Qual reforma política?

As mudanças legais e constitucionais no sistema eleitoral, assim como as interpretações da Justiça especializada, em grande medida, resultaram de medidas casuísticas ou de puro improviso. Com essa prática, apesar da alternância no poder, o sistema polític

Ao longo da história política brasileira há dezenas de casuísmos. No período militar, a eleição indireta para governador e Presidente, o senador biônico, a instituição do bi-partidarismo, o retorno do pluripartidarismo, o fim da eleição dos suplentes de senadores e a fixação do número mínimo e máximo de deputados por estado são exemplos dessa prática. Estes dois últimos foram mantidos na Constituição e estão em vigor até hoje.


 


As decisões e interpretações judiciais também têm sido marcadas por casuísmo em muitos episódios, infelizmente. A interpretação de que a verticalização era obrigatória, após duas eleições sem essa exigência, e o entendimento de que a Lei Eleitoral de 2006, supostamente destinada a reduzir gasto de campanha, poderia vigorar no pleito do ano passado, enquanto a emenda constitucional nº 52, que acabou com a obrigatoriedade de verticalização, não poderia, apesar de ambas terem sido aprovadas a menos de um ano da eleição, também são exemplos de casuísmo.


 


Um bom exemplo de casuísmo e de improviso diz respeito à cláusula de barreira. Ela foi aprovada na Lei dos Partidos Políticos em 1995 para vigorar em 2006, mas foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em 2007, exatamente o ano que produziria seus efeitos. O principal deles seria a perda do direito de funcionamento parlamentar aos partidos que não tivessem atingido 5% do eleitorado nacional, em pelo menos nove estados, na última eleição.


 


Hoje há um consenso sobre a necessidade de uma reforma política, mas a herança de casuísmos passados e a ausência de acordo sobre o conteúdo do que deve ser votado tem levado a um impasse. Além disto, a rejeição da lista fechada e a Emenda à Constituição nº 52 dificultam boa parte da reforma.


 


A rejeição da lista fechada, vista como o principal pilar da reforma – porque criaria as condições para o financiamento público e a fidelidade – jogou um balde de água fria no tema. Além disto, a Emenda Constitucional 52, que tratou da verticalização, também dificulta a aprovação de outros temas, que estão na pauta de votação.


 


O financiamento público, por exemplo, só será possível para as eleições majoritárias, já que a rejeição da lista fechada inviabiliza essa modalidade de custeio para as eleições proporcionais. O instituto da fidelidade partidária ampla, com a transferência do mandato do deputado para o partido, também fica inviável com a rejeição da lista.


 


O fim das coligações nas eleições proporcionais e a criação da federação de partidos, que também fazem parte da reforma, correm risco, se aprovadas, de serem declaradas inconstitucionais, por conflitarem com o teor da Emenda Constitucional, segundo a qual “É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária”.


 


Ora, se a Constituição dá autonomia e delega aos partidos políticos o poder para “adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais”, não teria sentido ou cabimento a lei proibir as coligações nem tampouco dizer que a federação de partidos será o substituto da coligação, exceto se fixado por Emenda à Constituição.


 


Por último, restariam apenas duas mudanças. Uma regra de fidelidade a partir da ampliação do prazo de filiação como condição para concorrer a novo mandato, agravada com a inelegibilidade por um determinado prazo para quem mudasse de partido, e a proibição de mudança de domicílio de prefeito reeleito. É muito pouco para ser chamada de reforma política. Talvez tenha que alterar a Constituição para remover os obstáculos a uma verdadeira reforma política.

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