STF concede liminares em ações contra leis que proíbem linguagem neutra

Na sua decisão, o ministro Alexandre de Moraes destacou que a competência para legislar sobre diretrizes e bases da educação é privativa da União

Edición 41 de la Marcha Orgullo LGBTTTI, que partió del Ángel de la Independencia y finalizó en el Zócalo de la Ciudad de México. Fotografía: Tania Victoria/ Secretaría de Cultura de la Ciudad de México

Em uma decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, foram concedidas duas liminares em um conjunto de 20 ações movidas pela Aliança Nacional LGBTI+ e a Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (ABRAFH) contra legislações que proíbem o uso da linguagem neutra no Brasil. Segundo as entidades, estas medidas representam um avanço significativo na luta pelos direitos da comunidade LGBTI+, que vê na linguagem neutra uma ferramenta essencial para a inclusão e reconhecimento das identidades de gênero não-binárias.

Na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1155, Moraes deferiu o pedido liminar, suspendendo os efeitos da Lei 2.342/2022 do município de Ibirité, em Minas Gerais. Esta lei proibia o uso de linguagem neutra em instituições de ensino e documentos oficiais. A decisão pode ser acessada aqui.

A segunda liminar foi concedida na ADPF 1150, suspendendo a lei de Águas Lindas, em Goiás, que igualmente impedia a utilização da linguagem neutra em escolas e documentos públicos.

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Ainda aguardam decisão no STF outras 17 ações que contestam legislações similares em diversos municípios e estados do país. As ações estão distribuídas entre diferentes ministros.

Contexto da Ação

A Lei 2.342/2022 foi criada pela Câmara Municipal de Ibirité com o intuito suposto de garantir que a língua portuguesa seja ensinada exclusivamente conforme a norma culta, baseada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) e no Acordo Ortográfico de 1990. O texto proíbe especificamente o ensino e a aplicação da linguagem neutra, também conhecida como dialeto não binário, em todas as atividades pedagógicas e administrativas relacionadas à educação no município.

As entidades requerentes alegaram que a lei municipal é inconstitucional tanto formalmente quanto materialmente. Formalmente, argumentaram que a lei usurpa a competência exclusiva da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional, conforme o artigo 22, XXIV, da Constituição Federal. Materialmente, defenderam que a proibição imposta pela lei configura censura e viola os direitos fundamentais à liberdade de expressão, de ensino e de aprendizado, além de ser desproporcional e discriminatória.

Decisão

Na sua decisão, o ministro Alexandre de Moraes destacou que a competência para legislar sobre diretrizes e bases da educação é privativa da União e que qualquer regulamentação local deve ser meramente suplementar e em conformidade com as normas gerais estabelecidas pela legislação federal. O ministro ressaltou que a proibição da linguagem neutra nas instituições de ensino interfere diretamente no currículo pedagógico, o que extrapola a competência legislativa dos municípios.

Além disso, Moraes pontuou que a lei em questão poderia resultar em graves violações aos direitos fundamentais, afetando negativamente a liberdade de expressão e a pluralidade de ideias e concepções pedagógicas, pilares essenciais do sistema educacional brasileiro conforme estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996).

Suspensão Cautelar

Ao conceder a medida cautelar, Alexandre de Moraes reconheceu a presença dos requisitos de fumus boni iuris (fumaça do bom direito) e periculum in mora (perigo na demora), necessários para a suspensão de normas em ações de controle concentrado de constitucionalidade. A decisão visa evitar lesões irreparáveis aos direitos fundamentais dos envolvidos enquanto a questão não é definitivamente julgada pelo plenário do STF.

Com a suspensão cautelar, a Lei 2.342/2022 fica temporariamente sem efeito até que o mérito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1.155 seja julgado pelo Supremo Tribunal Federal. A decisão final do STF será crucial para definir os limites da competência legislativa dos municípios em relação à regulamentação educacional e a promoção de direitos fundamentais no Brasil.

A decisão foi bem recebida por organizações defensoras dos direitos LGBTI+, que consideram a medida um avanço significativo na luta contra a discriminação e a favor da inclusão e diversidade no ambiente escolar. Por outro lado, defensores da lei argumentam que a norma visava proteger a integridade da língua portuguesa e manter a qualidade do ensino, embora as localidades sejam governadas por gestores que fazem oposição sistemática a demandas de entidades LGBT+.

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