Opção pelo Campo

Graças à generosidade de 80.545 eleitores amazonenses que me honraram com seus votos em 2010 acabo de ser empossado Deputado Federal em substituição a um colega que se licenciou para ser secretário municipal em Manaus.

Faço o caminho inverso, pelo menos temporariamente. Solicitei a exoneração do cargo de Secretário de Estado da Produção Rural (SEPROR) para poder assumir a representação popular que me foi delegada pelo sufrágio popular em 2010. Mas, por uma decisão pessoal e um apelo político do governador, me licencio do cargo de deputado federal para retornar ao comando da SEPROR e concluir os inúmeros projetos que ali estão em execução, todos voltados para elevar o padrão de vida de homens e mulheres do campo.

Por convicção pessoal e filosófica considero um mandato de Deputado Federal algo extremamente honroso, assim como dos demais cargos eletivos, na medida em que são a expressão da vontade popular e ensejam em si mesmo uma especial singularidade: é preciso ser distinguido, escolhido, para poder exercê-lo.

Tomando como referência a estrutura clássica de estado sugerida por Montesquieu ele é composto pelo Poder Legislativo, Executivo e Judiciário. Sinteticamente cabe ao primeiro a definição das regras, das normas, do ordenamento legal e da rigorosa fiscalização para o fiel cumprimento das mesmas; ao segundo cabe precisamente executar, fazer com ideias se transformem em atos concretos, em materializações; e ao terceiro cabe o papel de impedir que haja o descumprimento das normas legais e mesmo da aplicação de tais normas de forma leniente ou parcimoniosa.

É desnecessário dizer que tal estrutura está bastante deformada. Não raro o legislativo abre mão de suas prerrogativas. Permite que o executivo e até mesmo o judiciário passem a legislar e mesmo o seu papel fiscalizador acaba sendo exercido pelo Ministério Público que nada mais é do que um órgão do Poder Executivo e, portanto, um ente fiscalizável e não fiscalizador. Tal aberração faz com que o seu papel seja atrofiado enquanto que o dos demais poderes vai se hipertrofiando. A manutenção ou intensificação dessa realidade pode criar, em perspectiva, a base de um estado ditatorial aos moldes do modelo preconizado por Thomas Hobbes no clássico Leviatã.

Mas essa deformação não elimina o fato de que é no poder legislativo – e apenas nele – que estão representadas todas as correntes de pensamento que lograram um mínimo de apoio popular quando submetidos ao crivo das eleições. O executivo se expressa pela corrente majoritária e pela própria natureza da disputa não contempla a corrente eventualmente derrotada que, a rigor, deve fazer oposição ao vencedor ou vencedora.

E o judiciário tem seu critério próprio de escolha, que se inicia pelo concurso público no inicio da carreira e culmina com nomeações de livre escolha do executivo estadual e federal quando se trata das instancias superiores do poder judiciário.

Como o estado, segundo a definição clássica do marxismo, nada mais é do que um instrumento de dominação da classe dominante não é preciso muito esforço para concluir que os interesses populares nem sempre figuram na pauta ou nas preocupações desse seleto grupo de operadores da justiça.

Daí a minha firme convicção do destacado caráter democrático do poder legislativo. Diante disso certamente o leitor mais atento deve estar se questionando porque alguém com tanta convicção da importância do legislativo o troca pelo executivo.

Parto da premissa que ninguém é insubstituível e, portanto, o meu retorno a SEPROR não é por uma presunção de que tudo para com a minha eventual saída. Não tenho esse receio. Há um núcleo básico na Secretaria, no IDAM e na ADAF bastante motivado e comprometido com a política do setor primário, apesar de extremamente reduzido.

Nesse espaço de tempo em que dirigimos a secretaria experimentamos importantes avanços. O primeiro deles foi ter conseguido elaborar uma política geral para o setor, estruturada em torno de 05 programas integrados: Aprimoramento Legislativo e Administrativo, Infraestrutura, Agroindústria, Expansão da Produção e Sócio Cultural, sob os quais se desenvolvem todos os projetos da Secretaria e suas afiliadas.

Realizamos o primeiro concurso público da história da SEPROR, obtivemos o apoio do governador e da Assembleia Legislativa para igualmente aprovar o 1º Plano de Cargos e Carreira do Setor, bem como um conjunto de leis e normas que visam estimular a produção em bases sustentáveis. O marco legal básico está resolvido e nos coloca em condições de competir com os vizinhos.

Recuperamos e abrimos mais de 1.000 km de estradas vicinais, construímos parques de exposição agropecuária, matadouros, frigoríficos de pescado no alto Solimões, barcaças e barcos tipo rabetão para escoar a produção, mais de 2.500 casas para trabalhadores rurais e outras tantas estão em construção.

Construímos a 1ª fábrica de bacalhau do país em plena selva amazônica e nos preparamos para inaugurar a 2ª planta enquanto assistimos o “bacalhau da Amazônia” virar noticia nacional. Estamos concluindo outras 04 agroindústrias de frutas, uma fecularia, uma destilaria e um polo moveleiro.

Os resultados começam a surgir. O produto interno bruto (PIB) do setor primário saltou de 4,38% em 2007 para algo como 7% em 2012, ano em que incorporamos mais 64 mil novos hectares à atividade produtiva. Graças à bravura de nosso braço de extensão rural – o IDAM – e uma parceria estratégica com os agentes financeiros (Banco da Amazônia, Banco do Brasil e AFEAM) acabamos de injetar mais de 180 milhões de reais em atividades no campo amazonense apenas em 2012. Acabamos de entregar lanchas rápidas e trailers para equipar as nossas barreiras sanitárias e assim obter o tão desejado status de área livre de febre aftosa.

Dezenas de tratores foram financiados pelo “mais alimento” e outros tantos estão sendo entregue as associações de produtores. Em parceria com o Conselho Nacional de Seringueiros e Populações Tradicionais (CNS) estamos entregando 2 mil kits sangria para dinamizar a produção de borracha ao tempo que assistimos a expansão consistente da piscicultura, que já ultrapassa as 18 mil toneladas e em breve será ampliada com a inauguração dos polos de Humaitá, Boca do Acre e Parintins com a mesma finalidade. A EXPOAGRO se supera ano a ano e acaba de se tornar autossustentável.

Acabamos com o desperdício de pescado a partir da criação do Projeto “Peixe Popular”, que assegura a venda de 1 kg de pescado por 1 real. Eliminamos a figura do atravessador com a criação do “Feirão da Sepror” o qual possibilita a comercialização direta entre centenas de produtores e milhares de consumidores. Criamos os encontros de trabalhadores da agricultura familiar (ETAF) que já caminha para a 4ª edição. Editamos 02 livros e 02 CD com autores exclusivamente de trabalhadores rurais. Criamos uma peça teatral o “Extensionista” e fizemos oficinas para estimular a participação popular.

Experimentamos avanços e, naturalmente, alguns reveses, mas não desistimos. Enfrentamos a escassez de recursos orçamentários com racionalização de custos, criatividade, parcerias comunitárias e com uma politica agressiva de captação de recursos através de convênios e emendas parlamentares federais.

Com o advento do Amazonas Rural, recentemente lançado pelo governador, as perspectivas são ainda mais alvissareiras. O programa absorve os programas da SEPROR e estabelece novos desafios específicos e bastante ousados, dentre os quais destacamos: atingir 100 mil toneladas de peixe oriundo da piscicultura, produzir 5 mil toneladas de borracha, modernizar a pecuária, dar especial atenção ao Rio Negro, criar o Projeto de Residência Agrária em parceria com a Secretaria de Ciência e Tecnologia e Fundação de Amparo a Pesquisa (FAPEAM) e tornar o estado autossuficiente em alimentos básicos.

Qualquer solução de continuidade nesse momento não é recomendável, razão pela qual, apesar de toda a minha paixão pelo parlamento, fiz a opção pelo campo. Pretendo, com a ajuda de toda a nossa equipe, concluir os projetos em curso e contribuir para tornar sonhos em realidade, como nos ensinava Lenin ao dizer que “é preciso sonhar, mas com a condição de transformar os sonhos em realidade”.

Certa vez questionaram Rousseau se ele era príncipe ou legislador para escrever sobre política. O grande pensador respondeu que não e por isso mesmo é que ele escrevia sobre política, pois “se eu fosse príncipe ou legislador não perderia meu tempo em dizer o que é necessário fazer; eu o faria ou calar-me-ia”, de onde se pode concluir que há momentos para teorizar e outros para realizar.

É o que estamos pretendendo fazer: realizar, compreendendo que, nesse momento, somos mais útil aos trabalhadores no executivo do que no legislativo.

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