O cinema que eu quero no futuro

# não quero um cinema que seja diversão. Quero filmes que se comparem aos melhores livros. quero a genialidade como […]

# não quero um cinema que seja diversão. Quero filmes que se comparem aos melhores livros. quero a genialidade como meta …

# quero que apareçam novos cineastas e imediatamente possam ser comparados com figuras como Luchino Visconti, Nelson Pereira dos Santos, Ingmar Bergman, Lars Von Trier …

# quando o filósofo Walter Benjamin analisou o sistema das artes, colocou em destaque o cinema, contra todas as opiniões reinantes. Para Benjamin, as artes perdiam a aura pelo fato de serem reproduzidas, perdiam a unicidade. O cinema não perdia justamente porque a reprodução é algo intrínseco a ele, e assim o cinema é a “arte das massas”, como disse Lênin.

# mas eu quero um cinema que simplesmente não divirta as massas, e não faça como fez o cinema de Hollywood que imbecilizou as massas … Essa estória de que “cinema é a maior diversão” é coisa da Empresa Severiano Ribeiro, no tempo em que tinha José Ronaldo Gomes como gerente aqui no Recife e era então a maior exibidora / distribuidora.

# quero um cinema como dizia meu amigo Fernando Spencer, “sem bitolas”. O cineasta pode usar o Super 8, 16mm, 35mm … tanto faz. Hoje, o que vale é o digital não sei se de 4k ou de quantos Ks…

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# Também a duração do filme … não tem importância quanto tempo vai durar. Pode ser meia hora ou doze horas e virar uma série.

# a maior força do pensamento humano está contida nos livros. Quem gosta de cinema e quer que ele seja uma arte – a sétima – quer também que os filmes consigam elaborar histórias e estórias com a força de uma obra genial da literatura. Seria possível encontrar hoje um filme com a intensidade criadora que existe no romance “Ulysses” de James Joyce?

# a indústria, especialmente Hollywood, faz do cinema um instrumento de maquinações mentais e não só ganha fortunas como é a maior indústria do império norte-americano. Mas o que é principal, especialmente para eles, é que criam e criaram uma forma de “educar” as massas do mundo todo. É preciso criar um novo cinema para libertar o mundo.

# os chineses, não só no tempo de Confúcio, mas hoje no tempo de Mao e de Xi ji ping, são sábios e por isso abriram o comércio da China para inúmeros produtos . Mas os filmes não. Há um bloqueio para que eles não invadam a mente da massa chinesa.

# não preciso de salas especiais para ver um filme. Sala é uma questão externa ao cinema. É importante para criar situações de ambiência social. O que quero é criar o hábito de ver um filme com a mesma “solidão” com que se lê um livro.

# o papel da crítica deve continuar sendo intermediar a essência da obra de arte – do filme – com o espectador. Por isso é fundamental para quem vai ver um filme que saiba o mais possível sobre ele. Quem fez, quem é, de onde ele foi extraído, de que país, tudo.

# na sessão das 20 horas no Cinema do Museu, em Casa Forte no Recife, na sexta-feira feriado da República, o filme era o coreano “Parasita”. Na sala cheia, não se ouviu do começo ao fim um suspiro mais alto. Assim é que deve ser um público para assistir a um filme de arte. Embora que no futuro o cinema deva ser uma arte de fruição mais individual. Cada vez mais. Como o livro.

# um espectador, leitor de literatura e espectador de cinema, 60 anos, economista de profissão, funcionário de uma hidroelétrica, assistiu ao filme “A casa que Jack construiu” de Lars Von Trier, no celular, em várias sessões. E não perdeu a dimensão dramática do filme. No final, considerou a obra ‘fortíssima’. Isto é, assistiu ao filme como quem lê um livro. Essa tem que ser a forma de cinema, nova como uma arte maior.

# enfim, a Arte é usada para distribuir divisas aos seus produtores. Mas isso é apenas um resquício da arte. Uma Arte menor. O homem e a mulher mais desenvolvidos fazem e veem Arte como o aspecto mais maduro e forte da Vida.

Olinda, 23/11/2019

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