Os Palestinos na Conferência da Igualdade Racial
Entre os dias 25 de 28 de junho, realizou-se em Brasília a II CONAPIR – Conferência Nacional da Promoção da Igualdade Racial. Pela segunda vez consecutiva, tive a honra de integrar como convidado, a delegação palestina do referido evento. Queria compartil
Publicado 02/07/2009 15:38
A Conferência
Tal qual como em diversos outros segmentos sociais – e já foram realizadas pelo menos 13 conferências temáticas diferentes nesses quase seis anos de governo do presidente Lula – a Conferência de Promoção da Igualdade Racial tem alguma coisa de especial. Ela procura incentivar a participação não só dos negros em nosso país, mas também setores minoritários da sociedade brasileira que sofrem algum tipo de discriminação. Não propriamente racial, pois este termo esta mal empregado, mas étnica talvez. Nesse caso, participam também os índios, os ciganos (calcula-se que sejam ainda uns 600 mil em todo o país), os judeus e os palestinos.
Ao todo, estavam previstos a participação de 1,3 mil delegados de todos os 27 estados brasileiros, mas devem ter se credenciado em Brasília em torno de 1,2 mil delegados. Os palestinos, por normas regimentais diferentes dos índios e dos ciganos, que eram todos convidados e delegados ao mesmo tempo, acabaram tendo mais convidados do que delegados eleitos nos estados.
Tive a honra de rever amigos antigos de quase trinta anos de luta, entre eles Ali El Khatib, Superintendente do Instituto Jerusalém do Brasil; Dr. Fawzi El Mashni, ex-embaixador da Palestina no México e nosso diplomata decano no país, com quem aprendi muito nesses anos todos; Dr. Ibrahim Al Zeben, atual embaixador, mas que atua na embaixada em Brasília há anos; Fátima Ali, do Rio Grande do Sul, com quem fomos dirigentes nacionais da Federação da Juventude Palestina “Sanaud” em 1984, quando da realização do Congresso que fundou a COPLAC – Confederação Palestina da América Latina e Caribe.
“Palestinos com o ministro Edson Santos, da Igualdade Racial”
Fiquei feliz em ver uma grande delegação da juventude palestina. Claro, são todos nascidos já no Brasil, mas seus pais e avós vieram da Palestina. Alguns na primeira expulsão, quando da Nakba em 15 de maio de 1948, outros quando da Guerra dos Seis Dias, a partir de 4 de junho de 1967. O trabalho com a juventude palestina no Brasil inicia-se a partir de 1983, com o Projeto “Sanaud”, que, em árabe, quer dizer “Voltaremos”. Eu sou da primeira geração desse trabalho com a juventude, ainda que não descendentes de palestinos, mas árabe-sírios. Éramos uma espécie de “trio”, além de mim e Fátima, tínhamos o Emir Mourad, engenheiro, hoje morando na Líbia. Esse trabalho político perdura até 1993 e se interrompe. Talvez pela nova conjuntura que o mundo iniciava naquele momento. Mas, isso é assunto para outra ocasião.
Essa delegação, que mesclava a “velha guarda”, com a nova juventude, participou ativamente dos trabalhos. Palestinos com o lenço característico, a que chamamos de hatta, estavam em todas as salas temáticas. Participaram ativamente das articulações políticas. Reuniam-se com lideranças do movimento negro, em especial da Unegro, com lideranças ciganas e de índios. A comunidade judaica, sob liderança do amigo Sérgio Niskier, engenheiro carioca, participou desta vez com poucos convidados. Foi decisão política tomada por eles que respeitamos. Na reta final da Conferência, Sérgio teve que ir ao Rio às pressas em função de ficar mais próxima de sua esposa que precisou de sua presença. Mas, deixou algumas propostas que foram debatidas. Em momento algum o diálogo com todas as etnias deve ser fechado. Costumo deixar sempre registrado, de forma enfática, que não devemos nunca ter nada contra nem com judeus e menos ainda com o judaísmo. Nossa divergência esta com o sionismo.
Estive mais ativo nas conversas de bastidores, nas reuniões da delegação que seguiam sempre madrugada afora. Sob a liderança do jovem advogado Elayyan Taher Aladdin, presidente da FEPAL – Federação Árabe-Palestina do Brasil, montamos um escritório no Hotel Bonaparte. Chegamos a ter quase 40 pessoas presentes nas reuniões. Todos os dias avaliávamos os trabalhos e traçávamos a estratégia para o dia seguinte. A FEPAL emitiu nota apoiando de forma firme o Estatuto da Igualdade Racial no Brasil, que tramita no Senado da República. Montou ainda um estande muito visitado na Conferência. Apenas lamento a presença de pequeno grupo de palestino na porta do evento que teceu críticas – injustas, diga-se de passagem – ao excelente trabalho que a FEPAL vem realizando no país.
Participei do Grupo Temático Internacional. Nesse grupo, várias moções importantes foram apresentadas pelos delegados palestinos. Uma que nos solidarizávamos com os refugiados palestinos recebidos pelo Brasil – em torno de 120 – e outra que declarava Avigdor Liebermann persona non grata no Brasil (o chanceler de Israel chega ao país em 26 de julho para preparar a visita que Lula fará à Israel no final do ano). Houve outra moção ainda que pedia o apoio do governo brasileiro ao trabalho de uma comissão da ONU que investiga crimes de guerra de Israel contra os palestinos em Gaza. Todas, aprovadas por unanimidade e a sobre o fascista Liebermann, todos os 40 delegados e vários convidados presentes aplaudiram de pé a aprovação da moção.
A plenária final do domingo, dia 28 de junho, prevista para acabar às 15h, estendeu-se até 20h. Mais de 150 moções que vieram aprovadas pelos grupos de trabalhos teriam que ser apresentadas novamente e votadas. Decidiu-se, por acordo político de todas as entidades e delegados presentes, que estas serão submetidas ao CNPIR, Conselho Nacional da Promoção da Igualdade Racial, órgão da SEPIR.
“Palestinos com o ministro Orlando Silva, dos Esportes”
Os palestinos apresentaram uma proposta de resolução que trata de assuntos relacionados com a sua luta e à sua causa, da qual os brasileiros sempre foram solidários. Também esta será submetida ao CNPIR. Ao final desta coluna, publicamos na íntegra a proposta.
De um modo geral, esta 2ª Conapir, mostrou mais unidade política entre os delegados. Muitas decisões importantes foram adotadas que podem contribuir decisivamente para avançarmos na questão de eliminarmos de vez toda e qualquer discriminação e nosso país. E quanto aos palestinos, mais uma vez a esmagadora maioria dos delegados, de todas as etnias, ficou ao seu lado, demonstrando ampla solidariedade à sua luta e ao seu movimento.
Moção de Solidariedade e Apoio ao Povo Palestino
A 2ª Conapir – Conferência Nacional de Promoção da Igualdade acial, após analisar e discutir a situação em que se encontra o Povo Palestino delibera o que segue:
1. Apela à Comunidade Internacional para que intervenha junto ao Estado de Israel para que cesse imediatamente a ocupação dos Territórios Palestinos e retire todas as colônias israelenses instaladas ilegalmente nos referidos territórios, bem como a retirada e desmantelamento total do muro de separação;
2. Apela à Comunidade Internacional com vistas a fazer o Estado de Israel respeitar e implementar as convenções internacionais referentes aos direitos humanos dos povos que vivem sob ocupação, especialmente a IV Convenção de Genebra;
3. Apela a Comunidade Internacional a tomar todas as medidas necessárias para que o Estado de Israel ponha fim imediato ao bloqueio desumano que impõe a Gaza a mais de dois anos;
4. Apela à Comunidade Internacional para que assuma as suas responsabilidades com o Povo Palestino para que se viabilize a criação de um Estado Palestino soberano, conforme as fronteiras de 4 de junho de 1967, com Jerusalém Oriental a sua capital; e
5. Apela à Comunidade Internacional para que garanta o direito de retorno dos refugiados palestinos, conforme as resoluções da ONU.
Brasília, 28 de junho de 2009.