frente, carros e pessoas se movimentam e não notam a sua paralisia.

A pessoa começa a se mover, lentamente. Anda de 2 a 3 metros e para. Se escora na parede. Baixa a cabeça. Imóvel. Parece que o simples ato de caminhar é um movimento pesado, como se estivesse carregando um peso excessivo nas costas.

Ninguém nota essa pessoa. Mas, afinal, por que deveriam notar? É mais um na multidão. Que importa se essa pessoa parece estar lenta, cabisbaixa?

De repente essa pessoa levanta a mão. Seu movimento denota um certo receio em fazer tal coisa. Mas é só levantar mão. Por que esse receio?

Esse movimento é tão conhecido pois são milhares que estão fazendo, naquele momento, em várias partes do país.

Essa pessoa está pedindo um auxílio. Pede uma ajuda. Pede socorro. Cabeça baixa, ombros caídos.

Se nome, de fato não importa. Está desempregado(a), famélico(a), sem esperança.

Cinco anos atrás trabalhava numa pequena empresa. Uma empresa que estava, na ocasião, passando por dificuldades. O país estava à beira de um golpe de Estado e essa pessoa, empregada, estava torcendo para a “vagabunda” fosse “expulsa da presidência”.

A pessoa lembra que foi para as ruas e comemorou efusivamente a queda da presidenta Dilma Rousseff. Tomou umas biritas e dizia, em voz alta: agora vai!

Foto: Oswaldo Corneti/ Fotos Públicas

Seu patrão, no dia seguinte da deposição da presidenta, o abraçou e ambos comemoraram a nova era que se aproximava.

Apenas um ano depois foi demitido(a). Temporário, imaginava ele(a). Olhava para seu filho(a) e tinha a confiança de que em breve “tudo iria voltar ao norma”.

Dois anos depois fazia bicos. Não conseguira retornar ao mercado de trabalho. E soube que a empresa que trabalhara foi a falência. Seu coração, apertado, ainda trazia alguma esperança. Tem que melhorar. Apostou no “novo”. Em algo “fora da política”. Chega desses safados. Fez campanha para um sujeito que mal conhecia, mas que se parecia muito com ele(a).

Três anos depois, ainda desempregado, vê os bicos rarearem. Maldito seja o “petê”, que me colocou nessa situação. Eu confio que “o cara” irá mudar “isso daí”. Em desespero, mas esperançoso.

Quatro anos depois seu mundo desabou. Pandemia.

Cinco anos depois está desolado, destruído, esfacelado. Cinco anos desempregado. Sua sobrevivência agora dependia de terceiros. Perambulava pelos sinais de trânsito, envergonhado, buscando uns trocados, limpando para-brisas ou quando sobre umas moedas, compra pão e uma latinha de Coca-Cola, seu vício.

Não tem mais família. Não tem mais futuro.

Depois de horas pedindo, consegue juntar umas moedas e retorna para o seu “lugar”, um amontoado de papelão e uns restos de móveis, que hoje são sua “moradia”.

É o fim? Será que essa pessoa, que sequer chegou aos 50 anos, não tem mais nada a receber do seu país?

As forças democráticas devem olhar para a condição dessa pessoa, que representa milhões e milhões de brasileiros, e construam uma frente para derrotar o algoz desse que, se um dia já teve esperança, agora precisa de algo que lhe devolva a vontade de seguir.

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