Nosso amigo extraordinário”: Lição de humanidade e sensibilidade

Filme poderoso que aborda a solidão, envelhecimento e relações humanas, convidando à reflexão sobre nossa sociedade em constante transformação.

Personagem de Ben Kingsley encontra no alienígena um antídoto contra o tédio | Foto: Divulgação/Linda Kaller

Mais um filme sensível, humano, impactante, que toca os sentimentos e nos chama para refletir sobre a solidão, o abandono, o envelhecimento e as relações familiares. Dirigido por Marc Turtletaub e escrito por Gavin Steckler, o filme Nosso Amigo Extraordinário (Jules, no original), disponível pela Netflix, além de expressar o sentimento de humanidade, transparece sensibilidade à flor da pele. A película mistura ficção científica, comédia e drama, mostrando como um alienígena, um extraterrestre, têm sentimentos e consegue recolocar possibilidades nas pessoas, centralmente nas três pessoas que acabam se relacionando em torno de Jules. Dessa forma, conseguem extrair os melhores sentimentos ao mesmo tempo em que as aproxima, resgatando a esperança na vida e ainda provocando perspectivas, mesmo após determinada idade. Cada uma delas enfrenta a velhice e o abandono e a descrença nelas próprias.

A trama envolve Milton (Ben Kingsley), viúvo que mora sozinho em sua casa e  recebe a visita de sua filha que o apoia em algumas tarefas, como pagar contas ou alguma compra. No entanto ela demonstra certa preocupação pelo fato dele morar só e ao mesmo tempo desconfia que o mesmo está perdendo a memória. O filme se desenvolve em uma pequena cidade no oeste da Pensilvânia e, além de Milton, Sandy (Harriet Sansom Harris) e Joyce (Jane Curtin), duas idosas do bairro, participam de reuniões de um conselho com representação parlamentar no bairro, que ouvem ou fingem ouvir as reivindicações dos moradores, mas que no entanto pouco encaminham. Ao contrário, manifestam-se com indiferença às pautas indicadas, principalmente por Milton. A entrada do ET, batizado com o nome de Jules, traz vida nova para Milton e para as duas mulheres que se juntam depois de algumas situações inusitadas e passam a falar de suas histórias, tristezas, desalentos e também dos sonhos.

A temática é envolvente tanto na forma como é apresentada como em seu conteúdo; tem relevância social, particularmente no Brasil, em que o envelhecimento da população caminha a passos largos. Os dados do Censo de 2022 revelaram que estamos mais senis. A idade média, que era de 29 anos em 2010, passou para 35 em 2022. A população idosa com 60 anos ou mais de idade chegou a 32.113.490 (15,6%), um aumento de 56,0% em relação a 2010, o que deve requerer mais cuidados e fortalecimento de políticas públicas, além de repensar as relações sociais e humanas desde a educação das crianças, a adolêscencia e a fase adulta, incluindo valores como respeito, ética, justiça, amor e solidariedade, sentimentos tão importantes mas cada vez mais descartados pela lógica competitiva e do lucro máximo. Pensar a educação como um valor civilizatório, de humanização, de diversidade, de encontro e convivência é combater a educação como negócio, a educação bancária no sentido de Paulo Freire, manifestando-se contra a intolerância, o preconceito, a negação do outro(a), as violências preparando para uma nova sociedade no dizer de Antonio Gramsci, de uma emancipação social e humana.

É preciso pensar que viver mais não significa viver melhor. Por isso, é preciso reconhecer os múltiplos fatores de uma qualidade de vida. O envelhecimento é um processo complexo e multifatorial. A variabilidade de cada pessoa (genética e ambiental) acaba impedindo o estabelecimento de parâmetros. Por isso, o uso somente do tempo (idade cronológica) como medida esconde um amplo conjunto de variáveis. A idade em si não determina o envelheciento, ela é apenas um dos elementos presentes no processo de desenvolvimento, servindo como uma referência da passagem do tempo. Aprimorar e fortalecer o SUS, compreender os novos arranjos de moradia e família, os territórios, as condições sociais e econômicas de cada pessoa.

O filme em pauta nos leva a pensar um conjunto de situações, tendo como centro a metáfora do ET: alguém pensado a partir da solidão e do abandono. Uma pessoa estrangeira, o alien, que chega para aliviar o isolamento das três pessoas idosas. Inclui ainda como reflexão os sintomas do envelhecimento como o esquecimento ou certa degeneração dos neurônios ou desorientação.

Vale a pena ver, sentir, refletir sobre nossa vida e de nossa sociedade, como um país que não é mais um país de jovens, mas sim um país que está envelhecendo, combatendo os estereótipos associados à velhice e valorizando o conhecimento e dos saberes acumulados.

Referência:

https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/38186-censo-2022-numero-de-pessoas-com-65-anos-ou-mais-de-idade-cresceu-57-4-em-12-anos

https://cinepop.com.br/critica-nosso-amigo-extraordinario-sensivel-e-metaforico-sci-fi-da-netflix-vai-te-emocionar-455524/

Ficha técnica:

Titulo: Nosso amigo extraordinário (Título original: Jules)

Comédia, Ficção Científica

Direção: Marc Turtletaub

Roteiro Gavin Steckler

Elenco: Ben Kingsley, Harriet Sansom Harris, Jane Curtin

Duração: 1h 27min

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