Quatro anos de guerra no Iraque

Comemorar aniversários é sempre uma coisa boa, pelo menos quando comemoramos datas de nascimento de entes queridos, como filhos, pais, irmãos. Nesta coluna, que comemora o número 240 e que semana que vem completará cinco anos (28 de março de 2002) ininter

Alguns tristes números


 


Na manhã do dia 20 de março de 2003, inicia-se o bombardeio de Bagdá pela aviação americana. Nunca uma cidade recebeu tantas bombas como essa milenar cidade árabe. Talvez nem a cidade alemã de Dresden, massacrada pela aviação estadunidense quando a II Guerra já estava praticamente terminada, deve ter recebido tantas toneladas de bombas como Bagdá. Um verdadeiro massacre. Na época, eu era da coordenação executiva, representando a CNPL, do Comitê contra a Guerra. Lembro-me de ter ajudado na organização dos dois maiores atos anti-guerra que São Paulo já havia presenciado nas últimas três décadas (nos dias 10 de fevereiro e 10 de março de 2003).


 


O repúdio à guerra, à invasão a ao iminente ataque era imenso, mesmo com o amplo apoio da mídia, dos grandes jornais e especialmente as grandes redes de TVs, que fazem, invariavelmente, o jogo dos Estados Unidos. No Brasil não foi diferente. A mídia tupiniquim saiu abraçando as teses – falsas – de que Saddam Hussein e o Iraque eram possuidores de armas de destruição em massa. Alguns chegavam a repetir o que o Pentágono queria e falaram em “29.284 munições químicas em poder de Saddam” (sic). Tudo mentira, balela. Meros pretextos para justificar o controle do petróleo iraquiano, com mais de 10% das reservas provadas do planeta e para apear do poder o presidente Saddam, dirigente árabe que mais resistia tanto a Israel como aos Estados Unidos.


 


 
Alguns números, todos terríveis, podem ser hoje contabilizados, sendo que mudam e aumentam a cada dia, a cada minuto que prossegue a ocupação;


 


 


• Civis iraquianos mortos – 65.160;
• Militares americanos mortos – 3.217
• Média de ataques às forças da coalizão por semana – mil ataques
• Média de mortes por mês – mais de mil


 


 


Quantificar mortos não é tarefa fácil para um país em guerra e com um governo títere, a serviço dos americanos. Há uma ONG britânica, que tem uma página na Internet especializada em tentar cumprir essa tarefa (www.iraqbodycount.org). No entanto, uma instituição universitária respeita nos EUA, fez uma contagem de tipo diferente. Uma pesquisa séria, por amostragem domiciliar (usada no Brasil pelo IBGE a cada ano, quando não se entrevista, como no recenseamento, todas as pessoas da população, mas cerca de 10% dos domicílios). Indagaram nesses domicílios quantas pessoas haviam morrido em função da guerra, de qualquer causa diretamente relacionada com ela (na resistência, em atentados, defendendo o governo etc.). O número é assustador, chegando a mais de 650 mil pessoas, civis iraquianos mortos. Pessoalmente, confio muito mais nesse número, por levar em conta pesquisa direta com as famílias em suas residências.


 


 


A crise iraquiana e o impasse


 


 


Não há nenhuma solução militar à vista no conflito. Os americanos já perderam essa guerra. Hoje não se trata de saber como fazer para ganhar, mas sim como fazer para perder com menos traumas, como minimizar a derrota, especialmente para o público interno. Hoje se trata de saber quando e como as tropas sairão e o que restará do infeliz governo que não governa nada no Iraque. E isso quem diz são generais do alto comando militar americano, inclusive o que tomou posse recentemente no Iraque, David Petraeus, comando militar na ocupação.


 


 


Recentemente, os americanos montaram um arremedo de conferência regional, onde convidaram representantes da Síria e do Irã, países comumente acusados de apoiarem a resistência iraquiana. Uma verdadeira farsa, pois esses países enviaram funcionários da chancelaria de terceiro escalão. A “conferência” ocorreu na Zona Verde, mais “segura” de Bagdá, e dentro da embaixada dos Estados Unidos, comandada por Zalmay Khalilzad. A própria realização da reunião em si já é, segundo o Partido Baath, a maior prova da derrota e da falência da ocupação americana ao Iraque.


 


 


Em entrevista às grandes redes de TVs americanas nesta semana, ao comentar os quatro anos da invasão, o presidente George W. Bush teve que reconhecer as imensas dificuldades imensas que vive no Iraque. Mas, afirmou em alto e bom som para que ninguém tenha dúvida: a retirada das tropas é para o próximo governo e que a luta será longa. Já havíamos noticiado isso anteriormente. A retirada em 2008 só mesmo com muita pressão popular, resoluções e moções no Congresso americano e um racha no Partido Republicano. Fora disso, não vejo como. Agora que o grande objetivo da ocupação vai ser atingido, qual seja, a completa privatização do petróleo iraquiano, que será administrado pelas grandes corporações petrolíferas americanas como a Exxon e a Texaco.


 


 


Uma pesquisa recentemente publicada no Iraque e feita por encomenda da BBC, US Today, ABC e ARD, grandes redes de TVs e cadeias de jornais americanos, concluiu que: a) 86% dos iraquianos temem que alguém de sua família seja atingido pela violência; b) 80% tem pouca ou nenhuma confiança nas tropas da coalizão.


 


 


Uma nota para registro


 


 


 


Na última terça-feira, dia 20, como que para comemorar os quatro anos da invasão, o governo fantoche fez enforcar o quarto membro do governo de Saddam Hussein. Desta vez a fúria assassinada recaiu sobre o vice-presidente Taha Yassim Ramadan, morto na madrugada do dia 19 para o dia 20 de março.


 


 


Neste final de coluna, queria registrar uma nota que nenhum jornal da grande imprensa deu – e leio pelo menos dois e até quatro todos os dias. Trata-se do pedido de asilo político do juiz que “condenou” Saddam à morte, Raouf Abdel Rahman. Ele na verdade se entregou ao serviço secreto britânico, de “sua majestade”. Apenas a combativa TV árabe Al Jazeera, noticiou o fato no último dia 10 de março. Não entendemos esse “asilo”, já que ele sempre foi um dos quadros do novo regime, à serviço da CIA e poderoso dentro da estrutura de poder iraquiana, do governo fantoche de Nour El-Maliki. Cumpriu direitinho seu papel, como manda o figurino. Mas, como todos sabem que os ratos fogem do navio bem antes dele se afundar, é bem provável que Raouf esteja já prevendo o fim do “governo” títere e tratou de se precaver. Até porque, mesmo vivendo na chamada área Verde, de alta segurança e protegido 24 horas por soldados americanos, ele corria risco iminente de morte.


 


 


Aqui concluo a minha coluna desta semana com moral elevado, altivo e confiante. Para isso, transcrevo as frases finais da nota do Partido Baath do Iraque, um dos que comandam a resistência aos invasores: “Longa vida à revolução armada iraquiana, a principal esperança de libertar a nação árabe. Longa vida à heróica resistência palestina, símbolo da nossa causa central. Glória e eternidade ao mestre de todos os mártires dos tempos modernos, o líder Saddam Hussein. Vergonha e desonra aos traidores, aos conspiradores contra o Iraque e os interesses da pátria árabe”.


 


 


Palestina


 


 


Peço desculpas aos leitores, mas deveria comentar sobre o novo governo de unidade nacional formado na Palestina, que une as forças do Hamas, que segue na chefia do governo, e do Fatah. Tinha separado farto material de pesquisa sobre o tema, mas esse assunto ficará para a semana que vem. Quero apenas lembrar, já que a coluna desta semana trata de calendário. Este ano, na Palestina temos duas datas “redondas”, por assim dizer, que serão lembradas, não necessariamente comemoradas. Uma delas trata dos 40 anos da ocupação da Cisjordânia e Gaza, na Guerra dos Seis Dias em junho de 1967. A outra, de triste memória, foi em 29 de novembro de 1947, quando a ONU aprovou o Plano de Partilha da Palestina e este ano será lembrado pelo 60º da decisão. Voltaremos a ambos os temas nas próximas colunas. Bom final de semana a tod@s


 


Notas


 


(1) Fontes de Dados utilizados para a redação desta coluna: Jornal Estadão do dia 20 de março de 2007, página A11; Jornal Folha de SP do mesmo dia, página A11; Jornal Hora do Povo, de 14 e 15 de março, página 7.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor