Barbie segue tendência à diversidade e expõe o patriarcado do mundo real

Qualquer iniciativa que ponha em foco o patriarcado é bem-vinda. Mas não dá para considerar o filme com a expectativa de que defende a luta das mulheres contra a desigualdade de gênero.

Cena do filme "Barbie', com Margot Robbie e Ryan Gosling. Foto: Warner Bros. Pictures/Divulgação

Fui assistir ao filme Barbie. É óbvia a constatação de que é uma intervenção de mercado reposicionando o produto, também visível a imersão na cor rosa – sempre é bom lembrar que cor não tem gênero e há até por parte do setor da moda uma tendência a considerar que a cor rosa é uma cor básica. Então, não é um grave problema o excesso da cor rosa que incomoda algumas pessoas.

E mais, é também um fato que o filme Barbie ocupa grande parte das salas de cinema no Brasil, formando com o ótimo filme Oppenheimer uma dupla de filmes norte-americanos que praticamente baniu por pelo menos duas semanas outros filmes das telas do pais, incluindo os filmes brasileiros.

Tem tudo isso e mais. Mas vamos à percepção sobre o filme. A Barbie que esteve no meu imaginário e de outras mulheres com pais com poder aquisitivo para adquirir a boneca e até das que não ganharam essa boneca para chamar de sua, mas que a conheciam por extensão (o meu caso) é alta, magra, loura, cheia de vestidos e sapatos altos. Ela recebe a denominação no filme de Barbie estereotipada.

Julieta Palmeira

O filme segue a tendência de abrir caminho para a diversidade. São barbies diversas: a negra, a oriental, a com deficiência, a grávida, a gorda, a cientista. E tem a Barbie estranha, a que foi dada de presente a uma criança que destruiu seus cabelos e partes do seu corpo.  Essa foi a versão da boneca que mais gostei, é a Barbie que no filme tem soluções para tudo, é solidária, determinada e inteligente.

A ideia de buscar a diversidade da Barbie é algo interessante. O problema é que de forma intencional ou não, é temerário que possa se transformar a Barbie no símbolo da mulher contemporânea em toda a sua diversidade e na qual milhares e milhares de crianças vão se inspirar. Trazer o imaginário para mais perto da realidade é aceitável, mas o movimento contrário de fazer com que o imaginário inspire o mundo real me traz um estado de alerta sobre retroalimentação de padrões sociais, no geral conservadores. 

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O retrato da humanização da Barbie é quando ela começa a pensar na morte; no mundo real, a pessoa que dialoga com a boneca está infeliz e lhe passa esses pensamentos.  Daí se desdobra a viagem até o mundo real, sair da Barbilândia aonde as mulheres estão no comando e os homens subordinados.

Acontece que o mundo real é o mundo do patriarcado, onde a mulher é subordinada ao homem. Qualquer iniciativa que ponha em foco o patriarcado, no meu entender é bem-vinda. É a tal coisa, precisamos falar sobre isso. Mas, óbvio, não dá para considerar o filme com a expectativa de que defende a luta das mulheres contra a desigualdade de gênero. Nem seus produtores e diretora têm essa intenção.

O filme expressa a oposição do patriarcado ao matriarcado e vice-versa. Ou melhor, reduz a uma luta entre gêneros que diverte algumas pessoas, mas não é uma perspectiva. O que se busca é equidade de gênero, ou seja, acabar com o patriarcado e construir uma sociedade em que as mulheres e os homens estejam lado a lado, compartilhando a vida e decidindo. Para isso, é necessário que mais mulheres estejam em espaços de decisão e poder, mas não se trata de reproduzir o mesmo padrão de opressão.

Por outro lado, a humanização de Barbie me passou uma ideia de que reproduz também padrões de que a mulher pra se realizar deve engravidar e parir. Mas isso é outro tema.

Por fim, o filme é dirigido pela extraordinária Greta Gerwig que também dirigiu Larry Bird e Adoráveis Mulheres e que estão em plataformas de streams. Eu adorei as músicas. Não é à toa que Chris Martin (sou fã), de Coldplay, anda interpretando algumas delas ( pode até ser marketing do filme, mas ele não faria isso se não fossem boas musicalmente).

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