Os ''pára-quedas de ouro'' da crise

De chapéu na mão, os executivos dos três mastodontes em crise da indústria automobilística dos Estados Unidos, General Motors, Ford e Chrysler, pedem há três semanas à Casa Branca e ao Capitólio um empréstimo de emergência – mixaria: US$ 34 bilhões.


 


O senador Chris Dodd, que cuida do caso como presidente da Comissão de Bancos do Senado, adiantou que uma condição para a ajuda estatal é a demissão do principal executivo da GM, Richard Wagoner. ''Ele tem que deixar o posto'', sentenciou.


 


A opinião de Dodd, até por ter sido expressa numa das grandes redes de TV do país, traz para os holofotes o debate sobre os ''pára-quedas de ouro'' que tem sido ofertados a altos executivos para que se safem da crise do sistema sem danos ou riscos. O tema está em pauta tanto nos EUA como na Europa.


 


No caso do sistema financeiro dos EUA, que ganhou uma ajuda estatal de US$ 750 bilhões, rejeitada nas pesquisas de opinião pública mas aprovada no Congresso, este resolveu por ordem nos ''pára-quedas'': fixou um teto para os proventos dos executivos: US$ 400 mil/anuais (o que dá, pelo câmbio atual, R$ 84 mil mensais).


 


Wagoner assumiu o comando da GM em 2003; em junho de 2006 as ações da empresa valiam US$ 70; no mês passado eram cotadas a US$ 2,79. Ele aplicou nos últimos três anos um programa de corte de 25 mil postos de trabalho – 17% da mão-de-obra da empresa em 35 países, mas sobretudo nos EUA (no Brasil, as unidades da GM em São Caetano, São José dos Campos e Gravataí, escaparam por enquanto; os trabalhadores só sentiram até agora as férias coletivas e os ''days off'', estes sem remuneração).


 


Mesmo que a ameaça do senador Dodd se efetive, e Wagoner perca o emprego, por certo não conhecerá as agruras dos trabalhadores de verdade que ele mandou demitir. Estes são, em muitíssimos casos, os mesmos que não conseguiram fazer frente aos custos das hipotecas de suas casas, e as perderam com o estouro da bolha imobiliária que deflagrou a crise.


 


Há uma nítida fronteira de classe no tratamento dado até agora à crise. Os Wagoner vão de ''pára-quedas de ouro''. Bem outro é o destino, por exemplo, das vítimas da supressão de 533 mil postos de trabalho nos EUA, apenas em novembro (após outros 320 mil em outubro, quase dois milhões no ano).


 


São igualmente opostas as maneiras de reagir à crise. Na Republic Windows and Doors, em Chicago, a reação dos 300 metalúrgicos foi ocupar a fábrica, que fechou as portas sem pagar seus salários ou direitos, depois que o Bank of America cortou-lhe o crédito.


 


A centelha de luta contagiou os trabalhadores da cidade, que é o segundo centro industrial do país depois de Los Angeles, além de terra de Barack Obama. Eles ameaçam um boicote ao Bank of America. Enquanto os ocupantes da fábrica, sob a liderança do sindicato UE (United Electrical), escolheram a dedo a palavra-de-ordem do seu protesto, dando-lhe um sentido que deve tirar o sono da burguesia em crise:


 


''Yes, we can''…