Pesquisa mostra resiliência de divisão política mais de um ano após eleição

Datafolha aponta que 9 em cada 10 pessoas estão confiantes de que acertaram na escolha para presidente, indicando que a divisão entre esquerda e bolsonarismo segue acirrada

Fotos: Fernando Frazão e Marcelo Camargo/Agência Brasil

A divisão política da sociedade brasileira — e a forma radical como parte dessa “polarização” se dá, sobretudo no campo da extrema-direita — continua sendo um dos principais desafios para que o país avance e deixe para trás o discurso fascista e odioso e o ranço anti-política que marcaram o cenário nacional nos últimos anos. 

A tarefa de reverter essa situação — que levou a assassinatos, brigas físicas e verbais, perseguições no mundo real e virtual, rachas entre familiares e amigos e a uma enorme saturação social — não é fácil e está apenas no início. Pesquisa Datafolha, divulgada nesta terça-feira (19), mostra que 90% dos entrevistados, ou nove em cada dez, dizem não terem se arrependido de seu voto no segundo turno das eleições presidenciais. 

Isso significa que tanto os que votaram em Lula quanto nos que apostaram em Jair Bolsonaro estão confiantes de que acertaram em sua escolha. Apenas 8% acham o contrário e 1% não soube dizer. No caso de Lula, somaram 9% os que se dizem arrependidos e 7% declaram o mesmo sobre Bolsonaro. 

Além disso, aponta a pesquisa, 38% afirmam confiar mais em seu candidato hoje do que no dia do pleito, enquanto 43% dizem que a confiança se manteve igual e 18% apontam ser menor. Quando analisados os eleitores do atual presidente, os índices são, respectivamente, de 40%, 41% e 19%. Recentemente, o instituto também mostrou que a aprovação de Lula é de 38%. 

No outro campo, 36% dizem confiar mais em Bolsonaro hoje; outros 46% mantêm sua opinião e 17% relatam confiar menos. Esses dados são um importante sintoma do grau de envolvimento de parte substancial desses eleitores com o ex-presidente e servem para analisar a mentalidade de parte da  sociedade. 

Fidelidade cega

Embora a fidelidade cega de parte do eleitorado bolsonarista, alimentada pelas redes sociais, não seja novidade, esses dados parecem indicar que talvez ela seja mais resiliente do que muitos pensavam. Afinal, não faltaram ações e omissões de Bolsonaro, ao longo do mandato, com potencial para fazê-lo perder até uma eleição para síndico, e ainda assim, por uma conjugação de fatores, muitos dos quais nada republicanos, ele angariou 49,1% no segundo turno. 

E, mais de um ano depois da disputa, parte de seus eleitores segue fiel mesmo diante da inelegibilidade de Bolsonaro e de evidências robustas do seu envolvimento com uma série de acontecimentos negativos à reputação que ele sempre tentou alimentar de político anti-sistema, probo e que “joga dentro das quatro linhas” da Constituição. 

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Entre os casos que ganharam força no noticiário após o pleito estão as investigações sobre a fraude em carteira de vacinação contra a Covid-19 e a posse e venda ilegal de jóias milionárias pertencentes ao Estado brasileiro, além dos estímulos à turba bolsonarista como forma de tentar provocar um golpe militar que pusesse fim ao terceiro mandato de Lula no nascedouro, como aconteceu no dia da diplomação do atual presidente, em 12 de dezembro de 2022, e no infame 8 de janeiro de 2023. 

A constatação da continuidade e resiliência da divisão na sociedade também está estampada em outros dados trazidos pelo Datafolha. Segundo o instituto, 30% dos brasileiros se dizem petistas, e 25% bolsonaristas. 

Avanços visíveis

Motivos não faltam para rever conceitos sobre o atual governo. Afinal, já neste primeiro ano, é notório o avanço obtido em diferentes áreas e que incidem diretamente na vida de milhões de pessoas. Para ficar apenas em alguns exemplos no plano econômico e no campo das políticas públicas, estão a redução do desemprego, da inflação e do endividamento das famílias; o aumento dos salários e do poder de compra; a ampliação do Bolsa Família e a retomada do Minha Casa Minha Vida e do Farmácia Popular. 

Além disso, mesmo com Lula e ministros explicitando a destruição deixada pelo governo Bolsonaro e as diferenças que marcam as visões de mundo de cada um dos lados, a tônica do discurso do governo, desde o início, vai no sentido de buscar também mudanças subjetivas, no plano das ideias, como forma de unificar o país e superar ao máximo as divisões. 

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Em seu discurso de posse, Lula salientou: “A ninguém interessa um país em permanente pé de guerra, ou uma família vivendo em desarmonia. É hora de reatarmos os laços com amigos e familiares, rompidos pelo discurso de ódio e pela disseminação de tantas mentiras. Chega de ódio, fake news, armas e bombas. Nosso povo quer paz para trabalhar, estudar, cuidar da família e ser feliz. A disputa eleitoral acabou”. 

O slogan adotado pelo governo federal também vai neste sentido — “União e Reconstrução” — e, mais recentemente, a campanha “O Brasil é um só povo” ressalta a retomada de laços entre as pessoas, rompido nos últimos anos, e a melhora de vida da população.

Sinalizações positivas, ações agregadoras e medidas que impactam no dia a dia das pessoas não têm faltado. O que falta ainda é desarmar a população também no plano subjetivo, tarefa que ainda vai demandar muita saliva e suor.