Saúde mental das mulheres piora após a pandemia, aponta relatório

Estudo da ONG Think Olga aponta que 45% das brasileiras sofrem com transtornos pós pandêmico. Ansiedade é mais frequente e afeta 6 em cada 10 mulheres

Foto: Canva

Uma pesquisa realizada pela ONG Think Olga revelou que 45% das mulheres brasileiras sofrem com algum tipo de transtorno mental, incluindo ansiedade e depressão, no cenário pós-pandemia de Covid-19. O estudo intitulado “Esgotadas: o empobrecimento, sobrecarga de cuidado e o sofrimento psíquico das mulheres” analisou a saúde mental da população feminina no Brasil, destacando as complexas questões que impactam negativamente seu bem-estar.

Divulgado nesta quarta-feira (30), o estudo mostra que a ansiedade, sendo o transtorno mais comum, afeta seis em cada dez mulheres brasileiras. Os números são alarmantes, mas trazem à luz uma realidade que não surpreende, uma vez que mais de metade das pessoas com diagnósticos de depressão e ansiedade no Brasil já eram mulheres antes da pandemia. Uma pesquisa global de 2019 mostrou que, das pessoas com transtornos mentais ou causados ​​pelo uso de substâncias no Brasil, 53% eram mulheres.

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“O relatório não surpreende porque são dados que já sabíamos que aconteciam, ou seja, as mulheres estão cansadas e sobrecarregadas. Quase metade da população feminina tem algum transtorno mental e com muito pouco acesso a cuidados específicos. A maioria diz que, como ferramentas para conseguir lidar com essa questão, tem a atividade física ou a religião. Tem uma insatisfação com diversas áreas da vida. A questão financeira é a que mais preocupa e a dupla ou tripla jornada é o segundo maior fator de pressão sobre a psique feminina”, explica Maíra Liguori, diretora da Think Olga.

O estudo investigou diversos fatores que contribuem para o sofrimento mental das mulheres no país. Desde a sobrecarga de trabalho até a insegurança financeira, passando pelo esgotamento físico e mental decorrente da responsabilidade desproporcional pelas atividades de cuidado e manutenção da vida. Todas essas dimensões foram analisadas.

O resultado mostra que dificuldades financeiras, endividamento, baixos salários e a sobrecarga de trabalho estão entre os fatores que contribuem para o sofrimento psíquico das mulheres – com destaque para as mulheres negras, que enfrentam um sofrimento ainda maior nesses aspectos. Em uma classificação de 1 a 10, a vida financeira recebeu a classificação 1.4, já para a capacidade de conciliação das diferentes áreas da vida, a nota ficou em 2.2. A situação financeira apertada atinge 48% das entrevistadas e a insatisfação com a remuneração baixa alcança 32% delas. 59% das mulheres das classes D e E estão insatisfeitas com sua situação financeira. Essa insatisfação atinge 54% das pretas e pardas.

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As mulheres são as únicas ou principais provedoras em 38% dos lares. Essas mulheres são, em sua maior parte, negras, da classe D e E e com mais de 55 anos de idade. Apenas 11% das entrevistadas dizem não contribuir financeiramente para a manutenção de suas famílias.

De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua 2022, as mulheres dedicam 24,4 horas semanais em atividades do lar, enquanto os homens gastam apenas 12,6 horas.

Já o relatório Esgotadas mostrou que a sobrecarga de trabalho doméstico e a jornada excessiva de trabalho foram a segunda causa de descontentamento mais apontada, atrás apenas de preocupações financeiras. O trabalho de cuidado, que envolve muitas horas dedicadas ao cuidado com a casa e com as pessoas, sobrecarrega principalmente as mulheres de 36 a 55 anos (57% cuidam de alguém) e pretas e pardas (50% cuidam de alguém).

Além disso, 86% por cento das mulheres consideram ter muita carga de responsabilidades. A insatisfação entre mães solo e cuidadoras é muito superior em relação àquelas que não têm esse tipo de responsabilidade. As cuidadoras e mãe solo também são as mais sobrecarregadas com as tarefas domésticas e de cuidado, com 51% das mães e 49% das cuidadoras apontando a situação financeira restrita como o maior impacto na saúde mental. Isso quer dizer que a sobrecarga de cuidado também é um fator de empobrecimento das mulheres ou “feminização da pobreza” – uma realidade global onde mais de 70% das pessoas vivem em situação de pobreza são mulheres, segundo o relatório.

No Brasil, essa disparidade se acentua quando consideramos as dimensões de raça e região. A sobrecarga de trabalho, especialmente nas tarefas de cuidado e na criação dos filhos, recai desproporcionalmente sobre as mulheres.

A pesquisa também reforçou a importância da saúde emocional, com 91% das entrevistadas considerando-a uma questão séria e 76% procurando prestar mais atenção a esse aspecto, especialmente após o impacto da pandemia. Só 11% afirmam que não cuidam da sua saúde emocional de nenhuma forma. As respostas das mulheres destacaram a necessidade de abordar fatores sociais e estruturais ao tratar da saúde mental, incluindo acesso à educação, habitação, emprego digno e igualdade de gênero.

“É necessário que comecemos a entender o impacto do trabalho de cuidado e suas consequências, além de partirmos de discussões que desestigmatizem tabus sobre a saúde mental. É essencial incentivar ações do setor privado, da sociedade civil e, principalmente, do setor público para um futuro viável para as mulheres”, afirmou Nana Lima, co-diretora da Think Olga,nota.

Confira a íntegra do relatório abaixo.

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