Contaminação por mercúrio atinge população Yanomami em 9 aldeias

Estudo mostra que garimpo ilegal na região do Alto Rio Mucajaí contaminou toda população das aldeias do subgrupo Ninam, na Terra Yanomani em Roraima

Foto: Daniel Marenco/Fiocruz/ISA

Pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Instituto Socioambiental (ISA), divulgada nesta quinta-feira (4), realizada com indígenas do povo Yanomami, do subgrupo Ninam, em nove aldeias em Roraima, mostra que todos os 287 indígenas que participaram do estudo estão contaminados por mercúrio. O metal líquido é utilizado de forma irregular nos garimpos ilegais para separar o ouro de sedimentos, poluindo o meio ambiente e a população.

O relatório ‘Impacto do mercúrio em áreas protegidas e povos da floresta na Amazônia: uma abordagem integrada saúde-ambiente’ destaca: “Em todas as amostras de cabelo estudadas foram detectadas concentrações de mercúrio: em homens, mulheres, crianças, adultos e idosos, sem exceção.”

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As coletas foram realizadas em outubro de 2022, na região do Alto Rio Mucajaí. A localidade é dominada pelo garimpo ilegal, que leva não só a contaminação e prejuízos para a saúde dos indígenas, mas carrega também violência e destruição.

Bruno Kelly/ISA

Os indígenas oriundos das aldeias Caju, Castanha, Ilha, Ilihimakok, Lasasi, Milikowaxi, Porapi, Pewaú e Uxiú tiveram amostras de cabelo e de células de mucosa oral coletadas. Os pesquisadores ainda coletaram 47 amostras de peixes e 14 amostras de água e sedimentos do rio Mucajaí.

Nas amostras de cabelo, 84% dos indígenas estavam com níveis de contaminação por mercúrio acima de 2,0 µg/g (micrograma por grama) e outros 10,8% ficaram acima de 6,0 µg/g. Para estes mais de 94% é necessária uma notificação ao Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Conforme preconiza a Agência Proteção Ambiental dos Estados Unidos, o nível de mercúrio não deve ser maior que 1 micrograma por grama, ainda que não exista um nível de exposição considerado seguro. Somente três indígenas, que correspondem a 1% do total, apresentaram níveis abaixo de 1,0μg/g.

Nas amostras coletadas ficou evidente que “indígenas com níveis mais elevados de mercúrio nas amostras de cabelo apresentaram déficits cognitivos e polineuropatia periférica (danos em nervos nas extremidades, como mãos, braços, pés e pernas) com mais frequência.”

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Também foram realizados exames clínicos em que se constatou elevado índice de doenças como pressão alta, anemia, diabetes, doenças crônicas, além de serem realizados testes de doenças infecciosas e parasitárias. No caso da malária, 80% relataram já ter tido a doença, com três episódios em média por indivíduo.

Todas as amostras do pescado analisado apresentaram contaminação por mercúrio. Em duas amostras de sedimento foram encontrados mercúrio acima do nível 1 da resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) 454 (teores de Hg de 0,344 mg/kg na amostra de sedimento coletada a montante no rio Mucajaí; e 1,386 mg/kg na amostra coletada na região antes da Cachoeira da Fumaça). No entanto, na análise das águas não foi detectada contaminação.

 Fred Rahal/ISA

“Esse cenário de vulnerabilidade aumenta exponencialmente o risco de adoecimento das crianças que vivem na região e, potencialmente, pode favorecer o surgimento de manifestações clínicas mais severas relacionadas à exposição crônica ao mercúrio, principalmente nos menores de 5 anos”, explica o coordenador do estudo, Paulo Basta, médico e pesquisador da Ensp/Fiocruz.

“O garimpo é o maior mal que temos hoje na Terra Yanomami. É necessário e urgente a desintrusão, a saída desses invasores. Se o garimpo permanece, permanece também a contaminação, devastação, doenças como malária e desnutrição e isso é o resultado dessa pesquisa, é a prova concreta!”, diz o vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY), Dário Vitório Kopenawa.

Confira o estudo completo aqui.

*Informações ISA