João Ananias – O revés de um parto

Ana Carolina da Silva; Bianca Rocha Tavares; Igor Moraes da Silva; Laryssa Silva Martins; Luiza Paula da Silveira; Larissa Atanázio; Karine Lorraine Oliveira; Mariana Rocha de Souza; Milena Nascimento; Rafael Pereira da Silva; Géssica Guedes Pereira e Samira Pires Ribeiro.

A simples leitura do parágrafo acima não dá a dimensão da tragédia, mas contribui para aproximar cada um de nós de uma realidade que tem o poder de provocar, além do espanto, da tristeza e da indignação, uma profunda reflexão. Diante do espanto, a primeira ideia é bem radical; deveríamos fechar todas as fábricas de armas do mundo, e depois, destruir as que já foram fabricadas porque os empregos e os lucros desse comércio valem bem menos que uma só vida.

Diante da tristeza e da lágrima, lembramos os versos de Chico Buarque de Holanda quando ele tenta definir um tipo de sentimento quase impossível de ser transformado em palavras: “Que a saudade é o revés de um parto, a saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu”.

Diante da indignação surge a obrigação de olhar para o horizonte por onde com certeza passarão todas as crianças do mundo e de olhar para o passado de onde viemos todos nós. Olhando para trás, não vejo nenhuma explicação que seja suficiente para justificar o que ocorreu, mas arrisco dizer que o coletivo está doente.

Uma sociedade que a todo momento, na mais singular e insignificante de suas atitudes alimenta a concorrência, o preconceito, a segregação, a luta de classe e a vitória individual não pode em um momento como esse apontar o dedo para denunciar uma causa única.

Queria muito que a solução fosse simples assim, mas não é. Não é porque, além de depender de cada um dos brasileiros, depende também dos africanos, dos americanos, dos bolivianos, dos irlandeses, dos brancos e dos pretos, dos que acreditam em Deus e dos Ateus, dos heterossexuais e dos homossexuais, ricos e pobres, depende em fim, do esforço e do voto coletivo pela paz, depende de como cada um de nós vê e convive com o outro.

Arrisco-me a dizer que as mortes das 12 crianças em Realengo, foi um fato triste, o último ato de um desequilibrado social, mas a sua preparação teve início há muitos e muitos anos atrás e contou com a contribuição coletiva, ou com a sua indiferença.

João Ananias é médico e Deputado Federal (PCdoB-CE)

Fonte: O Povo

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