O balde de Chico

.

Xillogravura: Oswaldo Goeldi

Uma carcaça de geladeira suspensa, na beira da linha férrea, servia como ponto de encontro para as coisas rejeitadas. Todos os dias aquela carcaça transbordava de sobras de comidas, embalagens e de objetos descartados.


A carcaça era vigiada. Chico morava há 20 passos daquele ponto de encontro. Cotidianamente se encontravam na rua, a carcaça, Chico e seu balde de 20 litros, que um dia tinha tinta e já foi branco. 


Na beira da carcaça, Chico, num exercício paciente revirava cada rejeição e atentamente procurava o desconhecido, não porque seja desconhecido, mas porque não sabia o que procurar e aos poucos, o seu balde ia enchendo. 


Vai para casa, sobe as escadas e fica na varanda, despeja o balde, senta como índio, acocorado, olha a rua e o que catou na carcaça, Chico escolhe algumas coisas. O que restou coloca novamente no balde de 20 litros que já teve tinta e que já foi branco.        

                             
Novamente Chico vai à carcaça, despeja o balde e volta para casa.  O balde está vazio, Chico talvez aliviado.  


A carcaça fica cheia novamente. É dia de pegar o balde de 20 de litros, que já teve tinta e que já foi branco. Chico não perde tempo, vasculha, cata e enche, entra em casa, sobe as escadas, fica na varanda, despeja o balde, senta como índio e recata.  O que não quer colocar no balde,  rejeita na carcaça.          

 
Todos dias a carcaça se enche e tudo parece se repetir. Chico nunca fica com o balde cheio, mas parte do ponto de encontro fica com ele.   

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor