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Alice Portugal confirma candidatura a prefeita de Salvador

Farmacêutica, funcionária do Hospital das Clínicas, ex-sindicalista, duas vezes deputada estadual e três vezes federal. Alice Portugal construiu sua carreira política na luta social e foi para o legislativo com a mesma marca de sempre: a de rebelar-se contra as injustiças. Em entrevista ao site Bahia Todo Dia, ela fala sobre a atual administração municipal, alianças, projetos para a cidade e confirma: será candidata à Prefeitura de Salvador em 2012.

Alice Portugal se rebela e confirma candidatura à prefeita - Bahia Todo Dia

A sua pré-candidatura à Prefeitura de Salvador é mais um ato de rebeldia. Vai de encontro a intenção do todo-poderoso Partido dos Trabalhadores, que hoje governa o Brasil e a Bahia e gostaria de uma candidatura única da base na capital. Confiante, ela diz que sua pretensão é pra valer. “A letra do alfabeto da hora mudará. É a hora “A”.

Bahia Todo Dia – A candidatura de Alice Portugal é pra valer? O presidente do PT, Jonas Paulo, disse ao Bahia Todo Dia que na hora “H” os partidos da base aliada sairão unidos, porque não é do interesse da presidenta Dilma e do governador Wagner repetir o erro de 2008.
Alice Portugal – Sem dúvida. Essa é a pergunta que mais tem me cercado nos últimos tempos. Mas podemos dizer que a letra do alfabeto da hora mudará. E a hora é “A”, é de fato pra valer. Nós somos aliados do PT, temos uma relação de grande sinceridade e lealdade com o governador Jaques Wagner. No entanto, somos partidos diferentes e, por isso mesmo, nossa expectativa dentro desse momento político que o país vive, com uma tendência muito forte do fim das coligações partidárias, se não for para agora, mas será, sem dúvida, pois é uma tendência muito forte dos grandes partidos, nós achamos que é o momento das legendas que estão no entorno desse projeto se afirmarem, se colocarem para a sociedade, para que a população possa visualizar suas lideranças, as suas opiniões, o seu corolário político. Por isso, de fato, a candidatura é pra valer. Nós vamos participar do primeiro turno. Julgamos que é responsável a nossa posição. Salvador é uma cidade que não tem tradição de resolução em apenas um turno em suas eleições, e quem tocar o coração do povo apoiará o outro no segundo turno.

Bahia Todo Dia – Seu partido, o PCdoB, faz parte da base de Wagner e de Dilma, do PT. A senhora não acha que o lançamento da sua candidatura pode ser vista como uma declaração de rompimento da aliança?
AP – De jeito nenhum. Não existe nenhuma possibilidade de rompimento. Nós não enxergamos, nem na Bahia nem no Brasil, uma aliança que nos comporte melhor do que essa. Essa é inclusive uma aliança estratégica para o PCdoB e para o PT. É uma aliança que coloca em pauta um núcleo que afirma um governo democrático, um governo popular, de mudança nas relações políticas nacionais, de afirmação dos direitos do povo […] Então, nós temos a compreensão do quê são nossos governos. Agora, também compreendemos que, como força copartícipe dessa construção, nós precisamos também testar o nosso perfil e eventualmente fazer alternância no protagonismo.

Bahia Todo Dia –
Como você espera viabilizar a candidatura, sendo de um partido pequeno, que nunca enfrentou uma candidatura majoritária, com pouco tempo de televisão e poucos recursos financeiros? Além disso, você pode ter que enfrentar o candidato do governador, que pode ser o mesmo do prefeito.
AP – Primeiro, nós pretendemos ter aliados. Pelo que compreendi com as lágrimas do prefeito, na reunião com o presidente Lula, o chamando de “amado Lula” e “queridíssimo governador Wagner” e tentando afirmar “uma luta de nós todos” apenas para o candidato que nesse momento se acena como sendo candidato do PT, me refiro a readmissão judicial dos demitidos de Imbassahy, da Limpurb, obviamente é claro que existe uma tendência muito forte do prefeito, com um processo de governo superado, tentar agarrar-se como tábua de salvação, como lanterna dos afogados, no governo Wagner, que é o governo mais forte e unificado dos últimos tempos. Consegue ter uma presença na Assembleia Legislativa maior do que o "carlismo" obteve em seu auge. Agora, o que o governador, que já era deputado federal à época, não pode ignorar é que, para dar suporte a uma oposição, ele precisou muito do PCdoB na Bahia. Eu mesma fui líder da oposição três vezes na Assembleia. Enfrentei as tropas do governo de ACM, os projetos de desmonte da Bahia, que levaram o Estado a essa condição de subalternidade e rodapé das condições sociais do Brasil. Então, nós nos julgamos com estatura para esse processo. Portanto, acredito que, na medida em que a nossa candidatura alce voo, tenha condições de afirmação, nós buscaremos também amparo junto ao governador. Porque nós somos uma força constitutiva de larga história e uma força constitutiva desse projeto que levou a esse protagonismo do PT na Bahia. A outra coisa é que nós pretendemos ter aliados. É muito importante para o fortalecimento da democracia e para a própria formação de uma Câmara com a natureza diferenciada do que a que temos tido nas últimas legislaturas. É fundamental requalificar a Câmara Municipal. Acredito que, para o próprio futuro do nosso projeto, sejam importantes agrupamentos vicinais nesse processo de eleição no primeiro turno.

Bahia Todo Dia – O debate político promete-se acirrado até a eleição. Além da pré-candidatura do PT, fala-se em ACM Neto, pelo DEM e o PMDB cerca o ex-prefeito Mário Kertész. Como a senhora vê esse cenário?
AP – Na verdade, existe no PMDB uma tendência de buscar a sua candidatura. O partido está fazendo vários testes, vários ensaios. Acredito que o nome do ex-prefeito Mário Kertész se coloque nesse diapasão. É um nome muito forte, muito conhecido, um comunicador, e seria, sem dúvida, nesse sentido, uma candidatura de fôlego. Em relação às candidaturas que possam ser fagocitadas pela candidatura oficial, entre aspas, do governo, essa é uma discussão que nós precisaremos ter. Mas eu acredito que o bom para o projeto de Jaques Wagner na Bahia, que é o nosso projeto, é que os partidos da base aliada tenham no primeiro turno candidatos próprios.

Bahia Todo Dia – Quais as alianças que o PCdoB pretende fazer para enfrentar este quadro?
AP – Isso ainda não está desenhado. Estamos conversando com o PSB, com o PRB, com o PDT, com o PV e vamos seguir conversando com partidos da base do governo. Aqueles que entenderem que uma aliança conosco é algo que os fortalece vamos buscar selar. Mas estamos no começo e vamos, hora após hora, constituir essa possibilidade de uma aliança que viabilize um tempo maior de TV e uma maior agregação de forças.

Bahia Todo Dia – Mudando para o debate da cidade, a gestão João Henrique, que foi apoiada por três anos pelo PCdoB, foi ruim para Salvador ou é possível aproveitar algum projeto?
AP – Infelizmente, a gestão está superada. Esse modelo já está superado. O prefeito mudou muitas vezes a composição do seu secretariado, mudou de partido, mudou alianças. O governo de agora é completamente diferente do governo que começou. Para nós é muito tranqüilo, tivemos dois excelentes secretários na mesma pasta: Olívia Santana e Ney Campello fizeram um excelente trabalho. Isso aí é dito pela rede educacional de Salvador. No entanto, não tiveram condições, pelo próprio aporte de recursos, de fazer uma modificação determinante na estrutura da rede. Houve uma melhora de salários de professores, houve uma cobertura permanente de negociação com os setores docente e não docente. Houve uma adequação de metodologia e de material didático – esse talvez tenha sido o ponto alto, inclusive com a absorção de conteúdo anti-racista, pelo próprio perfil de Olívia, secretária da época, hoje vereadora. Mas sabemos que Salvador tem um grande cinturão de desemprego, tem um grande cinturão de analfabetismo real e funcional. Portanto, participamos com todas as forças, mas na hora da superação, tivemos firmeza e nos afastamos. O próprio afastamento do governador, que agora ele [o prefeito] se reaproxima, e toda a ordem de descalabros que houve em relação ao PDDU, à forma de entrega da cidade às grandes empreiteiras, de completa falta de cuidado com o meio ambiente, do desastre no trânsito, de inoperância nos objetivos relacionados à possibilidade de estímulo à geração de emprego e renda para as populações periféricas da cidade […] Tudo isso nos afastou do governo. Não nos arrependemos de ter participado na primeira hora, mas temos a clareza da atitude correta de termos saído.

Bahia Todo Dia – E sua relação com o Nelson Pelegrino, que é o provável candidato do PT… Vocês têm conversado?
AP – Hoje o candidato potencialmente mais forte no nosso campo é Nelson Pelegrino. Ele é do partido que é o núcleo do processo de governo na Bahia, que já foi candidato outras vezes. No entanto, nossa relação com ele é muito boa. Inclusive somos amigos pessoais. Fomos deputados estaduais juntos, somos federais, entrando no terceiro mandato juntos. Então, há uma relação de profundo respeito, identidade. Jamais acirraremos contradições antagônicas. A campanha não começou ainda, somos apenas pré-candidatos. Eu vou apresentar um programa de governo para a cidade, vou falar para Salvador sobre ela própria. As pesquisas vão falar, as ruas vão falar. Mas uma coisa é certa: nós temos legitimidade para colocarmos nosso nome. Nelson já foi testado. Foi testado em conjunturas diferentes, mas ele foi testado duas vezes. Em uma das vezes, aliás, eu fui candidata à vice com ele. Há quem diga que essa seria uma chapa imbatível. Mas veja só: estou em meu quinto mandato como deputada. Fui duas vezes deputada estadual e sou pela terceira vez federal. Eu me sinto madura. Sinto-me preparada. Vejo que é chegada a hora de uma exposição diferenciada do ponto de vista do que eu penso sobre a política. E o meu partido, por seu turno, concorda e enxerga isso. Por isso me coloca nessa posição de pré-candidata no momento. Com todo o respeito a Nelson e ao PT.

Bahia Todo Dia – Quais são as principais carências da cidade que precisam ser enfrentadas prioritariamente?
AP – Primeiro, está na ordem do dia, o debate sobre o transporte de massa. O sistema não é confiável. Para que você diminua o fluxo de automóveis no cotidiano da cidade algumas medidas são necessárias. E a grande medida é a estruturação, em consórcio com o governo do Estado, com o governo federal e com empresas de um transporte de massa que seja garantidor do direito de ir e vir das pessoas. Portanto, essa é questão número 1. No Brasil ou na China, vamos ter que buscar uma solução para a mobilidade urbana. Precisamos nos preocupar que essa mobilidade dê vazão a formas limpas de transporte. É preciso repensar o centro antigo de Salvador. Não é possível que haja uma degradação contínua do local. Não me refiro apenas ao Pelourinho. Falo do centro antigo que abrange toda a Avenida Sete de Setembro, a Saúde, a Barroquinha, o Comércio […] Esse centro precisa de um projeto. O sistema de carga e descarga durante o dia no centro da cidade é perverso. As pessoas não se movimentam. É preciso também discutir o problema do mercado informal. Não com o “rapa”, como o carlismo o tratou, mas com soluções inteligentes e lucrativas para essa população que tira dali o seu sustento. É preciso constituir esse diálogo. Tenho muitas idéias sobre nossa cidade. Acredito que possamos também, em conjunto com estudiosos e as secretarias, realizar projetos no tocante à geração de emprego e renda para as populações desempregadas da cidade. Nosso grande problema é a geração de mão de obra em Salvador. É preciso que soluções nesse aspecto sejam compartilhadas pelos gestores do município. Resumindo, os principais problemas estão no transporte, educação, preservação de patrimônio e saúde.

Bahia Todo Dia – E por falar em saúde, Alice, você acha que a retomada da gestão plena dos hospitais de grande complexidade pelo governo estadual seja a solução?
AP – Talvez seja a última para que não haja o descalabro. É lamentável porque o SUS preconiza a municipalização e a gestão plena, por intermédio de um somatório de ações dos distritos sanitários em cada município, e isso em Salvador foi abandonado. Talvez, uma solução de emergência seja necessária. Acho que muita coisa tem que ser revista. A saúde tem que ser auditada. Tem que verificar se os recursos que são diretamente ligados à saúde estão sendo destinados ao seu fim.

Bahia Todo Dia – Caso seja eleita, você pedirá auditoria?
AP – Pedirei. Pedirei ao SUS até porque nós passamos por momentos em que a saúde foi caso de polícia, e agora um problema de Estado.

Bahia Todo Dia – E com relação ao metrô, que também é outro descalabro?
AP – Pois é. O Tribunal de Contas [dos Municípios] está perfeitamente inteirado, não é? E essas obras param e voltam, param e voltam. Eu me elegendo, pedirei um relatório integral aos tribunais de conta da União, do Estado e dos Municípios.

Bahia Todo Dia – Resolvido agora o problema do estádio de São Paulo, a senhora acha que Salvador tem chance de sediar a abertura da Copa?
AP – Sim, sim. Salvador foi a primeira capital do Brasil. Salvador é uma cidade emblemática do ponto de vista da cultura brasileira. Isso seria um grande estímulo sobretudo pelo legado da Copa. Queremos que a realização desse evento privado sirva para que o Brasil usufrua de infraestrutura e fique com o legado dessa oportunidade que foi constituída no governo Lula e pelo ministro Orlando [Esporte]. A abertura do Mundial serviria para uma movimentação cultural especial dos nossos artistas, da nossa juventude, das escolas. Defendo que Salvador seja a porta de entrada da Copa, como foi a porta de entrada do Brasil de hoje.

Bahia Todo Dia – Por fim, Salvador já foi governada por uma mulher, que aliás já pertenceu ao seu partido e tem o mesmo perfil político da senhora, que veio da luta juvenil, universitária, enfim, do movimento social, além de terem bases eleitorais próximas, que é a senadora Lídice da Mata. Impossível não se fazer um link. A senhora acha isso bom ou ruim para sua candidatura?
AP – Nós sabemos que senadora enfrentou uma série de problemas porque ela era permanentemente alvejada pelo velho coronel que nós derrotamos, em vida, na Bahia. Lídice pegou uma conjuntura completamente diferente da conjuntura de hoje. Tenho certeza de que, se eu for eleita, eu vou contar integralmente com o governador Jaques Wagner e a presidenta Dilma. Então o que Lídice não teve eu terei.