Um país do futuro, sequestrado pelo passado, querendo retomar o presente

O BraZil, que nunca teve uma ruptura social ou uma revolução, não passou por bruscas mudanças no seu tecido social. As elites nunca sofreram grandes sustos

Fotomontagem feita por Artur Nogueira com as fotos de: Ketut Subiyanto/Pexels

País historicamente jovem, sendo que sua independência foi construída tanto pelo enfraquecimento da metrópole, pobre e dividida, e pela tutela financeira da potência da ocasião, a Grã-Bretanha, o BraZil tem a fama de ser o país do “jeitinho”, onde tudo se arranja; em que o símbolo do funcionalismo público foi criado de forma pejorativa, simbolizado por um paletó numa cadeira vazia e com “ele volta já”; e onde a memória é tão curta que costumamos a cometer os mesmo erros com um hiato pequeno de tempo.

É óbvio que muito do que se tornou “característica” do nosso país está relacionado a uma visão pejorativa do nosso povo, algo muito presente na nossa elite, escravocrata e corrupta. O BraZil, que nunca teve uma ruptura social ou uma revolução, não passou por bruscas mudanças no seu tecido social. As elites nunca sofreram grandes sustos.

Nem a “revolução de 30” foi revolução, embora a ascensão da burguesia metropolitana e industrial tivesse reformatado a estrutura econômica e social do país nos anos 30, 40 e 50; nem a “revolução de 64” foi revolução, tratando-se nada mais e nada menos que um golpe militar, mergulhando o país em 21 anos de ditadura, deixando como legado um país endividado e desigual, com reflexos pelos anos seguintes.

País sem tradição política, posto que até 1945, à exceção do Partido Comunista do Brasil, então PCB, e fundado em 1922, não havia uma organização política nacional e quando estas começaram a se constituir, a partir de 1946, foram interrompidas em 1965, só sendo retomada a partidária em 1979, mas com sequelas tão profundas que até hoje, quando falamos em partidos no país, são poucos que conseguem identificar nas siglas, partidos.

Collor, Enéas, Bolsonaro e agora Moro e Dallagnol, são o legado da nossa formação econômica, política e social. Exemplos da nossa história.

Lembremos que um dos favoritos às eleições de 1989 era o apresentador cafona Silvio Santos, que só não concorreu devido a problemas com o seu registro eleitoral; e nesse mesmo ano, os 35 milhões de eleitores (no 2° turno) elegeram um “caçador de marajás” (53,0% dos votos válidos). Quem não lembra da figura soturna do médico fascista Enéas, que vindo do nada, em 1994 teve 4,6 milhões de votos (7,4%), batendo lideranças históricas como Orestes Quércia, Leonel Brizola e Espiridião Amim.

Em 2006 tivemos os 6,6 milhões de votos dados à ultra esquerdista Heloísa Helena (6,9% dos votos), e o recém fundado Psol, tratorando a candidatura de Cristovam Buarque. Quatro anos depois foi a vez da ex-petista Marina Silva abocanhar 19,6 milhões de votos (19,3%) e empurrando a eleição para o segundo turno. Marina viriam a assombrar o PT novamente em 2014, com 22,2 milhões de votos (21,3% dos votos), favorecendo um segundo turno que foi disputado palmo a palmo.

Ocorre que tanto Heloisa Helena, como Marina Silva, eram do espaço político tradicional e suas candidaturas favoreceram o fortalecimento da democracia representativa. Bolsonaro, a peste de 2018, irrompeu passando a imagem, falsa, de ser “fora do sistema” e o cansaço e incompetência política do governo, aliado a uma conjunção de fatos e fenômenos que criaram a “tempestade perfeita”, fez o país relembrar Enéas, na sua versão mais perigosa.

Caminhamos para 2022, já que o impeachment está descartado na prática, e é necessário que a política seja recuperada. Que a democracia seja recomposta. Que a anomalia fascista seja expurgada do sistema e seja trancada numa cela, com a chave jogada fora.

Para que isso ocorra, é fundamental que os partidos dispostos a recuperar o BraZil e os eleitores que tenham uma visão racional da política, formem uma grande união nacional, de salvação nacional mesmo.

Sem isso corremos o risco de continuar a ser governados por uma horda desqualificada, o que poder, historicamente, ser a destruição de uma país que tragicamente abraçou o passado.

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