O que é proibido na vida real não deve ser permitido nas redes, diz Moraes

Presidente do TSE defende ainda que é preciso haver autorregulação e regulamentação nas redes sociais para fazer frente aos discursos que estimulam ataques às escolas

Foto: Foto: Ricardo Stuckert/PR

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes defendeu, nesta terça-feira (18), que aquilo que não pode ser feito na vida real também não deve ser permitido no mundo virtual e que as redes devem ser regulamentadas. A declaração foi dada durante reunião convocada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva com representantes dos Três Poderes para tratar do enfrentamento à violência nas escolas. Um dos focos centrais de atuação do governo tem sido buscar frear a propagação de conteúdos nas redes sociais que estimulem ataques em instituições de ensino. 

“Acho que posso dar uma contribuição em relação ao grande perigo que afeta mais do que só as escolas — o local físico —, mas as crianças e os adolescentes que é a desinformação. O modus operandi dessas agressões instrumentalizadas, divulgadas, incentivadas pelas redes sociais em relação às escolas é exatamente idêntico ao modus operandi que foi utilizado contra as urnas eletrônicas, contra a democracia, o modus operandi instrumentalizado para o dia 8 de janeiro; não há nenhuma diferença”, explicou o ministro.

“As redes sociais se sentem terra de ninguém, sem lei. Precisamos regulamentar isso. Tenho conversado muito com os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira. Se não houver uma autorregulação e uma regulamentação com determinados modelos a serem seguidos, nós vamos ver a continuidade dessa instrumentalização pelas redes para incentivar ataques às escolas”. 

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O ministro lembrou que em todo o mundo tem aumentado a incidência de depressão e os casos de suicídios entre jovens, crianças e adolescentes. “A União Europeia e os Estados Unidos vêm estudando essa questão, a Austrália recentemente adotou uma legislação protetiva em relação a isso. Então, precisamos, de uma vez por todas, determinar que o que não pode ser feito na vida real não pode ser feito no mundo virtual”. Para ele, bastaria um artigo na lei a ser regulamentada no Congresso estabelecendo esse princípio. 

Moraes destacou que no TSE “conseguimos combater a desinformação no ano passado com a legislação existente, com uma interpretação protetiva à democracia, é verdade, mas uma interpretação necessária. Essa mesma interpretação é necessária para a proteção das nossas crianças e adolescentes”. 

As plataformas, disse Moraes, em que pese terem progredido em sua colaboração, lamentavelmente ainda se recusam a serem responsabilizadas. Fazendo um paralelo com a vida real, o ministro explicou: “As big techs dizem que são meros depósitos de informação, então, não podem ser responsabilizadas, segundo elas. No mundo real, se você tem um depósito e o aluga, obviamente você não pode ser responsabilizado se a pessoa guarda droga, contrabando, se guarda alguém que foi sequestrado, porque você não sabe. A partir do momento que você sabe e renova o contrato, você pode ser responsabilizado. A partir do momento que você sabe, renova o contrato e monetiza isso, ganha em cima disso, você tem a obrigação de ser responsabilizado. O que as redes sociais fazem é ganhar em cima desse incentivo à violência, desse incentivo ao discurso de ódio. Isso precisa cessar imediatamente”. 

Como forma de mudar essa situação, o ministro propôs que haja maior transparência dos algoritmos e a extensão, para casos relacionados à violência às escolas, dos métodos de autorregulação que já existem para pornografia infantil, pedofilia e direitos autorais. “Por que não estender essa obrigatoriedade de se utilizar a inteligência artificial (para rastrear esse tipo de publicação) e uma equipe humana para o residual também para (identificar) discursos nazistas, fascistas, homofóbicos, racistas e contra a democracia? São 5 tópicos objetivos”, apontou. 

O ministro acrescentou que, no caso dos atos contra a democracia, bastava às redes sociais colocar as elementares de tipo de crime. “Se aquilo estiver sendo divulgado – por exemplo, incentivar animosidade entre as Forças Armadas e os poderes constituídos – e passasse por esse procedimento, nós não teríamos tido o 8 de Janeiro. Tudo foi organizado e incentivado nas redes. E as redes sabem que são instrumentalizadas.”

Além disso, Moraes defendeu a “corresponsabilidade das redes no caso em que o algoritmo direciona, no caso em que há monetização e quando há impulsionamento de publicidade. É a mesma coisa (do exemplo) do depósito da vida real: se a plataforma está ganhando dinheiro com aquilo ela é responsável”. 

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O ministro defendeu, ainda que há “uma questão complexa, mas que já existe em outros ramos de direito, que é a inversão do ônus. Se a plataforma, com todos esses métodos, identifica a existência de notícias que incentivam ataques – ou estão incentivando mensagens incentivando o racismo; o nazismo na escola –, ela deve retirar, mesmo que uma ou outra notícia deixe alguma dúvida, e notificar imediatamente quem a colocou”. O ministro acrescentou que deve haver celeridade nesse processo, o que já é possível hoje. 

“A experiência que todos nós tivemos com discursos de ódio, discriminatórios, antidemocráticos durante todo esse período deve ser aproveitada para a proteção de nossas crianças e adolescentes. É possível, é necessário, basta que aprovemos uma lei com esses poucos pontos, não precisamos estender tanto e dali a alguns meses, fazemos uma análise para ajustes finos”, finalizou. 

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