Uma paz impossível na Palestina

Na semana passada, de forma quase despercebida pela grande imprensa, foi divulgada uma notícia bombástica: Olmert, primeiro Ministro de Israel, que não vai mais continuar no cargo, tentou uma cartada de paz, e poderia ceder 93% das terras da Cisjordânia a

Por que sou e continuo cético com a paz?


 


 


Já tratamos várias vezes sobre a paz, caminhos da paz, correlação de forças, as várias propostas, os temas do famoso Quarteto (EUA, ONU, UE e Rússia). Esse é um assunto recorrente em nossas colunas no portal Vermelho onde comentamos Oriente Médio há quase sete anos seguidos.


 


 


Não sou pessimista. Ao contrário. Tenho muito ânimo e sigo sendo otimista não só com a perspectiva de vitória dos palestinos em sua luta histórica pelas suas terras, como sou otimista com relação à luta dos povos contra a opressão e no caminho da construção de uma nova sociedade justa e igualitária.


 


 


Ocorre que o momento histórico que vivemos é dos piores que a humanidade já viveu para os trabalhadores e para os que lutam por essa nova sociedade. Acabo de ler a terceira biografia de Karl Marx. É do economista Jacques Attali, francês. Maravilhosa. Marx foi um ativo revolucionário de sua época, de seu tempo. Um tempo que houve várias revoluções, especialmente a de 1848 e 1871 da França, a famosa Comuna de Paris que durou apenas e tão somente 72 dias. Em muitos momentos, revolucionárias da época achavam que a Revolução, tão esperada por todos, estava quase à porta. Mas em outros tantos momentos, o que se via era o abatimento, a tristeza, as perseguições, as prisões e mesmo fuzilamentos, mortes.


 


 


Esse tempo em que vivemos não são tempos revolucionários. Ao contrário. Vivemos, desde mais ou menos meados da década de 1980, um refluxo do movimento popular e revolucionário. Em vários países do antigo campo socialista, houve retorno acelerado ao sistema capitalista. E nos países capitalistas, aprofundou-se a aplicação do modelo neoliberal de desmonte do estado nacional.


 


 


Isso, seguramente, tem reflexos na Palestina. Porque lá seria diferente? Os idos das demonstrações de grandes operações na década de 1970, dos grupos guerrilheiros da Fatah, da Frente Popular e da Frente Democrática de Libertação da Palestina. Hoje, além de novos atores no cenário político na Palestina – temos o Hamas e a Jihad Islâmica – percebemos certo enfraquecimento das lutas populares. Mas mais do que isso. Percebemos muitas disputas entre as correntes revolucionárias do próprio movimento de libertação.


 


 


No entanto, tudo isso poderia ser superado. A questão central hoje diz respeito à correlação de forças no mundo hoje. Que países centrais, que forças políticas podem apoiar a luta de libertação da Palestina? Que grupos políticos, progressistas, revolucionários, em todo o mundo, estariam dispostos a empreender ampla mobilização pela libertação e emancipação da Palestina? Tudo isso é muito difícil pelo simples fato que estes tempos atuais não são nossos tempos.


 


 


É nesse contexto que me coloco como pessimista para a construção de um projeto de paz para a Palestina. Outros motivos pesam ainda. Um deles é exatamente o governo completamente enfraquecido e desmoralizado de Ehud Olmert. Ele acaba de anunciar que não vai se candidato à líder do seu Partido, o Kadima (racha do Likud) na convenção de setembro, é o primeiro Ministro de menor popularidade dos últimos anos e está envolvido em acusações de corrupção eleitoral (famoso caixa 2). Por isso não tem como prosperar nenhum acordo de paz nesse contexto.


 


 


Além desses aspectos mais locais e conjunturais, tem o aspecto mais geral, da política americana para o Oriente Médio. Um verdadeiro fracasso e George Bush encontra-se em final de mandato, envolto em grave crise econômica nos Estados Unidos, uma espécie de “quase recessão”. Também é um presidente em final de mandato da menor popularidade na história. Sua política externa que se caracterizou desde 2001 quando do ataque á torres gêmeas em setembro daquele ano, vem sendo de atacar e pedir explicações depois. São as chamadas guerras preventivas. Criou a tal da lista dos estados do “eixo do mal”, que apoiariam o chamado “terrorismo”. Hoje, através de seu secretário de Estado, Robert Gates, ex-diretor geral da CIA, isso pode estar até se modificando, mas segue com a orientação geral. Na prática, vem levando os EUA cada vez ao isolamento com relação aos outros países centrais, desenvolvidos. Há contradições hoje com a Rússia, China e vários países da Europa. Seu único apoiador mais direto e ainda assim já com reticências, segue sendo a Inglaterra.


 


 


A proposta feita por Olmert


 


 


Um dos jornais de maior prestígio em Israel é o Haaretz. Esse órgão de imprensa israelense divulgou na semana que passou um suposto plano de paz que vinha sendo construído e debatido há mais de seis meses tanto no âmbito do governo de Israel como com os negociadores palestinos. Alguma coisa nós já comentamos nesta coluna meses atrás.


 


 


Trata-se, resumidamente, da seguinte proposta: Israel devolveria aos palestinos 92,7% da Cisjordânia e para compensar essa perda de terras, Israel daria aos palestinos 5,2% de outras terras contíguas à Cisjordânia. A proposta não toca em dois pontos nevrálgicos: volta dos refugiados e o status de Jerusalém como capital de um futuro estado Palestino.


 


 


Temos dito, em outras colunas, que há três pontos que são intransponíveis para todo e qualquer negociador palestino e não há como avançar nos detalhes de um plano global de paz se não forem discutidos: a) fronteiras do futuro estado pelo menos as mesmas da Cisjordânia antes da Guerra dos Seis Dias; b) direito ao retorno dos refugiados palestinos e c) Jerusalém como capital do futuro Estado Palestino.


 


 


Ora, o tal “plano” de paz não menciona dois desses três pontos fundamentais para a construção da paz. Por isso, pela imprensa, tanto o próprio Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina, como seus porta vozes trataram de imediato de rechaçar a proposta que não deve prosperar. Ela deve ter sido mais um desses balões de ensaio que periodicamente ganham os jornais para medir a reação das partes em negociação. Mas também tem outro objetivo: os israelenses precisam dizer como já o fizeram quando Arafat era vivo, que os palestinos são intransigentes e que ao querem a paz e que eles “tentaram um acordo” (sic).


 


 


Assim, continuo com uma opinião muito consolidada: as discussões globais de paz na Palestina e no Oriente Médio, ficarão mesmo para o próximo governo, tanto o de Israel, que deve ser decidido agora em setembro, nas primárias do Kadima, como dos Estados Unidos, que, em novembro, terão eleições para seu novo presidente que poderá ser Barak Obama, Democrata, como John McCain, Republicano. Há quem diga, inclusive, que entre eles não há diferença nenhuma. Ao que eu discordo. Mas, enfim, devemos respeitar todos os pontos de vista.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
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