Como parte da correlação de forças adversa, que propiciou a consumação do impeachment da presidenta Dilma, emerge considerável dispersão entre as forças agora na oposição. Não apenas em razão da relativa fragmentação própria das eleições municipais, que configuram uma multiplicidade de alianças e projetos que põe em confronto, em âmbito local, correntes políticas que tendem a convergir em torno da questão nacional.
O jornal O Globo publicou um infográfico em que exibe a imensa multiplicidade de alianças partidárias celebradas para o pleito do próximo dia 2.
A crise e a descrença na política confluem – agora que a população desperta para o pleito municipal – para a necessidade de menos retórica e mais realidade concreta no discurso dos candidatos.
Outro dia ouvi Carlos Heitor Cony comentar uma crônica de Machado de Assis a propósito de um acidente fatal com um bonde elétrico recém-implantado no Rio de Janeiro. Machado se queixava dos riscos do novo meio de transporte, sugerindo ser preferível o bonde puxado a cavalos, que pelo menos não ameaçava os usuários com eventuais choques elétricos.
Em muitos aspectos, a campanha que agora se inicia tem muitas peculiaridades, frutos do arremedo de reforma política celebrado, ano passado, pela Câmara dos Deputados e pelo Senado.
Mesmo que o Senado, num lance a essa altura surpreendente, venha a não confirmar o impeachment da presidenta Dilma, os desdobramentos imediatos — na melhor das hipóteses, a antecipação das eleições presidenciais via plebiscito — se darão em ambiente de complexa e desfavorável correlação de forças.
No futebol, diz-se "bater cabeça" quando zagueiros do mesmo time se confundem na marcação. Ou a orientação tática está errada, ou os próprios zagueiros a desobedecem. Na política é relativamente comum a desorientação tática, sobretudo quando a maré não está pra peixe. Ou seja, quando a situação é desfavorável e o time está perdendo. Ao invés de se combater o verdadeiro adversário, muita munição se desperdiça alvejando aliados.
Em meio ao verdadeiro "tiroteio" movido por Michel Temer e seu grupo no desmonte de conquistas sociais e de direitos alcançados nos últimos 12 anos, o encontro entre o presidente interino e o senador Aécio Neves, ontem, poderia até passar como sem muita importância.
Qualquer que seja a decisão final do Senado a propósito do impeachment da presidenta Dilma, o Brasil já não será o mesmo. Já não é agora, como consequência do limite dramático a que chegou a crise política e institucional; e em razão do conjunto das medidas regressivas adotadas, em pouco mais de dois meses de interinidade, por Temer e seu bando.
Ainda garoto, chegou-me às mãos de leitor quase compulsivo um livro desses hoje ditos de autoajuda, de autor americano, se não me engano, em que numa determinada passagem é recomendado a alguém às voltas com muitas dificuldades (inclusive sem emprego) botar uma rosa na lapela e ir à rua como se tudo estivesse bem.